Processo nº  148.022.0/0

Recorrente: Associação dos Aposentados, Pré-Aposentados e Pensionistas da CETESB-AAPP

Recorrida: Fazenda do Estado de São Paulo

Objeto: expressão contida no art. 1º , da Lei Complementar Estadual nº 954, de 31 de dezembro de 2003.

 

 

 

Parecer em recurso extraordinário

 

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente

Colendo Supremo Tribunal Federal

Insignes Ministros.

 

 

        Trata-se de recurso extraordinário interposto pela Associação dos Aposentados, Pré-Aposentados e Pensionistas da CETESB-AAPP  (fls. 472/495), em face do v. acórdão de fls. 430/438, que julgou improcedente o incidente de inconstitucionalidade suscitado pela Terceira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que buscava a declaração da inconstitucionalidade da expressão contida no art. 1º, da Lei Complementar Estadual n. 954, de 31 de dezembro de 2003, sob o argumento de violação do disposto nos arts. 40, § 18, e 149,§1º, da Constituição Federal, fundamentando o inconformismo no permissivo contido no art.102, III, a,  da CR.

 

         Sustenta o recorrente a necessidade de reforma da decisão, na medida em que: (a) teria ocorrido ofensa ao direito adquirido, como também,  ao ato jurídico perfeito (art.5º XXXVI da CR), (b) redução de proventos, vedado pela conjugação do art. 37, inc. XV, com o art. 40,§3º, ambos da CR.

 

         Foram ofertadas contra-razões pela Fazenda do Estado de São Paulo (fls.511/521), sustentando: (a) o não conhecimento do recurso, por ausência de repercussão geral e por não cabimento; (b) ou, alternativamente, seu não provimento.

 

         Este é o breve relato do que consta dos autos.

 

1)Não admissibilidade do recurso extraordinário.

 

        O recorrente se insurge contra o v. acórdão de fls.430/438, proferido pelo E. Órgão Especial do Tribunal de Justiça, que julgou improcedente o incidente de inconstitucionalidade.

 

         A insurgência veiculada no recurso extraordinário volta-se, portanto, contra o acórdão que julgou improcedente o incidente de inconstitucionalidade.

 

         A conclusão que se pode extrair de tal situação, destarte, é de que o recurso não é cabível.

 

 

         Em primeiro lugar insta observar, que a pretensa violação à Carta Política decorre de infringência às Leis Estaduais 1386/51 e 4.819/58, que são normas de direito local insusceptíveis de revisão na via extraordinária.

 

          Desta feita, em conformidade com entendimento reiterado da Suprema Corte, a violação ao texto constitucional, necessita ser direta e frontal, para autorizar o recurso extraordinário.

 

         Assim sendo,  nos moldes da Súmula n. 280, do Supremo Tribunal Federal, o presente recurso  não deve ser conhecido.

 

2)Mérito.

 

        Admitindo, por apego à argumentação, que o recurso extraordinário venha a ser conhecido, não merecerá provimento.

 

 

 

         Como já mencionado anteriormente, a questão cinge-se a saber se a locução do artigo 1.º da Lei 954/03 “os servidores que recebem complementação de aposentadoria e pensão incluídas  suas autarquias e fundações”  é ou não constitucional, frente  aos  dispositivos da Constituição da  República.  A  Lei Complementar Estadual tem a seguinte redação:

 

'LEI COMPLEMENTAR Nº. 954, DE 31 DE DEZEMBRO DE 2003

Dispõe sobre a contribuição previdenciária mensal de inativos e pensionistas do Estado e dá providências correlatas

Artigo 1º - Os servidores inativos e os pensionistas do Estado, os Militares reformados e os da reserva, bem como os servidores que recebem complementação de aposentadoria e pensão, incluídas  suas autarquias e fundações, passam a contribuir, para o custeio do regime de que trata o artigo 40 da Constituição Federal, com a alíquota de 11% (onze por cento) sobre o valor dos proventos, das pensões, das aposentadorias, das vantagens pessoais e demais vantagens de qualquer natureza, excetuados o salário-esposa e o salário-família.

§ 1º - Aplica-se o disposto neste artigo aos membros da Magistratura, do Ministério Público e do Tribunal de Contas do Estado.

