Parecer em
Incidente de Inconstitucionalidade
Processo nº 0033119-30.2015.8.26.0000
Suscitante: 6ª Câmara
de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo
Ementa:
1)
Incidente de
inconstitucionalidade. Art. 3º da Lei Estadual nº 13.541/09 – Lei Antifumo.
2) Delegação de poder de polícia. Impossibilidade. Violação dos arts. 5º, § 1º, 220 e seu § 2º e 229, § 3º da Constituição Estadual.
3)
Parecer pela admissão
e acolhimento do incidente de inconstitucionalidade.
Excelentíssimo Senhor Desembargador Relator,
Colendo Órgão Especial:
Trata-se
de arguição de inconstitucionalidade suscitada pela C. 6ª Câmara de Direito
Público, quando do julgamento da Apelação nº 0008482-67.2013.8.26.0361, proveniente
da Vara da Fazenda Pública da Comarca de Mogi das Cruzes, figurando como
Relator o Desembargador Evaristo dos Santos.
A Col. Câmara argui a
inconstitucionalidade do art. 3º da Lei Estadual nº 13.541/09, por afronta aos
arts. 5º, XIII, 21, XXIV, 22, XVI, 70, parágrafo único, 149 e 175 da
Constituição Federal e aos arts. 5º, § 1º, 47, XVI, 220, § 2º e 229, § 3º, da
Constituição Estadual.
É o relato do essencial.
1 - O art. 3º da Lei Estadual nº 13.541/09 tem a
seguinte redação:
“Artigo 3º - O responsável pelos
recintos de que trata esta lei deverá advertir os eventuais infratores sobre a
proibição nela contida, bem como sobre a obrigatoriedade, caso persista na
conduta coibida, de imediata retirada do local, se necessário mediante o
auxílio de força policial.”
2 - O poder de polícia é composto por fases, que se conjugam, ao fim, para a concretização de um ato.
A primeira fase é justamente aquela que cria limitação ao particular; A limitação pode ocorrer por diversas formas, mas o essencial é que ela seja criada pelo ente competente por meio de lei. Esta fase, obviamente, só poder ser exercida pelo ente público (União, Estados ou Municípios), posto que o único investido na capacidade de legiferar; Jamais pessoas jurídicas de direito privado ou até mesmo entidades da Administração indireta poderão exercê-la, uma vez que não detêm esta prerrogativa.
Já o consentimento de polícia e a fiscalização de polícia podem ser delegados a terceiros, desde que, obviamente, haja ato legal do ente competente conferindo esta função. Trata-se de atos complementares ou instrutórios, que não criam obrigações ou medidas coercitivas ao particular. É o que ocorre com o ato fiscalizatório. O concessionário, por exemplo, apura a eventual ocorrência de uma infração e a remete para análise do ente competente, que averiguará se é caso ou não de exercer o Poder de Polícia.
Por fim, a sanção de polícia nada mais é do que a penalização do particular faltante. Por se tratar de ato máximo de coerção, somente o ente público competente pode exercê-lo, sem possibilidade de delegação.
De acordo com
Marçal Justen Filho, “Não se admite que o
Estado transfira, ainda que temporariamente, o poder de coerção jurídica ou
física para a iniciativa privada. Isso não significa a que algumas atividades
materiais acessórias ou conexas ao exercício de particulares. O que não se
admite é que a imposição coercitiva de deveres seja exercitada por terceiros,
que não os agentes públicos”[1].
Nesse sentido já decidiu
o Supremo Tribunal Federal:
“DIREITO
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 58 E SEUS PARÁGRAFOS DA LEI FEDERAL Nº 9.649, DE 27.05.1998, QUE
TRATAM DOS SERVIÇOS DE FISCALIZAÇÃO DE PROFISSÕES REGULAMENTADAS.
1.
Estando prejudicada a Ação, quanto ao § 3º do art. 58 da Lei nº 9.649, de 27.05.1998, como
já decidiu o Plenário, quando apreciou o pedido de medida cautelar, a Ação
Direta é julgada procedente, quanto ao mais, declarando-se a
inconstitucionalidade do "caput" e dos § 1º, 2º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º
do mesmo art.58. 2. Isso
porque a interpretação conjugada dos artigos 5º, XIII, 22, XVI, 21,XXIV, 70, parágrafo único, 149 e 175 da Constituição Federal,
leva à conclusão, no sentido da indelegabilidade, a uma entidade privada, de
atividade típica de Estado, que abrange até poder de polícia, de tributar e de
punir, no que concerne ao exercício de atividades profissionais regulamentadas,
como ocorre com os dispositivos impugnados. 3. Decisão unânime.” (ADI nº
1.717-6/DF – j. em 07.11.02 – Rel. Min. Sydney Sanches)
O dispositivo normativo contestado impõe ao particular o dever de advertir e de retirar do local, inclusive com uso de força policial, os particulares que infringirem as proibições estabelecidas na lei. São atos sancionatórios cuja imposição coercitiva está sendo delegada a particular, confrontando com os arts. 5º, § 1º, 220 e seu § 2º e 229, § 3º da Constituição Estadual mostrando-se, pois, inconstitucionais.
Diante do exposto, nosso parecer
é no sentido do conhecimento do incidente de inconstitucionalidade e de seu
acolhimento, declarando inconstitucional o art. 3º da Lei Estadual nº 13.541/09, do
Município de São Paulo.
São
Paulo, 18 de junho de 2015.
Nilo Spinola Salgado Filho
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
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