Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade
Processo n. 0005322-16.2014.8.26.0000
Suscitante: 6ª Câmara de Direito Público
Ementa: Constitucional. Administrativo. Incidente de Inconstitucionalidade. Sexta-Parte. Base de Cálculo. Não conhecimento. Lei anterior ao parâmetro constitucional vigente. É descabido o controle incidental de constitucionalidade de lei anterior ao parâmetro constitucional, resolvendo-se a questão pelas normas de direito intertemporal.
Egrégio Tribunal:
1. No julgamento de apelações
interpostas contra respeitável sentença que julgou parcialmente procedente ação
condenatória movida por (...) em face da Municipalidade de Sertãozinho para a
incidência da sexta-parte sobre os vencimentos integrais, a colenda 6ª Câmara
de Direito Público do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
suscita incidente de inconstitucionalidade os arts. 45 e 65 da Lei Complementar
n. 50/96, do Município de Sertãozinho, por afronta ao art. 37, IV, da
Constituição Federal (fls. 182/190).
2. É o relatório.
3. A Lei Complementar n. 50/96 prevê
o seguinte:
“Art. 45 – Remuneração é o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens permanentes estabelecidas em lei.
(...)
Art. 65 – O servidor que completar vinte anos no serviço público municipal perceberá a sexta-parte de sua remuneração, à qual se incorporará automaticamente, para todos os efeitos”.
4. Afirma o venerando acórdão que o
entendimento da douta turma julgadora é a incidência da sexta-parte sobre os
vencimentos integrais (padrão e verbas incorporadas) excluindo-se adicionais
por tempo de serviço e parcelas eventuais. No caso em tela, prossegue o
acórdão, a vantagem incide sobre o padrão e adicionais por tempo de serviço
excluindo-se adicional de insalubridade, auxílio-alimentação. Por isso, suscita
o incidente assentando que:
“Ora, sendo considerada remuneração o valor do padrão do cargo (vencimento) mais as vantagens permanentes estabelecidas em lei, e, sendo os adicionais temporais vantagens permanentes e incorporadas, à evidência que a consideração do recálculo da sexta-parte sobre a remuneração, importará em incidência recíproca de adicional sobre adicional” (fls. 187/188).
5. Salvo melhor juízo, o art. 45 da
lei local não é inconstitucional ao definir remuneração englobante das
vantagens. Aliás, não se infere que o acórdão pretenda seu exame neste
incidente, até porque, mercê da menção ao preceito, manifesta que a expressão
“remuneração” contida no art. 65 é inconstitucional porque “permite a
acumulação de acréscimos pecuniários para fins de cômputo dos acréscimos
ulteriores” (fl. 188).
6. Também aproveito o ensejo para
registrar que o parâmetro é o inciso XIV do art. 37 da Constituição Federal, e
não o inciso IV (fl. 188). Tal regra assim dispõe:
“os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados para fins de concessão de acréscimos ulteriores”.
7. Objetivo da norma é a vedação do
efeito cascata ou repique.
8. O caso inculcaria a dispensa de
interpretação conforme a Constituição sem redução de texto para apuração do
sentido da norma local compatível com a Carta Magna. Entretanto, o Supremo
Tribunal Federal vem proclamando a inexistência de inconstitucionalidade:
“CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ADICIONAIS DE TEMPO DE SERVIÇO E DA SEXTA-PARTE. EFEITO CASCATA. OFENSA AO ART. 37, XIV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO OCORRÊNCIA NA ESPÉCIE. 1. A Carta da República, em seu art. 37, XIV, trata da ocorrência do denominado ‘efeito cascata’, ou seja, quando um acréscimo pecuniário se incorpora à base de cálculo de outro sob o mesmo título ou idêntico fundamento. Na espécie, não ocorre o referido efeito, pois as vantagens advêm de fundamentos diversos. 2. Agravo a que se nega provimento” (STF, AgR-AI 527.521-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Ellen Gracie, 01-06-2010, v.u., DJe 25-06-2010).
9. A
respeito da sexta-parte, a Suprema Corte predicou que “a parcela não caracteriza gratificação por tempo de
serviço, mas melhoria de vencimento alcançada com implemento de condição
temporal, integrando-o e servindo de base a outras parcelas” (STF, RE
219.740-SP, 2ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio, 11-09-2001, v.u., DJ 09-11-2001,
p. 55).
10. Bem
é verdade que a Emenda Constitucional n. 19/98 modificou o art. 37, XIV, da
Carta Magna, suprimindo sua parte final. A primitiva redação da norma
condicionava a proibição de repique à natureza jurídica dos acréscimos, com a
seguinte redação:
“os acréscimos pecuniários percebidos por servidor público não serão computados nem acumulados, para fins de concessão de acréscimos ulteriores, sob o mesmo título ou idêntico fundamento”.
11. A eliminação da expressão “sob o
mesmo título ou idêntico fundamento” teria, em tese, potencialidade para um
novo entendimento sobre o tema.
12. Porém, como se trata de lei
municipal anterior (Lei Complementar n. 50, de 28 de maio de 1996) à nova
redação que recebeu o inciso XIV do art. 37 da Constituição de 1988 pela Emenda
n. 19, de 04 de junho de 1998, descabe seu controle de constitucionalidade
porque a inconstitucionalidade é sempre congênita nunca superveniente. A
hipótese é de conflito de direito intertemporal, pois, a norma superior
superveniente revoga norma inferior antecedente naquilo que a contrariar.
13. Face ao exposto, opino pelo não
conhecimento do incidente.
São
Paulo, 03 de fevereiro de 2014.
Nilo Spinola Salgado Filho
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
wpmj