Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Processo n. 0056709-36.2015.8.26.0000

Suscitante: 3ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Incidente de Inconstitucionalidade. Preliminar. Emenda n. 36/2013 à Lei Orgânica do Município de São Paulo. Não Conhecimento. Manutenção do interesse de agir. Emenda n. 39/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo. Guarda Municipal. Aposentadoria diferenciada de seus integrantes. Procedência. 1. No tocante à Emenda n. 36/2013, da Lei Orgânica do Município de São Paulo, o incidente de inconstitucionalidade não deve ser conhecido. Questão já enfrentada pelo Órgão Especial, nos autos do Incidente de Inconstitucionalidade nº 0027469-02.2015.8.26.0000. 2. Emenda n. 39/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, de autoria do Poder Executivo, que reproduziu a redação do art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, nos termos da Emenda n. 36/2013. 3. Não observância de lei complementar para dispor de requisitos e critérios diferenciados para concessão de aposentadoria, conforme estabelece o art. 126 da Constituição do Estado. 4. Usurpação da competência legislativa privativa da União com violação do princípio federativo (art. 1º da Constituição Estadual). Compete à União legislar sobre a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores públicos que exerçam atividades de risco (art. 40, § 4º c.c. o art. art. 24, XII, da Constituição Federal). Violação do princípio federativo (arts. 1º e 144 da Constituição Paulista) decorrente da repartição constitucional de competências. 5. Guardas Civis Municipais são servidores públicos efetivos sujeitos ao regime próprio de previdência social. Vedação de adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria. Violação do art. 126 da Constituição Estadual.

 

 

 

Egrégio Tribunal:

 

Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado pela Colenda 3ª Câmara de Direito Público no julgamento de apelação interposta contra respeitável sentença que julgou mandado de segurança impetrado por servidora pública municipal, ocupante do cargo de Guarda Civil Metropolitano, a fim de obter aposentadoria especial, tendo como fundamento o inciso II do § 1° do art. 88, na redação dada pela Emenda n. 36, de 17 de dezembro de 2013, da Lei Orgânica do Município de São Paulo. O venerando acórdão tem a seguinte fundamentação (fls. 121/122):

“(...)

Por força do princípio da simetria, assim como em razão do artigo 144 da Carta Bandeirante, impõe-se reconhecer que a iniciativa para a Emenda Constitucional tratando de regras de aposentadoria de servidor municipal, é de competência exclusiva do Chefe do Poder Executivo Municipal, razão pela qual, a Emenda à Lei Orgânica Municipal, tratando dessa temática, originada de Projeto iniciado por Vereadores, mostra-se inconstitucional.

Em vista desta constatação, e em respeito à cláusula da Reserva do Plenário, deve ser suspenso o julgamento deste apelo, para ser suscitado o incidente de inconstitucionalidade da Emenda à Lei Orgânica Municipal nº 36/2013, perante o Órgão Especial nos termos dos artigos 480 e 481, caput do Código de Processo Civil.

(...)”

A fls. 129/130, a Sra. (...) informou que, tendo em vista a alteração da Emenda n. 36/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo promovida pela Emenda n. 39/2015, de iniciativa do Poder Executivo, o vício de inconstitucionalidade suscitado estaria sanado, ensejando a extinção do processo, por perda superveniente do objeto.

         É o relatório.

PRELIMINARMENTE

Em primeira análise, existe óbice à instauração do incidente no que diz respeito à redação do art. 88 dada pela Emenda n. 36/2013 à Lei Orgânica do Município de São Paulo.

É que, nos termos do art. 481, parágrafo único, do CPC, “os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”.

Referida questão constitucional já foi enfrentada pelo C. Órgão Especial no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade nº 0027469-02.2015.8.26.0000:

“(...)

“ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE – EMENDA Nº 36/2013, DE INICIATIVA PARLAMENTAR, QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO ARTIGO 88, DA LEI ORGÂNICA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO – GUARDA MUNICIPAL – APOSENTADORIA DIFERENCIADA DE SEUS INTEGRANTES – IMPOSSIBILIDADE – VÍCIO DE INICIATIVA – INVASÃO DA COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO CHEFE DO PODER EXECUTIVO – VÍCIO FORMAL RECONHECIDO – AFRONTA AOS ARTIGOS 5º; 24, 4; 126, §4º E 144, TODOS DA CONSTITUIÇÃO ESTADUAL – PRECEDENTES. ARGUIÇÃO ACOLHIDA.”