§ 2º - O décimo-terceiro salário será considerado para fins de incidência da contribuição a que se refere esta lei complementar.

§ 3º - Para os casos de acumulação remunerada, considerar-se-á, para fins de contribuição, o somatório das remunerações percebidas, observado o disposto no "caput" deste artigo.

§ 4º - A contribuição previdenciária a que se refere o "caput" incidirá apenas sobre a parcela dos proventos e das pensões que supere a 50% (cinqüenta por cento) do limite estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o artigo 201 da Constituição Federal.

Artigo 2º - Considera-se incluído na alíquota de 11% (onze por cento) a que se refere o artigo 1º o percentual de 6% (seis por cento) relativo à contribuição prevista no artigo 137 da Lei Complementar nº 180, de 12 de maio de 1978.

Parágrafo único - Fica mantida a contribuição pela alíquota de 6% (seis por cento) prevista no artigo 137 da Lei Complementar nº 180, de 12 de maio de 1978, até que seja iniciada a cobrança da nova contribuição instituída pelo artigo 1º desta lei complementar.

Artigo 3º - Os contribuintes obrigatórios referidos no artigo 2º da Lei Complementar nº 943, de 23 de junho de 2003, continuam sujeitos à alíquota total de 11% (onze por cento), que compreende a alíquota de 5% (cinco por cento) instituída pela mesma lei complementar e a contribuição de 6% (seis por cento) prevista no artigo 137 da Lei Complementar n.º  180,  de 12 de maio de 1978.

Parágrafo único - Vetado.

Artigo 4º - Os recursos arrecadados nos termos desta lei complementar, da Lei Complementar n.º 943, de 23 de junho de 2003, e da Lei Complementar nº 180, de 12 de maio de 1978, são classificados como receitas de contribuições sociais no orçamento do Instituto de Previdência do Estado - IPESP, quando referentes aos servidores públicos, e na Caixa Beneficente da Polícia Militar - CBPM, quando referentes aos militares, devendo ser destinados ao pagamento de aposentadorias ou pensões.

Parágrafo único - As disposições deste artigo aplicam-se inclusive aos recursos já arrecadados com fundamento na Lei Complementar nº 943, de 23 de junho de 2003.

Artigo 5º - Fica vedada a existência de mais de um regime próprio de previdência social para os servidores titulares de cargos efetivos, e de mais de uma unidade gestora do respectivo regime em cada ente estatal, ressalvado o disposto no artigo 142, § 3º, inciso X, da Constituição Federal.

Artigo 6º - Esta lei complementar entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos, quanto ao artigo 1º, após decorridos 90 (noventa) dias da data da publicação desta lei complementar.'

 

         O desconto da contribuição social previdenciária de aposentados e pensionistas, inclusive daqueles que recebem complementação   pelo Erário de benefícios do regime  geral,  tem substrato na  Constituição  da  República, especialmente, nos artigos 40,  194 e ss. e 202 e ss. Em primeiro  lugar, pelo fato de que  tais beneficiários recebem a título de complemento de aposentadoria,  com fundamento   nas  Lei   Estadual  n.º 1.386,  de 19 de dezembro de 1951 e Lei  n.º 4.819, de  26 de agosto de 1958      --  recebem a título de previdência  social   --       e não mera  liberalidade do Erário.   Por  tal razão, e   até pela interpretação histórica  da legislação que criou  tais benefícios,  somente pode-se entender que tais complementos de aposentadorias e  pensões  existam  a título  previdenciário, exclusivamente.

 

         Sabe-se que o Brasil tem hoje três  modalidades de regimes de previdência  sendo duas  públicas e obrigatórias e uma privada e facultativa.  As  duas  primeiras, públicas e obrigatórias: a) o regime geral da previdência social (INSS)  obrigatório para os trabalhadores  da iniciativa privada, aos servidores dos entes públicos que não tenham regimes  públicos próprios e aos empregados públicos; e b) o regime  de previdência destinados aos servidores titulares de cargos efetivos dos entes políticos (inclusive os mais  de  2.000 municípios que criaram regimes próprios de previdência para seus servidores). A terceira modalidade,  regime  de  previdência privada complementar facultativo divide-se em duas subespécies: a)  as operadas por entidades abertas da previdência complementar (com fins lucrativos); e b)  as  operadas por entidades fechadas de previdência complementar  sem fins lucrativos (fundos de pensão). 

