Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

Processo n.º 0289645-72.2011.8.26.0000

Interessados: Hopi Hari S.A. (Atual Denominação) e Município de Vinhedo

 

Ementa: Arguição de inconstitucionalidade. A 12.ª Câmara do 1.º Tribunal de Alçada Civil, no julgamento da Apelação n.º 0060663-18.2000.8.26.0000, afastou a aplicação de lei municipal ao caso concreto, sem, contudo, suscitar arguição de inconstitucionalidade – Anulação do acórdão pelo STJ por violação da ‘cláusula de reserva de plenário’ – Necessidade de redistribuição do processo a uma das Câmaras de Direito Público do egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo para que sejam observadas as formalidades previstas nos arts. 480 e 481 do Código de Processo Civil. No mérito, como a jurisprudência do STF e do STJ orienta-se no sentido de que é taxativa a lista anexa à Lei Complementar n.º 56/1987, ao dispor de forma contrária, a Lei Complementar Municipal n.º 2/97, de Vinhedo, violou a competência da União (CF, arts. 146, inciso III, alínea “a”, e 156, inciso III). Acolhimento da Arguição.

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator,

Colendo Órgão Especial:

 

         Discute-se neste processo a validade da cobrança de ISS de ‘parque de diversões’, autorizada pela Lei Complementar Municipal n.º 2/97, de Vinhedo, nada obstante a lista anexa ao Decreto-Lei n.º 406/68 não prever tal atividade, que fora suprimida pela Lei Complementar n.º 56/87 e posteriormente reintroduzida pela Lei Complementar n.º 116, de 31 de julho de 2003.                  

         Preliminarmente: é necessária a redistribuição deste processo a uma das Câmaras de Direito Público desse egrégio Tribunal de Justiça para que sejam seguidas as formalidades previstas nos artigos 480 e 481 do Código de Processo Civil, em observância à decisão proferida pelo colendo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 976.549/SP (Rel. Min. LUIZ FUX).

         No que tange ao mérito, a arguição comporta acolhimento.

         O ponto central da controvérsia reside em saber se é taxativa a lista de serviços estabelecida pela lei complementar editada nos termos do art. 156, inciso III, da Constituição Republicana.

         A doutrina diverge acerca desse tema, mas o posicionamento majoritário é no sentido de que a lista de serviços tem caráter meramente exemplificativo. (Cf. Geraldo Ataliba, Normas Gerais de Direito Financeiro e Tributário e Autonomia dos Estados e Municípios, Revista de Direito Público, 1969, vol. 10, pp 45/80; Arthur Carlos A. Pereira Gomes, Imposto Municipal sobre Serviços taxatividade parcial da lista, Revista de Direito Público, abr./jun. 1972, vol. 20, pp. 336-342.)

         Evidentemente que, se for taxativa a lista, a competência municipal para dispor sobre o assunto é limitada, desautorizando, assim, a instituição e cobrança de ISS – por lei municipal – por serviços nela não contemplados.

         No colendo Supremo Tribunal Federal prevalece o entendimento que considera taxativa a lista de serviços, nos termos dos precedentes abaixo transcritos:

        

“Imposto sobre serviços. Não incidência sobre operações bancárias. A lista de serviços anexa à Lei Complementar 56/1987 é taxativa. Não incide ISS sobre serviços expressamente excluídos desta. Precedente: RE 361.829, Segunda Turma, DJ de 24-2-2006.” (AI 590.329-AgR, Rel. Min. Eros Grau, julgamento em 8-8-2006, Segunda Turma, DJ de 8-9-2006.) No mesmo sentido: RE 361.829-ED, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 2-3-2010, Segunda Turma, DJE de 19-3-2010.

