Autos
n. 162.845.0/9-00
Suscitante:
3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Suscitado:
Maville Empreendimentos Imobiliários Ltda.
Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator
Colendo Órgão Especial
Maville Empreendimentos Imobiliários Ltda. move a presente ação ordinária
de anulação de escritura de doação em face de Prolar de Jacareí, sob o argumento de que, ao promover o loteamento
“Jardim Sunset Garden, além de cumprir as exigências da Lei Ordinária Federal
n. 6.766/79, foi compelida pelas exigências decorrentes do art. 29 da Lei
Municipal n. 3.033, de 06 de novembro de
Aduz o autor, então, como
motivo da anulação, que é inconstitucional o citado dispositivo legal
municipal, pois acaba por instituir imposto fora dos casos previstos pelo art.
156 da Constituição Federal.
Na contestação, a ré denunciou
a lide à Prefeitura Municipal.
Inconformada, a autora apelou
(fls. 172/175), reiterando as questões de direito suscitadas na inicial.
Oferecidas as contra-razões
(fls. 186/191), os autos foram distribuídos à Colenda Terceira Câmara do
Tribunal de Justiça de São Paulo, sendo designado como relator o Excelentíssimo
Desembargador Dr. Laerte Sampaio (fls. 195).
Elaborado relatório (fls.
196/197), procedeu-se à revisão (fls. 198).
Iniciado o julgamento da
apelação, foi questionada a validade jurídico-constitucional do art. 29 da Lei
Municipal n. 3.033, de 06 de novembro de 1991, que exige a doação de 2% (dois
por cento) dos lotes para efeito de aprovação do loteamento (fls. 201/208),
tendo o Nobre Relator concluído pela inconstitucionalidade do dispositivo legal
municipal, bem como por sua ilegalidade (fls. 206).
Por força de ser considerada
prejudicial a questão da eventual inconstituciolnalidade, bem como por força do
princípio da reserva de plenário esculpido no art. 97 da Lei Maior, suscitou-se
o incidente de inconstitucionalidade previsto nos arts. 480/482 do CPC.
É o breve relatório.
Com a advertência de que o
parecer se restringe à questão prejudicial, tem-se que é inconstitucional o
art. 29 da Lei Municipal n. 3.033, de 06 de novembro de 1991, que exige a
doação de 2% (dois por cento) dos lotes para efeito de aprovação do loteamento.
Vejamos.
Não se pode negar a competência
municipal para planejar e controlar a utilização, o parcelamento e a ocupação
do solo urbano.
Aliás, tem-se entendido que a
Municipalidade tem o dever e não a mera faculdade de disciplinar o uso, o
parcelamento e a ocupação do solo, sobretudo para assegurar o respeito aos
padrões urbanísticos e o bem-estar da população. Assim se decidiu, por exemplo,
no julgamento do recurso especial n. 448.216/SP[1],
proferido pela Primeira Turma do STJ, em acórdão da lavra do Ministro Luiz Fux.
Porém, não se deve confundir
esse dever do município, que se concretiza mediante exigências para a
implantação de loteamentos, com exigências que não estão relacionadas aos
padrões urbanísticos e ao bem-estar da população.
No caso em discussão, o
município extrapolou os limites da sua competência constitucional ao impor
exigência que, bem analisada, determina a perda da propriedade particular, como
muito bem destacou o Nobre Desembargador Relator.
O direito de propriedade é
assegurado no caput do art. 5º da
Constituição Federal e não pode ser violado fora dos limites constitucionais.
A imposição da perda da
propriedade privada por lei municipal afronta a Constituição Federal porque,
repita-se, não representa a imposição de uma limitação de caráter urbanístico,
o que seria válido, como decidiu a Primeira Turma do STJ, ao enfrentar o
recurso especial n. 474.475/SP[2]:
“Compete ao Município legislar
sobre questões atinentes a interesse local, dentre eles, promover o adequado ordenamento
territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da
ocupação do solo urbano. Conclui-se, portanto, que a população sujeita-se às limitações urbanísticas impostas
pelo Poder Público, que, in genere,
são realizadas em prol do interesse coletivo” – grifos nossos.
A imposição de perda da
propriedade, em prol de entidade municipal, por mais louvável que seja sua
atuação, não configura limitação de ordem urbanística, mas sim indevido
confisco da propriedade privada.
A competência legislativa
municipal, como se sabe, é questão constitucional e está disciplinada no art. 30
da Lei Maior. Dispõe o inciso VIII do referido dispositivo constitucional que compete aos municípios promover, no que
couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do
uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano.
Portanto, a
inconstitucionalidade, no nosso sentir, decorre da violação ao art. 30, VIII,
da Constituição Federal, pois o art. 29 da Lei Municipal n. 3.033, de 06 de
novembro de 1991, que exige a doação de 2% (dois por cento) dos lotes para
efeito de aprovação do loteamento, extrapola os limites da competência
municipal traçados pela Lei Maior.
Em
tais circunstancias, o parecer é pela inconstitucionalidade do
dispositivo em epígrafe.
São Paulo, 30 de abril
de 2008.
MAURÍCIO AUGUSTO GOMES
PROCURADOR DE JUSTIÇA,
no exercício de função delegada
pelo Procurador-Geral de Justiça