Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Autos nº.  176.888-0/1-00

Suscitante: Quinta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça   

Objeto: Art. 1º , da Lei Complementar  Estadual n. 1.013, de 06 de julho de 2007, na parte em que modificou a redação do art. 31 da Lei Estadual n. 452/1974.

 

 

Ementa: Incidente de inconstitucionalidade do art. 1º , da Lei Estadual  n. 1.013, de 06 de julho de 2007, na parte em que modificou a redação do art. 31 da Lei Estadual n. 452/1974. Violação do inciso XX do art. 5º e §1º do art. 149, ambos da Constituição Federal. Parecer pelo reconhecimento da inconstitucionalidade.

 

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

 

 1) (...), policial militar, ajuizou AÇÃO ORDINÁRIA,  em face da Caixa Beneficente da Polícia Militar do Estado de São Paulo, objetivando, em síntese, o direito ao desligamento do quadro associativo da Cruz Azul de São Paulo, com a conseqüente cessação dos descontos e devolução dos valores que foram pagos a título de contribuição para  assistência médico-hospitalar e odontológica.

 

A ação foi julgada procedente pela r. Sentença de fls. 28/37, sendo determinado a Caixa Beneficente da Polícia Militar do Estado de São Paulo, a sustação do desconto de 2% dos proventos do autor, desconto esse relativo à atribuição compulsória para a assistência médico-hospitalar e odontológica, destinada à Cruz Azul. Foi determinada, também, a restituição ao autor, se não teve uso dos serviços de assistência médica, hospitalar e odontológica correspondente, somente os valores que tenham sido descontados após a citação, com correção monetária e juros de 0,5% ao mês, aplicando-se a Tabela Prática para Cálculo de Atualização Monetária dos Débitos Judiciais editada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, bem como o pagamento de custas, despesas e honorários advocatícios de 10(dez por cento), reconhecida a natureza alimentar do crédito.

 A Caixa Beneficente da Polícia Militar do Estado de São Paulo interpôs recurso de apelação, pleiteando a reforma da r. sentença recorrida, julgando-se a ação improcedente, fls. 40/48.

 As contra-razões foram apresentadas  às fls. 51/52.

Pelo v. Acórdão de fls. 61/67, a Quinta Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça, determinou-se a remessa dos autos a este Colendo Colegiado para atendimento do art. 657 do Regimento Interno daquela Egrégia Corte.

Eis, em breve síntese, o relatório.

2) Da admissibilidade do incidente de inconstitucionalidade.

A questão de direito deve ser solucionada para que seja possível concluir-se o julgamento da apelação interposta pela Caixa Beneficente da Policia Militar do Estado de São Paulo.

Como anota José Carlos Barbosa Moreira, comentando o parágrafo único do art. 481 do CPC, “são duas as hipóteses em que se deixa de submeter a argüição ao plenário ou ao órgão especial: (a) já existe, sobre a questão, pronunciamento de um desses órgãos do tribunal em que corre o processo; (b) já existe, sobre a questão, pronunciamento do plenário do STF. A redação alternativa indica que é pressuposto bastante da incidência do parágrafo a ocorrência de uma delas” (Comentários ao CPC, vol.V, 13ªed., Rio de Janeiro, Forense, 2006, p.44).

No caso em exame, salvo eventual equívoco, a quaestio iuris – que se restringe à verificação da constitucionalidade do art. 1º da lei Complementar Estadual n. 1.013/2007, na parte que alterou a redação do art. 31 da Lei Estadual n. 452/1974 – não foi examinada pelo Plenário ou Órgão Especial.

De outro lado, e, de acordo com pesquisa informatizada, não há notícia    de     que a   validade dessa norma foi julgada pelo Supremo                                                                                           Tribunal Federal ou analisada por esse Sodalício sob a perspectiva aqui abordada. 

Assim, considerando que (a) a solução da quaestio iuris é imprescindível para o julgamento do recurso de apelação, e (b) ainda não houve declaração de inconstitucionalidade a seu respeito pelo E. STF ou por esse E. Tribunal de Justiça, é de ser admitido o processamento do presente incidente de inconstitucionalidade.

 

3) Fundamentação.

Depreende-se dos autos que a Lei Estadual n. 452/1974, instituiu a Caixa Beneficente da Polícia Militar do Estado de São Paulo.

O inciso I, do art. 6º da referida lei, dispõe que são contribuintes obrigatórios da CBPM, dentre outros, os oficiais e praças de serviço ativo.

O art. 30 da mesma lei, prevê a prestação da assistência médica-hospitalar e odontológica aos beneficiários dos contribuintes da CBPM pela Cruz Azul de São Paulo entidade conveniada à CBPM, tendo o valor da alíquota da contribuição  de 2% (dois por cento) sobre os proventos sido estipulada pelo art. 31, da Lei Estadual n. 452/1974, que foi modificado pelo art. 1º da Lei Estadual n. 1.013, de 6 de julho de 2007.

De acordo com o art. 1º , da citada Lei Estadual, o art. 31 da Lei Estadual n. 452/1974, passou a ter a seguinte redação:

A taxa de contribuição para assistência médico-hospitalar e odontológica é de 2% (dois por cento) da respectiva retribuição-base.

§ 1º - A taxa de contribuição dos pensionistas da CBPM é de 1% (um por cento) do valor da pensão que estejam percebendo.

§2º - As taxas de contribuição de que trata este artigo serão recolhidas diretamente à CBPM, que as repassará, de imediato, à cruz Azul de São Paulo.

§3º - A retribuição-base mensal será constituída dos vencimentos, indenização por sujeição ao Regime especial de trabalho policial Militar, gratificações, outras vantagens pecuniárias e proventos, excetuadas as parcelas relativas a salário-família, diárias, ajuda de custo, transporte, auxílio-funeral, representações de qualquer natureza e equivalente”.

Como se demonstrará a seguir, realmente o art. 1º da Lei Complementar Estadual n. 1.013, de 6 de julho de 2007, na parte em que modifica a redação do art. 31, da lei estadual n. 452/1974 é inconstitucional.

Em primeiro lugar, insta observar  que de acordo com o inciso XX do art. 5º da Constituição Federal, ninguém é obrigado a se associar ou permanecer associado.

Daí porque nem o autor, nem os servidores ativos, inativos  e pensionistas da Polícia Militar não podem ser compelidos a associarem-se à instituição da Cruz Azul de São Paulo, responsável pela assistência médica-hospitalar e odontológica, se assim não desejarem, em pese o art. 32 da Lei n. 452/1974, considerá-los contribuintes obrigatórios.

Acrescente-se, ainda, que o dispositivo legal impugnado, viola o parágrafo 1º do art. 149, da Constituição Federal, que admite a instituição de contribuição, cobrada de seus servidores, apenas para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social  mas, não de assistência à saúde.

Neste sentido, dos três elementos integrantes da seguridade Social (previdência,  assistência  social e saúde, apenas os dois primeiros (previdência e assistência social) podem ser organizados por qualquer dos entes federados, ao passo que saúde encontra forma de prestação própria, unificada, universal, genérica para todos, nos termos do art. 198, da Constituição Federal, mais conhecido como Sistema Único de Saúde.  

Por essas razões, o parecer é pela inconstitucionalidade  do art. 1º, da Lei Complementar n. 1.013, de 06 de julho de 2007, na parte em que modifica o art. 31 da Lei Estadual n. 452/1974.

 

                          São Paulo, 23 de junho de 2009.

 

 

Maurício Augusto Gomes

Subprocurador-Geral de Justiça

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