 

“O ISS é um imposto municipal. É dizer, ao Município competirá instituí-lo (CF, art. 156, III). Todavia, está ele jungido à norma de caráter geral, vale dizer, à lei complementar que definirá os serviços tributáveis, lei complementar do Congresso Nacional (CF, art. 156, III). Isto não quer dizer que a lei complementar possa definir como tributáveis pelo ISS serviços que, ontologicamente, não são serviços. No conjunto de serviços tributáveis pelo ISS, a lei complementar definirá aqueles sobre os quais poderá incidir o mencionado imposto. (...) a lei complementar, definindo os serviços sobre os quais incidirá o ISS, realiza a sua finalidade principal, que é afastar os conflitos de competência, em matéria tributária, entre as pessoas políticas (CF, art. 146, I). E isso ocorre em obséquio ao pacto federativo, princípio fundamental do Estado e da República (CF, art. 1º) (...) não adoto a doutrina que defende que a lista de serviços é exemplificativa.” (RE 361.829, voto do Rel. Min. Carlos Velloso, julgamento em 13-12-2005, Segunda Turma, DJ de 24-2-2006.)

 

         De igual modo, o egrégio Superior Tribunal de Justiça tem decidido que:

 

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO SANADA SEM EFEITOS INFRINGENTES. ISS. LISTA DE SERVIÇOS. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. AUSÊNCIA DE CONTRADIÇÃO. 1. Os embargos declaratórios somente são cabíveis para modificar o julgado que se apresentar omisso, contraditório ou obscuro, bem como para sanar possível erro material existente no acórdão. 2. Afastada a incidência da Súmula 182/STJ, omissão sanada. 3. O cerne do debate concentra-se na interpretação dispensada à lista de Serviços anexa ao Decreto-Lei n. 406/68. 4. A jurisprudência majoritária desta Corte firmou-se no sentido de que a lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/68 é taxativa, porém comporta interpretação extensiva a fim de abarcar os serviços correlatos àqueles previstos expressamente, uma vez que, se assim não fosse, ter-se-ia pela simples mudança de nomenclatura de um serviço a incidência ou não do ISS. Contradição afastada. Embargos de Declaração acolhidos em parte, tão somente para sanar a omissão apontada, sem efeitos infringentes.” (EDcl no AgRg no AgRg no Ag 1352404 / MG,Rel. Min. Humberto Martins, j. em 2.6.2011)

 

         No âmbito desse egrégio Tribunal de Justiça, vale ressaltar, o entendimento é nesse mesmo sentido, conforme se vê do Julgado abaixo reproduzido:

 

“Ementa: APELAÇÃO. Embargos à execução. ISS. Instituição financeira. Sentença de parcial procedência. Taxatividade da lista anexa ao Decreto-lei 406/68, com a redação da Lei Complementar 56/87. Possibilidade de cobrança do tributo apenas com relação aos serviços descritos nos itens 95 e 96 da referida lista. Recurso do Município desprovido. Recurso do embargante. Preliminares de carência de ação, ausência de notificação e excesso de execução e alegação de prescrição descabidas. Adotados os fundamentos da sentença. Devolução de cheques e serviços de cobrança. Incidência mantida. Reforma parcial da sentença. Exclusão das atividades de banco 24 horas e desbloqueio de talão de cheques. Recurso parcialmente provido.” (Apelação n.º 9066343-15.2006.8.26.0000, Rel. Des. João Alberto Pezarini, j. em 10/11/2011, grifei.)

 

         Assim, malgrado a divergência doutrinária existente, não há como se distanciar do entendimento das mais elevadas Cortes Judiciárias brasileiras, as quais se posicionam no sentido da taxatividade da lista de serviços, autorizando, assim, a conclusão de que o Município de Vinhedo violou a competência legislativa da União ao dispor de maneira diversa da prevista na lei complementar que discrimina os serviços que poderão ser tributados pelo ISS.

         Em tais circunstâncias, aguarda-se o acolhimento da preliminar suscitada, com a redistribuição do feito a uma das Câmaras de Direito Público desse egrégio Tribunal de Justiça para os fins dos arts. 480 e 481 do Código de Processo Civil, e, no que tange ao mérito, a procedência da arguição de inconstitucionalidade.

 

                            São Paulo, 2 de dezembro de 2011.

 

 

Sérgio Turra Sobrane

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

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