 

 

 

                   Não há outro sistema possível, inclusive para estados e municípios (ver a     clara redação do art.  149, §1.º, da Constituição).  Somente,  pois,  pode-se entender  a complementação recebida  pelos associados da impetrante  como  benefícios  previdenciários.   Estão  inseridos no  sistema previdenciário, este     com  seus   princípios e fontes de  custeio, como  qualquer outros beneficiários de tal  sistema.  Assim estabelece a Constituição da República, no que interessa:

 

“Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

 

(...)

 

§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei.

 

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores:

I portadores de deficiência;

II que exerçam atividades de risco;

III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

 

§ 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.

 

§ 13 - Ao servidor ocupante, exclusivamente, de cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração bem como de outro cargo temporário ou de emprego público, aplica-se o regime geral de previdência social.

 

§ 14 - A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo,   poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata este artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201.

 

§ 15. O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida.

 

§ 16 - Somente mediante sua prévia e expressa opção, o disposto nos  §§ 14 e 15 poderá ser aplicado ao servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do correspondente regime de previdência complementar.

 

§ 18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos.

 

 

DA SEGURIDADE SOCIAL

 

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

 

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio;

VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados.

 

 

Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter  complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.

 

§ 1° A lei complementar de que trata este artigo assegurará ao participante de planos de benefícios de entidades de previdência privada o pleno acesso às informações relativas à gestão de seus respectivos planos.

 

§ 2° As contribuições do empregador, os benefícios e as condições contratuais previstas nos estatutos, regulamentos e planos de benefícios das entidades de previdência privada não integram o contrato de trabalho dos participantes, assim como, à exceção dos benefícios concedidos, não integram a remuneração dos participantes, nos termos da lei.”

 

         O Colendo STF assim decidiu  o tema da previdência social  -- no   julgamento referente à Emenda n.º 41/03 --     (Informativo STF-357):

 

 

