Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Autos nº.  990.10.093827-4

Suscitante:  Décima Terceira Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça   

Objeto:   Decreto Legislativo n. 30, de 02 de março de 2005, do Município de Guatapará.

 

Parecer do Ministério Público

Ementa: Decreto Legislativo n. 30, de 02 de março de 2005, do Município de Guatapará, que revogou expressamente o Decreto Municipal n. 196, de 14 de março de 1997, que por sua vez revogou o Decreto n. 193, de 07 de março de 1997, que havia proibido, por irregularidades constatadas, a comercialização de lotes no loteamento “Jardim Maria Luiza I”. Inconstitucionalidade pela ofensa ao Princípio da Separação e da Harmonia entre os Poderes (art. 5º, caput, da Constituição Estadual e art. 2º, da Constituição Federal). Parecer pela procedência da tese de inconstitucionalidade.

 

Colendo Órgão Especial

Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator

1)   Relatório.

     Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado pela 13ª Câmara de Direito Público desse E. Tribunal de Justiça, em sede de Ação Declaratória de Inconstitucionalidade de ato Legislativo, em face da Câmara Municipal de Guatapará, objetivando a declaração da inconstitucionalidade do Decreto Legislativo n. 30, de 02 de março 2005 que revogou expressamente o Decreto Municipal n. 196, de 14 de março de 1997, que por sua vez revogou o Decreto n. 193, de 07 de março de 1997, que havia proibido, por irregularidades constatadas, a comercialização de lotes no loteamento “Jardim Maria Luiza I.

     Seu pedido foi julgado procedente em 1º grau de jurisdição,  (fls. 141/143).

     A Câmara  Municipal de Guatapará, interpôs recurso de apelação, objetivando a reforma da r. sentença recorrida, para que seja reconhecida a constitucionalidade do Decreto Legislativo impugnado, fls. 148/161.

     Contra-razões a fls. 172/178.

     Examinando essa apelação, a 13ª. Câmara de Direito Público do E. Tribunal de Justiça suscitou o incidente de inconstitucionalidade do Decreto Legislativo n. 30, de 02 de março de 2005, do Município de Guatapará.

    Eis, em breve síntese, o relatório.

   

2) Fundamentação.

Através da legislação impugnada, pretende a Câmara de Guatapará interferir em assunto da competência do Executivo.

         Com efeito, o Decreto Legislativo  n. 30, de 02 de março 2005 revogou expressamente o Decreto Municipal n. 196, de 14 de março de 1997, que por sua vez revogou o Decreto n. 193, de 07 de março de 1997, que havia proibido, por irregularidades constatadas, a comercialização de lotes no loteamento “Jardim Maria Luiza I.

         Com tal prática, referido decreto acabou recriando o Decreto Municipal n. 193, de 07 de março de 1997,  que impedia a continuação de venda de lotes no mencionado loteamento, o que se afigura inconstitucional.

Isto porque, o Decreto impugnado, de fato, é verticalmente incompatível com a regra da iniciativa reservada e com o princípio da independência e harmonia entre os Poderes.

Com efeito, o Decreto Legislativo não pode dispor sobre o uso e ocupação do solo, nem alterar a legislação específica sobre o tema.

Na organização político-administrativa brasileira, o governo municipal apresenta funções divididas. O Prefeito é o responsável pela função administrativa, enquanto que a função básica da Câmara é a legislativa, ou seja, a edição de normas gerais e abstratas de conduta, que devem pautar toda atuação administrativa. 

Como essas atribuições foram preestabelecidas pela Constituição, de modo a prevenir conflitos, qualquer tentativa de um Poder de exercer as atribuições de outro Poder tipifica nítida violação do princípio da independência e harmonia entre os Poderes previsto no caput do art. 5º da Constituição do Estado de São Paulo:

Artigo 5º - São Poderes do Estado, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.

A Câmara Municipal, ao editar Decreto Legislativo cuja matéria diz respeito a atos de gestão de administração, revogando Decreto Municipal, claramente viola a regra da iniciativa reservada, pois à vista do princípio da independência e harmonia entre os Poderes (CE, art. 5º e CF, art.2º), a Câmara não está autorizada a deflagrar decreto legislativo para dispor sobre o uso e a ocupação do solo, providência que depende da apresentação de projeto de lei que é de iniciativa reservada ao Prefeito.

         Observe-se, também, que referido Decreto contraria o parágrafo único do art. 58, da Lei Orgânica do Município de Guatapará, na medida em que extrapola as funções da Câmara Municipal.

         Por tal motivo, é de se declarar a sua inconstitucionalidade.

2)    Conclusão.

Diante do exposto, somos pela declaração da inconstitucionalidade do Decreto Legislativo n. 30, de 02 de março de 2005, do Município de Guatapará.

 

              São Paulo, 15 de março de 2010.

 

 

Maurício Augusto Gomes

Subprocurador-Geral de Justiça

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