INCIDENTE DE INCONSTITUCIONALIDADE

 

Autos n. 176.710-0/0-00

Suscitante: Décima Terceira Câmara de Direito Público

Lei impugnada: Parágrafo 1º do art.111, da Lei Orgânica do Município de Jales

 

Incidente de inconstitucionalidade. Lei Orgânica do Município de Jales (art. 111, §1º). Cômputo de tempo de serviço prestado à municipalidade sob qualquer regime. Ausência de violação ao ordenamento constitucional. Parecer pela constitucionalidade da norma.

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

 

Colendo Órgão Especial

 

                           

                   Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado quando do julgamento da Apelação Cível n. 675.531-5/0, em que é apelante Prefeitura Municipal de Jales e apelado (...).

                   Ocorre que, iniciado o julgamento da apelação, foi questionada a validade jurídico-constitucional do parágrafo 1º da Lei Orgânica do Município de Jales, que autoriza o cômputo do tempo de serviço público municipal, sob qualquer regime, quando o servidor for nomeado em virtude de concurso público.

                   Por força de ser considerada prejudicial à questão da eventual inconstitucionalidade, bem como por força do princípio da reserva de plenário esculpido no art. 97 da Lei Maior, suscitou-se o incidente de inconstitucionalidade previsto nos arts. 480/482 do CPC.

                   Sustenta a apelante que referido dispositivo fere o princípio da isonomia.

                   Este é o breve relato do que consta dos autos.

                   Com a advertência de que o parecer se restringe à questão prejudicial, tem-se que é constitucional o dispositivo da lei impugnado.   

                   O dispositivo impugnado tem a seguinte redação:

 

“Lei Orgânica do Município de Jales

 

(...)

 

Art.111 ........................

Parágrafo 1º - “O tempo de serviço público municipal, sob qualquer regime, será computado integralmente para efeitos pecuniários ou vantagens econômicas, quando o servidor for nomeado em virtude de concurso público”

 

                   Como se verifica, o dispositivo impugnado trata de permitir o cômputo do tempo de serviço público prestado à municipalidade, sob qualquer regime, para efeitos pecuniários ou vantagens econômicas, quando o servidor for nomeado em virtude de concurso público.

                   Nesta ótica, com a devida vênia quanto ao pensamento da apelante, não se vislumbra nenhuma incompatibilidade vertical com o ordenamento constitucional, mormente com o princípio da isonomia.

                   É legítima a instituição de vantagens pecuniárias por meio de lei de iniciativa do Poder Executivo, contemplando critérios objetivos para sua concessão (complexidade da atividade, horário em que prestada, exigência de relação de confiança com o agente político da esfera superior da entidade considerada, etc.) relacionados a determinadas atividades realizadas por agentes públicos.

                   Diógenes Gasparini desenvolve argumentação, v.g., ao tratar da denominada gratificação de serviço, salientando que sua criação pode decorrer de “serviços realizados com risco de vida e saúde, como são os trabalhos médicos e os correlatos prestados aos aidéticos; as outorgadas em função de serviços extraordinários, como são os prestados fora da jornada de trabalho; as atribuídas pelo exercício do trabalho em certas zonas, como é o de professor em zona rural (...) é recompensa pelo desempenho de serviços comuns em condições incomuns, anormais ou adversas para o servidor ou uma retribuição em face de situações que oneram o orçamento do servidor” (Direito Administrativo, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1993, p.180/181).

                   O E. STF parte da premissa da legitimidade constitucional dessas vantagens pecuniárias instituídas em prol dos servidores públicos, ao reconhecer que não se deve estender a todos os inativos as criadas em razão de peculiaridades do serviço, pois, como restou decidido em mais de uma oportunidade quanto ao adicional de insalubridade, trata-se de “vantagem pecuniária concedida apenas aos servidores que trabalham em condições prejudiciais à saúde. Com esse entendimento, por ofensa ao art. 40, § 4º, da CF (redação originária), a Turma deu provimento a recurso extraordinário do Estado de São Paulo para reformar acórdão do Tribunal de Justiça local que, sob o fundamento de que o adicional de insalubridade fora concedido indiscriminadamente a todos os policiais militares da ativa, estendera a inativo da polícia militar o direito a esta vantagem. RE 209.218-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 09.12.97”. No mesmo sentido: RE 192.729-SP, rel. Min. Ilmar Galvão, 8.9.98; RE 236.465-SP, rel. Min. Moreira Alves, 2.3.99.

                   Não nos parece ilegítima, deste modo, a previsão contida no dispositivo legal impugnado, que instituiu vantagens pecuniárias para aqueles que ingressem no serviço público mediante o exigido e necessário concurso público.

                   Oportuno anotar que a Constituição do Estado de São Paulo contém dispositivos similares ao previsto no diploma aqui impugnado.   Vejamos:

 

Artigo 132 - Os servidores públicos estáveis do Estado e de suas autarquias, desde que tenham completado cinco anos de efetivo exercício, terão computado, para efeito de aposentadoria, nos termos da lei, o tempo de serviço prestado em atividade de natureza privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.

