Parecer em incidente de Inconstitucionalidade

 

Autos nº. 168.203-0/3

Suscitante: 12ª. Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

Objeto: Lei Complementar Estadual nº 977/2005

Ementa: Incidente de inconstitucionalidade da Lei Complementar Estadual nº 977/2005, que institui a “Gratificação de Atividades de Magistério” – GAM. Caráter genérico da vantagem incompatível com o conceito de gratificação. Aumento vencimental disfarçado. Expressões da lei que restringem o benefício ao pessoal da ativa incompatíveis com o art. 40, § 8º, da Constituição Federal. Parecer pela declaração da inconstitucionalidade parcial da norma questionada.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

 

(...) E OUTROS, servidores públicos aposentados da carreira do magistério, ajuizaram ação ordinária em face da FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, pleiteando receber a “gratificação de atividades de magistério” (GAM), instituída pela Lei Complementar Estadual nº 977/05.

Pela r. Sentença de fls. 133/140, a ação foi julgada procedente.

A FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, inconformada com a Decisão monocrática, interpôs apelação (fls. 143/153).

O recurso foi regularmente processado, com contra-razões a fls. 156/196, sendo distribuído à Colenda 12ª. Câmara de Direito Público.

O v. Acórdão de fls. 216 determinou a suspensão do julgamento da apelação, para que, em atenção à cláusula da reserva de Plenário (Súmula vinculante nº 10), o E. Órgão Especial se pronuncie sobre a constitucionalidade da Lei Complementar nº 977/2005, na parte em que restringe a vantagem denominada “gratificação por atividade de magistério” (GAM) aos servidores da ativa.

Este é resumo do que consta dos autos.

A Gratificação por Atividade de Magistério – GAM foi criada pela Lei Complementar nº 977/2005 e, nos termos do art. 1º, beneficia todos os servidores em atividade do Quadro do Magistério da Secretaria da Educação.

O art. 3º da mesma lei estabelece que essa gratificação “não se incorporará aos vencimentos e salários para nenhum efeito, bem como não será considerada para cálculo de quaisquer vantagens pecuniárias, exceto no cômputo do décimo terceiro salário, nos termos do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 644/1989, das férias e do acréscimo de 1/3 (um terço) das férias”.

Nos limites deste incidente, tais dispositivos devem ser cotejados com o art. 40, § 8º, da Constituição Federal, assim redigido:

§ 8º - É assegurado o reajustamento dos benefícios para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei. (Redação da EC nº 41/03)

Depreende-se da lei estadual que a Gratificação por Atividade de Magistério – GAM foi instituída em caráter geral. Todo servidor público do Quadro do Magistério em atividade passou a percebê-la, independentemente da função que exerça.

Essa abrangência revela que a GAM tem a natureza de vencimentos e não de gratificação.

Gratificações são, para a doutrina, a “retribuição de um serviço comum prestado em condições especiais”. São, por sua própria índole, “vantagens pecuniárias atribuídas precariamente aos servidores que estão prestando serviços comuns da função em condições anormais de segurança, salubridade ou onerosidade (gratificações de serviço), ou concedidas como ajuda aos servidores que reúnam as condições pessoais que a lei especifica (gratificações especiais). As gratificações – de serviço ou pessoais – não são liberalidades puras da Administração; são vantagens pecuniárias concedidas por recíproco interesse do serviço e do servidor, mas sempre vantagens transitórias, que não se incorporam automaticamente ao vencimento, nem geram direito subjetivo à continuidade de sua percepção. Na feliz expressão de Mendes de Almeida, ‘são partes contingentes, isto é, partes que jamais se incorporam aos proventos, porque pagas episodicamente ou em razão de circunstâncias momentâneas’” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 1998, p. 396/397).

No caso dos autos, o benefício instituído não se enquadra no conceito de gratificação. É disfarçado aumento vencimental que, como tal, deve ser estendido aos inativos.

Essa tem sido a orientação do STF: diante de uma “gratificação de natureza genérica”, a vantagem deve contemplar os inativos, por razões de equidade, razoabilidade, e, especialmente, isonomia.

Em recentíssimo julgamento (11 de fevereiro de 2009), a Corte Constitucional negou provimento a recurso extraordinário interposto pela FUNASA, e admitiu a possibilidade de se estender aos inativos a “gratificação de desempenho da atividade de seguridade social e do trabalho” instituída pela Lei 10.483/02 (RE 572.052-7 RS, rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI).

Colhe-se no voto que a solução contida na Decisão recorrida “homenageia o art. 40, § 8º, da Constituição, que assegura aos servidores ativos e inativos o reajustamento dos benefícios ‘para preservar-lhes, em caráter permanente, o valor real, conforme critérios estabelecidos em lei’”.

Esses fundamentos, mutatis mutandis, ajustam-se à hipótese em análise e revelam a inconstitucionalidade das expressões contidas na lei que restringem a gratificação aos servidores da ativa.

Diante do exposto, o parecer é pela declaração da inconstitucionalidade parcial da Lei Complementar (Estadual) nº 977/2005.

São Paulo, 8 de maio de 2009.

 

 

        Maurício Augusto Gomes

        Subprocurador-Geral de Justiça

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