Autos n. 990.10.545879-3
Suscitante: Vigésima Quinta Câmara de Direito Público
Objeto da impugnação: Art. 56, do Decreto n. 15.521/08, do
Município de Santo André
Ementa: Art.
56, do Decreto n. 15.521/08, do Município de Santo André. Instauração de incidente determinada pelo Órgão Fracionário do Egrégio
Tribunal de Justiça, que declarou vislumbrar a inconstitucionalidade do citado
dispositivo legal. Restrição de
prestação de serviços essenciais. Violação
ao princípio da isonomia e da dignidade do ser humano. Parecer pela
inconstitucionalidade da norma.
Excelentíssimo
Senhor Desembargador Relator
Colendo
Órgão Especial
Trata-se
de Acórdão proferido pela Vigésima Quinta Câmara de Direito Público do Egrégio
Tribunal de Justiça, no julgamento da Apelação Cível n. 990.09.335279-6, que suscitou
a instauração de incidente de inconstitucionalidade, determinando a remessa dos
autos ao Excelso Órgão Especial, por força da Súmula Vinculante n. 10 do
Supremo Tribunal Federal, mas sem decidir a questão da constitucionalidade do art.
56 do Decreto n. 15.521/08, do Município de Santo André, que restringe o
fornecimento de serviços essenciais aos proprietários, usufrutuários e
locatários de imóvel.
É
o breve relatório.
Com a advertência de que o
parecer se restringe à questão prejudicial, o parecer é no sentido da
inconstitucionalidade do dispositivo legal impugnado.
A
Constituição em vigor consagrou o Município como entidade federativa
indispensável ao nosso sistema federativo, integrando-o na organização
político-administrativa e garantindo-lhe plena autonomia, como se observa da
análise dos arts. 1.º, 18, 29, 30 e 34, VI, “c” da CF (Cf. Alexandre de Moraes,
in “Direito Constitucional”, Atlas, 7.ª ed., p. 261).
Essa
autonomia consagrada aos Municípios não tem caráter absoluto e soberano, muito
pelo contrário, encontra limites nos princípios emanados dos poderes públicos e
dos pactos fundamentais, que instituíram a soberania de um povo (Cf. De Plácido
e Silva, “Vocabulário Jurídico”, Forense, Rio de Janeiro, Volume I, 1984, p.
251), sendo definida por José Afonso da Silva como “a capacidade ou poder de
gerir os próprios negócios, dentro de um círculo prefixado por entidade
superior”, que no caso é a Constituição (Cf. “Curso de Direito Constitucional
Positivo”, Malheiros Editores, São Paulo, 8.ª ed., 1992, p. 545).
A
autonomia municipal se assenta em quatro capacidades básicas:
(a) auto-organização, mediante a elaboração de
lei orgânica própria;
(b)
autogoverno, pela eletividade do Prefeito e dos Vereadores as respectivas
Câmaras Municipais;
(c) autolegislação, mediante competência de
elaboração de leis municipais
sobre áreas que são
reservadas à sua competência exclusiva e suplementar;
(d)
auto-administração ou administração própria, para manter e prestar os serviços
de interesse local (Cf. José Afonso da Silva, ob. cit., p. 546).
Contudo,
não se encontra dentro desta autonomia, o poder do Município tratar de forma
desigual os seus administrados, sem violação aos princípios da isonomia e da
impessoalidade.
Com efeito, independentemente da forma como se
apresenta o indivíduo frente à Administração, se proprietário, usufrutuário,
locatário, ou POSSUIDOR, tem ele o direito de se utilizar dos serviços
essenciais prestados pelo Município, sem qualquer distinção.
Aliás,
negar o fornecimento de água, coleta de esgoto, luz, coleta de lixo e outros
tantos, sem dúvida alguma se traduz em transgressão ao princípio da dignidade
do ser humano, como já vislumbrado no V. Acórdão que suscitou a
inconstitucionalidade do vergastado dispositivo legal.
Ademais,
porque rico o V. Acórdão em julgados que demonstram a inconstitucionalidade
apontada e de argumentos no mesmo sentido, desonerados nos sentimos de nova
coletânea a demonstrar o mesmo modo de pensar.
Em
suma, a inconstitucionalidade é flagrante.
Em
tais circunstâncias, o parecer é no sentido do acolhimento da tese da inconstitucionalidade.
São Paulo, 6 de dezembro de
2010.
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
fjyd