Como depreende-se da ementa acima transcrita, houve pronunciamento por parte do C. Órgão Especial reconhecendo a inconstitucionalidade da Emenda n. 36/2013 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, obstando, pois, o conhecimento do incidente.

Não bastasse, noticiou-se o advento da Emenda n. 39/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, responsável por alterar o dispositivo legal contestado, corroborando a perda do objeto do incidente de inconstitucionalidade no que diz respeito à Emenda n. 36/2013.

MANUTENÇÃO DO INTERESSE DE AGIR

Por sua vez, a Emenda n. 39, de 24 de junho de 2015, à Lei Orgânica do Município de São Paulo, de iniciativa do Executivo, estabeleceu:

“Art. 1º O art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 88. O Município manterá sua Guarda Municipal, a qual se denomina Guarda Civil Metropolitana, destinada à proteção da população da cidade, dos bens, serviços e instalações municipais, e para a fiscalização de posturas municipais e do meio ambiente.

§ 1º Os seus integrantes serão aposentados, de forma voluntária, nos termos do art. 40, § 4º, II e III, da Constituição da República, sem limite de idade, com paridade e integralidade do último salário que receber, desde que comprovem:

I - 25 (vinte e cinco) anos de contribuição, contando com pelo menos 15 (quinze) anos de efetivo exercício em cargo da Carreira de Guarda Civil Metropolitano, para mulher;”

II - 30 (trinta) anos de contribuição, contando com pelo menos 20 (vinte) anos de efetivo exercício em cargo da Carreira de Guarda Civil Metropolitano, para homem.

§ 2º A Guarda Civil Metropolitana poderá exercer dentro de suas funções a segurança e proteção nas escolas públicas municipais, no âmbito da cidade de São Paulo.

Art. 2º Esta emenda à Lei Orgânica entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.”

         Em sua redação originária, dispunha o artigo 88 da LOM:

“Art. 88 - O Município poderá, mediante lei, manter Guarda Municipal, subordinada ao Prefeito e destinada à proteção dos bens, serviços e instalações municipais.”

Não obstante a nova redação dada ao art. 88, através da Emenda n. 39/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, de iniciativa do Poder Executivo, persiste o interesse de agir.

Em que pese a iniciativa ter sido do Chefe do Poder Executivo, corrigindo-se o vício formal anteriormente existente, a redação atual do art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo - idêntica ao texto concedido pela Emenda n. 36/2013 - é notadamente inconstitucional, por violação aos arts. 1º, 126 e 144, da Constituição do Estado de São Paulo. Senão vejamos.

         De proêmio, importante esclarecer que a Constituição Federal instituiu um regime próprio de previdência dos entes federativos, vedando a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores titulares de cargos efetivos (art. 40, §§ 4º e 12, da Constituição Federal):

“Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

I - portadores de deficiência; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

II - que exerçam atividades de risco; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

III - cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)

(...)

§ 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98)

A Constituição Federal, em seu art. 40, § 4º, entretanto, ressalvou a possibilidade de, por meio de lei complementar, serem adotados requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores portadores de deficiência e aos que exerçam atividades de risco ou sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

Não foi outra a disposição da Constituição Estadual:

“Artigo 126 – Aos servidores titulares de cargos efetivos do Estado, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

(...)

§ 4º - É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores:

1 - portadores de deficiência;

2 - que exerçam atividades de risco;

3 - cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.

(...)

§ 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.

(...)”.

Destarte, as Constituições federal e estadual permitem a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos servidores titulares de cargos efetivos, desde que a previsão seja feita por meio de lei complementar – impedindo, portanto, a normatização da matéria por Lei Orgânica Municipal.

Não bastasse, o esquema de repartição de competências entre os entes federados – expressão do princípio federativo – conferiu à União e aos Estados, sem espaço para os Municípios, a competência concorrente para legislar sobre previdência social (art. 24, XII, da Constituição Federal).

Quanto ao tema em apreço, entretanto, sequer o Estado tem competência para legislar, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 797.905, interposto em face de decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, proferida em sede de mandado de injunção, ao proclamar que: “A omissão referente à edição da Lei Complementar a que se refere o art. 40, §4º, da CF/88, deve ser imputada ao Presidente da República e ao Congresso Nacional.”

No julgamento observou o Ministro Relator Gilmar Mendes que:

“Sobre o tema, esta Corte assentou que, apesar de a competência legislativa ser concorrente, a matéria deve ser regulamentada uniformemente, em norma de caráter nacional, de iniciativa do Presidente da República.

