Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Autos n. 0280884-52.2001.8.26.0000

Requerente: 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Objeto: Inconstitucionalidade da Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, do Município de Iperó

 

 

Ementa:1) Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, do Município de Iperó “que dispõe sobre a extinção de cargos e dá outras providências”. 2)  Ausência de violação do princípio da motivação da  norma e falta de comprovação da violação do art. 169, parágrafos 3º e 4º , da Constituição Federal.        3) Parecer pela admissão e não acolhimento do incidente de inconstitucionalidade.

                  

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

 1) Relatório

            (...) e outras impetraram ação ordinária de reintegração de funcionário público municipal, com pedido de tutela antecipada em face do Prefeito Municipal de Iperó, insurgindo-se contra a promulgação da Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, que “dispõe sobre a extinção de cargos e dá outras providências”.

            Aduziram as autoras terem sido aprovadas por concurso público para o cargo de professor adjunto no Município de Iperó. Sob o pretexto de reestruturar a educação local e diminuir o impacto financeiro advindo da contratação das autoras e dos demais professores adjuntos, a autoridade coatora apresentou o projeto de lei complementar n. 02, de 20 de outubro de 2005,  no intuito de extinguir o cargo de professor adjunto na municipalidade.  Apresentando o aludido projeto à comissão de Justiça e Redação do Legislativo local, o mesmo recebeu parecer desfavorável por ter sido considerado inconstitucional. Todavia, referido projeto de lei acabou sendo aprovado e se converteu na Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, o que implicou na exoneração das autoras, conforme as portarias juntadas aos autos.

            Afirmaram violação de direito líquido e certo pertinente às suas exonerações, na medida em que referida lei violou o art. 169, parágrafos 3º e 4º, da Constituição Federal, e que houve flagrante desvio de finalidade e ausência de motivação.

              A ação foi julgada procedente pela r. Sentença de fls. 310/316, reconhecendo-se a inconstitucionalidade da legislação impugnada, anulando o ato de exoneração das autoras e determinando a imediata reintegração das mesmas nos cargos de professoras adjuntas do Município de Iperó, que ocupavam antes da edição da referida Lei.

             O Prefeito Municipal interpôs recurso de apelação. Defendeu a constitucionalidade da norma (fls. 324/332).

             As Autoras apresentaram contrarrazões a fls. 338/355.

             Pelo v. Acórdão de fls. 365/373, a 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça determinou a remessa dos autos a este Colendo Colegiado para atendimento da cláusula do artigo 97 da Constituição da República.

            Eis, em breve síntese, o relatório.

2) Da admissibilidade do incidente de inconstitucionalidade.

            A questão de direito deve ser solucionada para que seja possível concluir-se o julgamento da apelação interposta pelo Prefeito Municipal de Iperó.

           Como anota José Carlos Barbosa Moreira, comentando o parágrafo único do art. 481 do CPC, “são duas as hipóteses em que se deixa de submeter a arguição ao plenário ou ao órgão especial: (a) já existe, sobre a questão, pronunciamento de um desses órgãos do tribunal em que corre o processo; (b) já existe, sobre a questão, pronunciamento do plenário do STF. A redação alternativa indica que é pressuposto bastante da incidência do parágrafo a ocorrência de uma delas” (Comentários ao CPC, vol.V, 13ªed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p.44).

               No caso em exame, salvo eventual equívoco, a quaestio iuris – que se restringe à verificação da constitucionalidade da Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, do Município de Iperó – não foi examinada pelo Plenário ou Órgão Especial.

               De outro lado, e de acordo com pesquisa informatizada, não há notícia de que a validade dessa norma foi julgada pelo Supremo Tribunal Federal ou analisada por esse Sodalício sob a perspectiva aqui abordada.      

                Assim, considerando que (a) a solução da quaestio iuris é imprescindível para o julgamento do recurso de apelação, e (b) ainda não houve declaração de inconstitucionalidade a seu respeito pelo E. STF ou por esse E. Tribunal de Justiça, é de ser admitido o processamento do presente incidente de inconstitucionalidade.