 

Artigo 135 - Ao servidor público estadual será contado, como de efetivo exercício, para efeito de aposentadoria e disponibilidade, o tempo de serviço prestado em cartório não oficializado, mediante certidão expedida pela Corregedoria Geral da Justiça.”

 

Art. 126,§3º  O tempo de serviço público federal, estadual ou municipal será computado integralmente para os efeitos de aposentadoria e disponibilidade.

 

                  Ademais, o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de São Paulo conta com dispositivo com o qual o que ora se impugna guarda a mais plena simetria, a saber:

 

Artigo 76 - O tempo de serviço público, assim considerado o exclusivamente prestado ao Estado e suas Autarquias, será contado singelamente para todos os fins.

Parágrafo único - O tempo de serviço público prestado à União, outros Estados e Municípios, e suas autarquias, anteriormente ao ingresso do funcionário no serviço público estadual, será contado integralmente para os efeitos de aposentadoria e disponibilidade.

 

                   A opção do legislador municipal foi, no caso em tela, prestigiar aqueles que já vinham prestando serviços ao município em regimes diversos e que vieram, após, incorporar-se aos quadros do funcionalismo público municipal, mediante o exigido concurso público.

                   A situação dos demais que prestaram serviços a outras entidades privadas não se encontram na mesma situação dos que serviram ao município, motivo pelo qual não merecem o mesmo tratamento e, portanto, afastada fica a possibilidade da inconstitucionalidade no dispositivo aqui examinado, por violação ao princípio da isonomia.

                   Veja-se, por fim, análoga situação em que já se analisou a questão da contagem de tempo de serviço daquele que passou a incorporar os quadros de servidores civis sob regime estatutário, em cujo Acórdão se colaciona:

 

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. SERVIDOR PÚBLICO. TEMPO DE SERVIÇO SOB A ÉGIDE DA CLT ANUÊNIO E LICENÇA PRÊMIO. CORREÇÃO MONETÁRIA JUROS MORATÓRIOS. ART. 1ºF DA LEI Nº 9494/97. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. No que tange à suscitada falta de interesse de agir, sob o fundamento de que, em sede administrativa, foi implantado o adicional de tempo de serviço com efeitos retroativos a setembro de 1999, insta salientar que a aludida implantação não corresponde à integralidade do direito reclamado, já que o aludido adicional é devido aos servidores, quer no concernente ao vínculo celetista quer no atinente ao estatutário, ressalvada a prescrição qüinqüenal já reconhecida na sentença, ou seja, a pretensão engloba período precedente à referida implantação; Em se tratando de relação de trato sucessivo, a prescrição atinge apenas as parcelas anteriores ao qüinqüênio legal, consoante a Súmula nº 85 do STJ, motivo pelo qual impõe-se rejeitar a suscitada prescrição do fundo de direito; O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 209.899 - RN, Relator Ministro Maurício Corrêa, decidiu que os servidores regidos pela CLT, que passaram para o regime estatutário, consoante o art. 243 caput da Lei nº 8.112/90, têm direito à contagem do tempo de serviço celetista para efeito de anuênio; A matéria não comporta maiores digressões. A jurisprudência qualificada do Supremo Tribunal Federal mostra-se favorável aos autores da presente ação ordinária, conforme, inclusive, comando sumulado no Enunciado nº 678/STF, que determina seja computado o tempo de serviço celetista, para fins de anuênio; Quanto à conversão em pecúnia da licença prêmio não gozada pelo recorrente Joacir Viana Vasco, o qual se encontra aposentado desde novembro de 1989 (fl. 293), sem razão o apelante, eis que o § 1º do art. 243 da Lei nº 8.112/90 estabeleceu que "os empregos ocupados pelos servidores incluídos no regime instituído por esta Lei ficam transformados em cargos, na data de sua publicação", I.e, como o apelante aposentou-se antes da Lei nº 8.112/90, não teve o seu emprego convertido em cargo público, motivo pelo qual não tem direito à licença prêmio; Juros de mora de 0,5% ao mês, nos termos do art. 1ºF da Lei nº 9.494/97, com a redação que lhe foi dada pela Medida Provisória nº 2.180/2001; Tem razão a União Federal, sendo importante registrar que o período de licença prêmio por assiduidade somente é devido até 15/10/1996; Os servidores decaíram de parte mínima do pedido, pelo que incide o § único do art. 21 do CPC. (TRF 02ª R.; AC 365186; Proc. 2001.50.01.006165-4; Quinta Turma Especializada; Rel. Des. Fed. Paulo Espirito Santo; DJU 21/11/2008; Pág. 245) Súm. nº 85 do STJ original sem grifos

 

                   Por tudo quanto exposto, o parecer é pela constitucionalidade do Parágrafo 1º, do art.111 da Lei Orgânica do Município de Jales.

São Paulo, 05 de maio de 2009.

 

 

Maurício Augusto Gomes

Subprocurador-Geral de Justiça

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