         'O Tribunal concluiu julgamento de ações diretas de inconstitucionalidade ajuizadas pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP e pela Associação Nacional dos Procuradores da República - ANPR contra o art. 4º, da EC 41/2003, que impõe aos servidores públicos aposentados e aos pensionistas, em gozo de benefícios na data de publicação da referida Emenda, bem como aos alcançados pelo disposto no seu art. 3º, a obrigação tributária de pagar contribuição previdenciária com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos  (...) Ressaltou-se, inicialmente, que as contribuições são tributos,  sujeitas a regime jurídico próprio, e cuja propriedade decorre da destinação constitucional  das receitas e da submissão às finalidades específicas estabelecidas pelo art. 149, da CF, do qual se extrai que as mesmas podem ser instituídas pela União e pelos Estados e Municípios como instrumento de atuação na área social. Daí, por força do disposto no art. 195, da CF, com a redação da época da edição da EC 41/2003, a atuação estatal nas áreas da saúde, previdência e assistência social, cujos direitos são o conteúdo objetivo da seguridade social, deve ser custeada por toda a sociedade, de forma  direta e indireta, nos termos da lei, por meio dos recursos provenientes dos orçamentos dos entes federados e das contribuições sociais previstas nos incisos I a III do referido artigo. Em relação ao caput do art. 4º da EC 41/2003, as ofensas alegadas pelos requerentes foram afastadas por estas razões: a) por serem as contribuições espécie de tributo, não há como opor-lhes a garantia constitucional ao direito adquirido: a.1) a norma que institui ou majora tributos incide sobre fatos posteriores à sua entrada em vigor; a.2) não consta do rol dos direitos  subjetivos inerentes à situação de servidor inativo o de imunidade tributária absoluta dos proventos correlatos. Assim, sendo a percepção de proventos de  aposentadorias e pensões  fato gerador da contribuição previdenciária (EC 41/2003, art. 4º,  parágrafo único), não obstante a condição de aposentadoria, ou inatividade, representar situação jurídico-subjetiva sedimentada que, regulando-se por normas jurídicas vigentes à data de sua consolidação, é intangível por lei superveniente no núcleo substantivo desse estado pessoal, não se poderia conferir ao servidor inativo nem ao pensionista verdadeira imunidade tributária absoluta, sem previsão constitucional, quanto aos fatos geradores ocorridos após a edição da EC 41/2003, observados os princípios constitucionais da irretroatividade e da anterioridade (CF, art. 150, III, a e art. 195, §6º); b) o princípio constitucional de irredutibilidade da remuneração dos servidores públicos não se estende aos tributos porque não implica imunidade tributária; c) a utilização da percepção de proventos como fato gerador da contribuição previdenciária não configura ‘bis in idem’  de imposto sobre a renda: as contribuições previdenciárias não constituem imposto. Para discerni-las, além do fato gerador e da base de cálculo, há de se levar em consideração os fatores distintivos constitucionais da finalidade da instituição e da destinação das receitas (CF, arts. 149 e 195). Também não consubstancia bitributação o  fato de as contribuições apresentarem a mesma base de cálculo do imposto sobre a renda em relação aos inativos, haja vista a existência de autorização constitucional expressa (CF, art. 195, II); d) a  contribuição instituída não se faz sem causa, razão por que não se há de falar em confisco ou discriminação sob o fundamento de que "não atende aos princípios da generalidade e da universalidade (art. 155, parágrafo 2º, I), já que recai só sobre uma categoria de pessoas": d.1) a EC 41/2003 transmudou a natureza do regime previdencial que, de solidário e distributivo, passou a ser meramente contributivo e, depois, solidário e contributivo, por meio da previsão explícita de tributação dos inativos, "observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial", em face da necessidade de se resolver o colapso havido no sistema, em decorrência, dentre outros fatores, da queda da natalidade, do acesso aos quadros funcionais públicos, do aumento da expectativa de vida do brasileiro e, por conseguinte, do período de percepção do benefício; d.2) o sistema previdenciário, objeto do art. 40 da CF nunca foi de natureza jurídico-contratual, regido por normas de direito privado. O valor pago pelo servidor a título de contribuição previdenciária nunca foi nem é prestação sinalagmática, mas tributo destinado ao custeio da atuação do Estado na área da previdência social; d.3) o regime previdenciário público visa garantir condições de subsistência, independência e dignidade pessoais ao servidor idoso por meio do pagamento de proventos da aposentadoria durante a velhice e, nos termos do art. 195 da CF, deve ser custeado por toda a sociedade, de forma direta e indireta, o que se poderia denominar princípio estrutural da solidariedade; d.4) o regime previdenciário assumiu caráter contributivo para efeito de custeio eqüitativo e equilibrado dos benefícios, sem prejuízo da observância dos princípios do parágrafo único do art. 194 da CF: universalidade, uniformidade, seletividade e distributividade, irredutibilidade, equidade no custeio e diversidade da base de financiamento. Assim, os elementos sistêmicos figurados no "tempo de contribuição", no "equilíbrio financeiro e atuarial" e na "regra de contrapartida" devem ser interpretados em conjunto com os princípios supracitados; e) a cobrança, em si, da contribuição dos inativos não ofende o princípio da isonomia: e.1) o advento da EC 41/2003 estabeleceu, em tese, a existência de três grupos de sujeitos passivos distintos: os aposentados até a data da publicação da Emenda (que se aposentaram com vencimentos integrais); os que se aposentarão após a data de sua edição, mas que ingressaram no serviço público antes dela (que, numa fase de transição, poderão aposentar-se com proventos integrais, observadas as regras do art. 6º da EC 41/2003); os que ingressaram e se aposentarão após a publicação da Emenda (que poderão, no caso do §14 do art. 40 da CF, sujeitar-se ao limite atribuído ao regime geral da previdência - CF, art. 201 - e equivalente a dez salários mínimos); e.2) o fato de já estarem aposentados à data da publicação da Emenda não pode retirar a responsabilidade social pelo custeio, já que seu tratamento previdenciário é diverso do reservado aos servidores da ativa; e.3) o caráter contributivo e solidário da previdência social impede essa distorção, que implicaria ofensa ao princípio da "equidade na forma de participação de custeio" (CF, art. 194, IV). De outro lado, em relação ao parágrafo único do art. 4º da norma impugnada, entendeu-se configurada a violação ao princípio da igualdade por estes fundamentos: a) o fato de alguns serem inativos ou pensionistas dos Estados, do DF ou dos Municípios não legitima o tratamento diferenciado dispensado aos servidores inativos e pensionistas da União, que  se encontram em idêntica situação jurídica; b) o fato de ter-se aposentado o servidor antes ou depois da publicação da Emenda não justifica tratamento desigual quanto à sujeição do tributo. Salientou-se que o parágrafo único do art. 4º da EC 41/2003, ao criar exceção à imunidade prevista no §18 do art. 40 da CF, com a redação dada pela própria Emenda, faz exceção, da mesma forma, à imunidade do inciso II do art. 195 da CF, aplicável, por extensão, aos servidores inativos e pensionistas, por força da interpretação teleológica e do disposto no §12 do art. 40 da CF ("Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.... §12. Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.... §18. Incidirá contribuição sobre os proventos de aposentadorias e pensões concedidas pelo regime de que trata este artigo que superem o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201, com percentual igual ao estabelecido para os servidores titulares de cargos efetivos."; "Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:... II - do trabalhador e dos demais segurados da previdência social, não incidindo contribuição sobre aposentadoria e pensão concedidas pelo regime geral de previdência social de que trata o art. 201;"). Diante disso, e considerando o caráter unitário do fim público dos regimes geral de previdência e dos servidores públicos e o princípio da isonomia, concluiu-se que o limite a que alude o inciso II do art. 195 da CF - R$2.400,00 (EC 41/2003, art. 5º) - haveria de ser aplicado a ambos os regimes, sem nenhuma distinção. Julgou-se, por maioria, improcedente o pedido em relação ao caput do art. 4º da EC 41/2003. Vencidos, no ponto, os Ministros Ellen Gracie, relatora, Carlos Britto, Marco Aurélio e Celso de Mello que consideravam que a norma impugnada ofendia dispositivos constitucionais que estariam a salvo da atividade reformadora (CF, art. 60, §4º, IV). Declarou-se, por unanimidade, a inconstitucionalidade das expressões "cinqüenta por cento do" e "sessenta por cento do" constantes, respectivamente, dos incisos I e II do parágrafo único do art. 4º da EC 41/2003, pelo que se aplica, à hipótese do artigo 4º da EC 41/2003, o §18 do artigo 40 do texto permanente da Constituição, introduzido pela mesma Emenda constitucional.