3) Fundamentação.

               Através da Lei Complementar n. 10, de 09 de dezembro de 2005, do Município de Iperó, foram extintos cargos de Professores Adjuntos da Prefeitura, os quais eram ocupados pelas autoras.

               Apesar de terem sido aprovadas através de concurso público e empossadas, as autoras não adquiriram a estabilidade, eis que se encontravam em estágio probatório.

               Destaca Maria Sylvia Zanella Di Pietro que " a estabilidade somente beneficiará o funcionário público, ou seja, aquele investido em cargo. O dispositivo, no ‘caput’, diz que são estáveis após três anos de efetivo exercício, os servidores nomeados em virtude de concurso público. Nos termos do parágrafo 1o , o servidor público estável só perderá o cargo, em virtude de sentença judicial transitada em julgado ou mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa" (Direito Administrativo, Ed. Atlas, 3a edição, página 326).

               Adquirido o atributo da estabilidade, o servidor só perderá o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado; mediante processo administrativo que lhe garanta ampla defesa ou através de procedimento de avaliação periódica, nos termos da Lei Complementar, assegurada a ampla defesa.

               Extinto o cargo ou declarada  a sua desnecessidade o servidor estável ficará em disponibilidade remunerada proporcional ao tempo de serviço ( parágrafo 3º do art. 42 da CF).

               Com relação ao servidor em estágio probatório a situação é completamente diferente.

               Isto porque não sendo estável o servidor não está protegido da dispensa imotivada, razão pela qual não há que se falar em violação do direito das autoras.

               Por outro lado, não se pode analisar nestes autos, a reestruturação administrativa procedida pelo Prefeito Municipal, pois, além de ser matéria de fato, trata-se de ato discricionário do alcaide, sendo a via escolhida inadequada para este fim.

                 Não é demais ressaltar que a criação, a renomeação e a extinção de cargos, desde que pautada nos princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade é livre, eis que o Chefe do Poder Executivo administra dentro do critério de conveniência e oportunidade.

               Observe-se, ainda, que diversamente do sustentado, não ocorreu violação do princípio da motivação para a criação da norma tida por inconstitucional, já que a mesma foi criada para reduzir os impactos financeiros causados pela manutenção dos cargos de Professores Adjuntos na Rede Municipal de Educação, pois sobre seus proventos incidem todas as vantagens pecuniárias do funcionalismo  efetivo previstas na legislação municipal, além do que referidos professores cumprem uma jornada de trabalho docente de  apenas 10 (dez) horas semanais, podendo cumprir, também, quando for necessário Jornada Excedente em até 25  (vinte e cinco) horas –aulas semanais, sem falar, que mesmo que o Professor Adjunto não ministre aulas, tem como garantia a Jornada Básica de 10 (dez) aulas semanais.        

                 Quanto a eventuais argumentações no sentido de uso político da lei, bem como que a mesma teria efetivamente desrespeitado o art. 169, parágrafos 3º e 4º, da Constituição Federal, igualmente por ser matéria de fato, dependeria de dilação probatória, que se faz inadmissível nesta via.

                Como anota, a propósito, Juliano Taveira Bernardes, “a jurisprudência do STF adota perfil restritivo ao conceito de inconstitucionalidade, resumindo-o, para fins de controle (tanto concreto quanto abstrato), somente ao descompasso direito e frontal da norma impugnada em face da Constituição Federal”. (Controle abstrato de constitucionalidade, São Paulo, Saraiva, 2004, p.137).

              Nesse sentido confiram-se os seguintes precedentes do Pretório Excelso: ADI 1.540-MS, julgada em 25.6.97, ADIn 252-PR, rel. Min. Moreira Alves, 20.11.97.

              Por fim, o processo legislativo foi regular.

              Daí porque a Lei Municipal n. 10, de 09 de dezembro de 2005, do Município de Iperó, não se afigura inconstitucional.

4) Conclusão.

              Diante do exposto, somos pela admissão e pelo não acolhimento do presente incidente.

 

São Paulo, 07 de dezembro de 2011.

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

vlcb