A propósito, cito os seguintes precedentes: MI-ED 4.366, Rel. Min. Dias Toffoli, Pleno, DJe 12.2.2014; MI-AgR 1.328, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Pleno, DJe 2.12.2013; RE-AgR 745.628, Rel. Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, DJe 4.11.2013; MI-AgR 1.545, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Pleno, DJe 08.06.2012; MI-AgR 1.832, Rel. Min. Cármen Lúcia, Pleno, DJe de 18.05.2011; e MI 1.898-AgR/DF, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Pleno, DJe 1.6.2012, cuja ementa colaciono a seguir:

‘CONSTITUCIONAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS. DECISÃO QUE CONCEDE A ORDEM PARA DETERMINAR QUE A AUTORIDADE ADMINISTRATIVA COMPETENTE ANALISE A SITUAÇÃO FÁTICA DO IMPETRANTE À LUZ DO ART. 57 DA LEI 8.213/1991. AGRAVO REGIMENTAL DA UNIÃO. ALEGAÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA E DE INCOMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS ESTADUAIS E MUNICIPAIS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. A Corte firmou entendimento no sentido de que a competência concorrente para legislar sobre previdência dos servidores públicos não afasta a necessidade da edição de norma regulamentadora de caráter nacional, cuja competência é da União. Por esse motivo, a Corte assentou a legitimidade do Presidente da República para figurar no polo passivo de mandado de injunção sobre esse tema. Precedentes. Agravo regimental desprovido’.

Adotando-se a conclusão supramencionada, ainda que se admita que os guardas civis exerçam atividade de risco, o Município, ao reconhecer por lei tal circunstância e estabelecer regime de aposentadoria e benefícios previdenciários diferenciados, violou o princípio federativo, haja vista tratar-se de matéria cuja disciplina está subordinada à lei complementar de competência da União.

Nem se alegue a existência de competência complementar municipal, fundada na autonomia para legislar sobre assunto de interesse local.  Inexistem motivos suficientes a normatização municipal, eis que a disciplina de regras diferenciadas para aposentadoria de servidores consiste em tema de interesse nacional, notadamente além dos limites do Município. Sem contar o fato de que a multiplicidade de normas e critérios tornaria impossível a compensação entre os regimes.

Assim, ao disciplinar matéria de competência da União, o legislador municipal extrapolou sua competência limitada à regular assuntos de interesse predominantemente local.

Ainda que assim não fosse, em termos acadêmicos, o tema foi bem examinado por Fernanda Menezes Dias de Almeida, assentando que a colisão de competências resolve-se pela prevalência das “determinações emanadas do titular da competência legislativa privativa” (Competências na Constituição de 1988, São Paulo: Atlas, 2ª ed., p. 159).

A autonomia das entidades federativas pressupõe repartição de competências legislativas, administrativas e tributárias. Trata-se de um dos pontos caracterizadores e asseguradores da existência e de harmonia do Estado Federal.

A base do conceito do Estado Federal reside exatamente na repartição de poderes autônomos, que, na concepção tridimensional do Estado Federal Brasileiro, se dá entre a União, os Estados e os Municípios.

É através desta distribuição de competências que a Constituição Federal garante o princípio federativo, assentado nos arts. 1º e 18 da Constituição da República, bem como no art. 1º da Constituição Paulista.

Referindo-se aos princípios fundamentais da Constituição, que revelam as opções políticas essenciais do Estado, José Afonso da Silva aponta que, entre eles, podem ser inseridos, “os princípios relativos à existência, forma, estrutura e tipo de Estado: República Federativa do Brasil, soberania, Estado Democrático de Direito (art. 1º)” (Curso de direito constitucional positivo, 13. ed., São Paulo, Malheiros, 1997, p. 96, g.n.).

Um dos aspectos de maior relevo, que representa a dimensão e alcance do princípio do pacto federativo adotado pelo Constituinte em 1988, é justamente o que se assenta nos critérios adotados pela Constituição Federal para a repartição de competências entre os entes federativos, bem como a fixação da autonomia e dos respectivos limites, dos Estados, Distrito Federal e Municípios, em relação à União.

Por essa linha de raciocínio, pode-se afirmar que o art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, com a redação dada pela Emenda n. 39/2015, trata de matéria cuja competência é do legislador federal ou estadual, desrespeitando a repartição constitucional de competências e o princípio federativo.

Enfatiza-se.

O art. 40 da Constituição Federal, com a redação dada pelas Emendas Constitucionais n. 20/98, n. 41/2003 e n. 47/2005, seguido pela Constituição Estadual (art. 126), instituiu um regime próprio de previdência social a ser observado pelos entes federados.