ADI 3.105/DF E ADI 3.128/DF, REL. ORIG. MIN. ELLEN GRACIE, REL. P/ ACÓRDÃO MIN. JOAQUIM BARBOSA, 18.8.2004 (ADI 3.105) (ADI 3.128)"

 

 

         Assim, o sistema previdenciário, hoje, implica na obrigatoriedade da  contribuição social.  Conclusão  que o método  lógico-sistemático  de  interpretação,  ao preconizar o exame da lei em  seu conjunto orgânico e no sistema jurídico vigente,  faz reforçar.     Sem  que se possa analisar as normas isoladamente, já que,  "não se pode conhecer, de modo algum, o Direito, levando em conta uma norma, senão um sistema" (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO,  “Considerações em torno dos Princípios Hermenêuticos”, in “RDP”, 21/143).   Na interpretação das leis, leciona CARLOS MAXIMILIANO,  é "... dever do aplicador comparar e procurar  conciliar as disposições várias sobre o mesmo objeto, e do conjunto, assim harmonizado, deduzir o sentido e alcance de cada uma" (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, n.439, 9a. ed., pág. 356).           Consoante   PIERANDREI, "le norme, una volta poste in essere  dalla loro fonte di produzione, non rimangono isolate l'una nei confronti dell'altra, e como chiuse in la loro attribuire dalla fonte; invece si inveriscono nel sistema   complessivo, e sono soggette alle influgenze che nei loro confronti viene ad exercitare l'evoluzione dell'ordinamento, a seguito degli sviluppi della vita sociale" (“Corte Costituzionale”, Enciclopedia dell Diritto”, vol.I, 982).

