Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade de Lei

 

Processo n. 990.10.575487-2

Suscitante: 13ª Câmara de Direito Público

Objeto: Lei n. 3.286/2009

 

Ementa: Lei n. 3.286/2009, que revogou a Lei n. 3.036/2008, que fixou os subsídios dos Secretários Municipais para a legislatura 2009/2012. Alteração de subsídio na mesma legislatura, sem estabelecer novos valores. Violação ao princípio da anterioridade, da legalidade e da irredutibilidade dos vencimentos. Inconstitucionalidade constatada.

 

Colendo Órgão Especial

 

 

 

         Trata-se de incidente de inconstitucionalidade da Lei Complementar n. 3.286/2009, suscitado pela colenda 13ª Câmara de Direito Público desse Egrégio Tribunal de Justiça no julgamento de recurso de apelação interposto pela Fazenda Municipal de São José do Rio Pardo, cuja procedência foi decretada em primeiro grau de jurisdição (fls.180/191).

         É o relatório.

         A Lei n. 3.286/2009,  do Município de São José do Rio Pardo, na medida em que  revogou a Lei n. 3.036/2008, que fixou os subsídios dos Secretários Municipais para a legislatura 2009/2012, violou os princípios constitucionais da anterioridade, da legalidade e da irredutibilidade, eis que alterou mencionados subsídios na mesma legislatura, sem estabelecer novos valores, sendo por tal razão inconstitucional.

         No âmbito municipal, os subsídios do Prefeito, do Vice – Prefeito e dos Secretários Municipais são fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e seu § 2º, I ( Cf., art. 29, inciso V ).

A autonomia municipal, entretanto, não é absoluta. O artigo 144 da Constituição Paulista é firme quando impõe aos Municípios o respeito aos princípios estabelecidos na Constituição Federal. O princípio da legalidade, reproduzido, como em tantas outras ocasiões, no artigo 111 da Constituição do Estado, é por isso obrigatório aos Municípios.

        Um dos fundamentos da ação recai sobre a alegada inobservância do princípio da anterioridade, ou seja, a lei municipal que revogou a Lei n. 3.036/2008 que fixou os subsídios dos Secretários Municipais para a legislatura de 2009/2012, foi promulgada em fevereiro de 2009,  portanto, posteriormente ao resultado do pleito eleitoral.

         Conquanto não haja qualquer norma constitucional expressa, no sentido de que essa fixação deve ocorrer antes do pleito, em decorrência de construção jurisprudencial, e com acerto, proíbe-se que os edis, após conhecerem o resultado das eleições, possam fixar a própria remuneração para a legislatura seguinte e para a qual podem vir a ser reeleitos. Procura-se tutelar, com isso, a moralidade administrativa e o patrimônio público.

Ainda que se recuse a observância da regra da anterioridade da legislatura aos subsídios do Chefe do Poder Executivo local e seus auxiliares por interpretação literal do art. 29, V, da Constituição Federal, é absolutamente seguro que a revisão de seus subsídios deve observar o princípio da legalidade remuneratória.

A discussão cinge-se à irredutibilidade dos vencimentos.

Isto porque, a garantia da irredutibilidade de vencimentos é modalidade qualificada do direito adquirido, pressupondo-se a aquisição do direito a determinada remuneração, como já restou decidido no RE 298.694, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 23/4/04.

Bem a propósito, a correta interpretação da cláusula constitucional da “irredutibilidade” já foi estabelecida pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, nos seguintes termos:

“A garantia constitucional da irredutibilidade do estipêndio funcional traduz conquista jurídico-social outorgada, pela Constituição da República, a todos os servidores públicos (CF, art. 37, XV), em ordem a dispensar-lhes especial proteção de caráter financeiro contra eventuais ações arbitrárias do Estado. Essa qualificada tutela de ordem jurídica impede que o Poder Público adote medidas que importem, especialmente quando implementadas no plano infraconstitucional, em diminuição do valor nominal concernente ao estipêndio devido aos agentes públicos. A cláusula constitucional da irredutibilidade de vencimentos e proventos — que proíbe a diminuição daquilo que já se tem em função do que prevê o ordenamento positivo (RTJ 104/808) — incide sobre o que o servidor público, a título de estipêndio funcional, já vinha legitimamente percebendo (RTJ 112/768) no momento em que sobrevém, por determinação emanada de órgão estatal competente, nova disciplina legislativa pertinente aos valores pecuniários correspondentes à retribuição legalmente devida." (ADI 2.075-MC, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ 27/06/03)”

         Desta feita, a legislação impugnada não poderia reduzir e muito menos ter deixado de fixar os subsídios dos Secretários Municipais.

          Isto posto, o parecer é pela declaração de inconstitucionalidade da Lei n. 3.286/2009, do Município de Santa Cruz do Rio Pardo.

 

São Paulo, 27 de dezembro de 2010.

 

 

         Sérgio Turra Sobrane

         Subprocurador-Geral de Justiça

         Jurídico

vlcb