Assegurou, assim, aos servidores titulares de cargos efetivos da União, Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados os critérios aptos a preservar o equilíbrio financeiro e atuarial.

As aposentadorias por invalidez permanente, compulsória e voluntária foram disciplinadas de forma clara pelo § 1º do art. 40 da Constituição Federal, reproduzido no § 1º do art. 126 da Constituição Estadual.

Os Guardas Civis Municipais, por serem servidores públicos efetivos sem qualquer regime especial previsto ou admitido pela Constituição Federal (e Estadual), estão submetidos às regras do regime geral de previdência dos servidores públicos, sendo vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria.

Assim, a inauguração de regime diferenciado com diminuição no tempo de contribuição e sem limite etário, previsto no art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, com a redação dada pela Emenda n. 39/2015, violou o art. 40 da Constituição Federal reproduzido no art. 126 da Constituição Estadual.

           E não é só.

           A análise do art. 40 da Constituição Estadual denota que a Emenda Constitucional n. 20/1998 vinculou os proventos de aposentadoria e as pensões à remuneração do cargo efetivo, como critério para o seu cálculo e como limite máximo para a sua concessão (§§ 2º e 3º do artigo 40), mantendo o reajustamento dos proventos e pensões na mesma proporção e na mesma data dos servidores ativos (§ 8º do artigo 40).

           A Emenda n. 41/2003, por sua vez, manteve a previsão de remuneração do cargo efetivo como limite máximo para os proventos de aposentadoria e para as pensões (§ 2º do artigo 40), porém estabeleceu: a) a necessidade de, no cálculo dos benefícios, serem observados os históricos contributivo e de remuneração do servidor, na forma da lei (§ 3º), b) uma nova forma de reajuste, passando a assegurar a preservação de seu valor real, também conforme critérios estabelecidos em lei (§ 8º).

Cumprindo essa determinação constitucional, os critérios para cálculo dos benefícios foram definidos no artigo 1º da Lei n. 10.887/2004, que adotou parâmetros semelhantes aos previstos para o RGPS:

“Art. 1o No cálculo dos proventos de aposentadoria dos servidores titulares de cargo efetivo de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, previsto no § 3º do art. 40 da Constituição Federal e no art. 2º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, será considerada a média aritmética simples das maiores remunerações, utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência a que esteve vinculado, correspondentes a 80% (oitenta por cento) de todo o período contributivo desde a competência julho de 1994 ou desde a do início da contribuição, se posterior àquela competência.”

Daí porque, no caso em análise, a previsão de proventos de aposentadoria em valor equivalente à integralidade da remuneração do cargo em que ela se der viola a regra do § 3º do art. 40 da Constituição Federal, reproduzida no § 3º do art. 126 da Constituição Estadual. Segue a redação dos dispositivos:

Constituição Federal

Art. 40 – (...)

§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)

“Constituição Estadual

Art. 126. (...)

§ 3º - Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o artigo 201 da Constituição Federal, na forma da lei.”

Por derradeiro, a prescrição de que os Municípios devem observar os princípios constitucionais estabelecidos não se encontra apenas no art. 144 da Constituição Paulista. O art. 29, caput, da Constituição Federal, prevê que os Municípios, ao editarem suas leis orgânicas deverão respeitar os “princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado (...)”.

Dessa forma, no incidente de inconstitucionalidade aqui analisado, conclui-se que a Emenda n. 39/2015, responsável por dar nova redação ao art. 88 da Lei Orgânica do Município de São Paulo, invadiu espaço reservado à competência normativa federal, violando a repartição constitucional de competências - manifestação mais contundente do princípio federativo - em desrespeito a princípio constitucional estabelecido.

Essas são as razões pelas quais restou configurada, outrossim, a ofensa ao disposto no art. 1º e no art. 144, ambos da Constituição do Estado de São Paulo.

Face o exposto, opino: a) pelo não acolhimento do incidente de inconstitucionalidade no que diz respeito à Emenda n. 36/2013 à Lei Orgânica do Município de São Paulo; b) no sentido de ser acolhido o incidente de inconstitucionalidade em relação à Emenda n. 39/2015 à Lei Orgânica do Município de São Paulo, noticiada nos autos, por contrastar com os arts. 1º, 126 e 144, da Constituição do Estado; c) para que seja indeferido o pedido inserto a fls. 129/130.

                            São Paulo, 26 de outubro de 2015.

 

Nilo Spinola Salgado Filho

Subprocurador-Geral de Justiça

Jurídico

ms/mjap