 

 

 

         E os Estados federados  podem legislar sobre  previdência  social, como fez o Estado de São Paulo com o artigo 1.º da Lei 954/03, autorizado pela Constituição da República e seguindo os princípios  do atual sistema  previdenciário pátrio,  de caráter solidário:

 

“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

 

(...)

 

 

XII - previdência social, proteção e defesa da saúde (...)

 

§ 1º - No âmbito da legislação concorrente, a competência da União limitar-se-á a estabelecer normas gerais.

 

§ 2º - A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados.

 

§ 3º - Inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.

 

§ 4º - A superveniência de lei federal sobre normas gerais suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrário.”

         Lembre-se novamente  que  as leis estaduais     ns.  1.386/51 e 4.819/58  pretenderam equiparar a previdência dos   empregados públicos  com a dos (então chamados) funcionários públicos.[1]  Hoje  os   sistemas previdenciários  são  apenas três e  bem definidos (supra); o princípio da solidariedade      -- princípio geral da previdência social --    indica  que os aposentados devem suportar a contribuição social, um tributo, nada mais.    Não se pode  negar o caráter previdenciário  da complementação de aposentadorias e pensões tratada nos autos,  extinta em 1974, mas ainda com beneficiários anteriores (e até  posteriores, devido a decisões judiciais),   e sujeita   à contribuição social.  

 

         Ora, ao  lado da contribuição de melhoria,  a  Constituição  da República  prevê  a instituição de  outras contribuições. Como assente dizer,  a hipótese de incidência dessas contribuições está na atividade  estatal indiretamente referida ao obrigado,  tendo por  referência: a) a conseqüência ou efeito da ação estatal, estabelecido o nexo  que vincula o obrigado à referida  ação;  ou  b)  decorrência de situação  ou atividade do obrigado  que provoca ação estatal e estabelece o nexo entre esta e aquele.

 

         Tais tributos, espécies  de  imposições vinculadas ao lado das taxas, têm como particularidade o fato de a Constituição,  apartando a chamada 'contribuição de melhoria', chamar de  'sociais'  algumas delas,   insinuando  suas  hipóteses de incidência (art. 195, I, e §8.º) e  no que concerne às demais,  referir-se apenas às finalidades a que  podem atender.  Tarefa magna ficou, pois, ao legislador ordinário, que tem maior liberdade  para criá-las e definí-las, sendo que, evidentemente, deverá ater-se aos pressupostos que a Constituição  giza, como por exemplo, fazer recair a base de cálculo no chamado elemento  intermediário  e  também na eleição dos seus contribuintes, substancialmente diversos dos impostos e taxas.

 

         Sem dúvida,   devem receber os valores os aposentados e  pensionistas  associados da impetrante,    pela garantia do seu direito adquirido, mas a Constituição não previu imunidade tributária alguma para essa  categoria de cidadãos.  Entendimento  diverso  qual seja, o   que  nega o caráter previdenciário a esses complementos de aposentadoria  levaria  à falta  de  fundamento constitucional    para as complementações, eis que não é dado à  Fazenda Pública efetuar  liberalidades.

 

 

 

         Diante do exposto, aguarda esta Procuradoria-Geral de Justiça o não conhecimento do recurso extraordinário, ou então, alternativamente, caso seja conhecido, seu não acolhimento, mantendo-se o v. acórdão recorrido por seus próprios e adequados fundamentos.

 

 

São Paulo, 30 de junho de 2008.

 

 

MAURÍCIO AUGUSTO GOMES

PROCURADOR DE JUSTIÇA

no exercício de função delegada

Pelo Procurador-Geral de Justiça

        

 

        

        

 

        



[1] Lei n.º 4.819/58. “Art. 1.º  Fica criado o ‘Fundo de Assistência Social do Estado’ com a finalidade de conceder aos servidores das autarquias, das sociedades anônimas em que o estado seja detentor da maioria das ações e dos serviços industriais de propriedade de administração estadual, as seguintes vantagens já a concedidas aos demais servidores públicos: (...)

II – complementação das aposentadoria e  concessão de pensões nos termos das leis 1.386/58 (...)”