Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade
Processo 0064125-55.2015.8.26.0000
Suscitante: 9ª Câmara de Direito Público do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Ementa:
1. Constitucional e Previdenciário. Art.
8º, I e III, e § 3º, "a", e art. 9º, III e 67, II da Lei Complementar
nº 11/2003, do Município de Taquarituba. Perda da qualidade de dependente e
extinção da pensão por morte do filho ou equiparado e do irmão ou irmã ao
completarem 18 (dezoito) anos. Previsão, na mesma lei, da condição de
dependente - equiparado ao filho não emancipado menor de 18 (dezoito) anos ou
inválido - do menor de 21 (vinte e um) anos que esteja sob a tutela comprovada
do segurado e não possua bens suficientes para o próprio sustento e educação.
2. Tratamento díspare dispensado a
situações iguais. Ofensa ao princípio da isonomia (CF, art. 5º, caput).
3. Parecer pela procedência da arguição.
Excelentíssimo
Senhor Desembargador Relator,
Colendo Órgão
Especial:
No julgamento de Apelação nº 3002687-28.2013.8.26.0620 da
Comarca de Taquarituba, a C. 9ª Câmara de Direito Público do Egrégio Tribunal
de Justiça do Estado de São Paulo suscitou a instauração de incidente de
inconstitucionalidade, determinando a remessa dos autos ao Excelso Órgão
Especial, para apreciação da inconstitucionalidade incidentalmente dos arts. 8º e 9º da Lei Complementar nº 11/2003, do Município de
Taquarituba.
Os
dispositivos legais inquinados assim dispõem:
“Artigo 8º - Para os
efeitos desta lei, consideram-se dependentes:
I - o cônjuge ou companheiro ou companheira e o filho não emancipado
de qualquer condição, menor de 18 (dezoito) anos ou inválido;
(...)
III - o irmão ou irmã não emancipado, de qualquer condição,
menor de 18 (dezoito) anos ou inválido, desde que não tenha meios próprios de
subsistência.
(...)
§ 3º. Equiparam-se aos filhos, nas condições do inciso I,
mediante declaração escrita do segurado e desde que comprovada a dependência
econômica, na forma estabelecida no § 7º, do artigo 11:
a) o enteado ou a enteada menor de 18 (dezoito);
(...)"
Artigo 9º - A perda da qualidade de dependente ocorre:
(...)
III - para os filhos ou equiparados e os irmãos menores, ao
completarem 18 (dezoito) anos de idade ou pela emancipação, salvo se inválidos na
forma desta lei.
(...)
Embora a arguição não tenha mencionado, pelas mesmas razões que a motivaram, também deve ser incluído o art. 67, II, mencionado no corpo do v. acórdão, de seguinte teor:
"Art. 67. A quota da pensão por morte se extingue:
(...)
II - para o filho ou equiparado e o irmão de ambos os sexos,
quando completar 18 (dezoito) anos de idade, salvo se inválido;
(...)"
Em verdade, a apontada inconstitucionalidade não se estende ao texto completo de todos os incisos supra transcritos, mas tão somente à expressão "18 (dezoito) anos de idade", porque conflita com o art. 8º, § 3º, "b" da mesma lei, que reconhece a condição de dependente - equiparado aos filhos, mediante declaração escrita do segurado e desde que comprovada a dependência econômica - ao menor de 21 (vinte e um) anos que esteja sob sua tutela comprovada e não possua bens suficientes para o próprio sustento e educação.
Assim dispõe o art. 8º, § 3º, "b" da lei:
"Artigo 8º - Para os efeitos desta lei, consideram-se
dependentes:
(...)
§ 3º - Equiparam-se aos filhos, nas condições do inciso I,
mediante declaração escrita do segurado e desde que comprovada a dependência
econômica, na forma estabelecida no § 7º, do artigo 11:
(...)
b) o menor de 21 (vinte e um) anos que esteja sob sua tutela
comprovada e não possua bens suficientes para o próprio sustento e educação.
(...)"
O v. acórdão, na parte que interessa, está assim ementado (fls. 223/227):
“ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGOS 8º E 9º DA LC 11/2003. MUNICÍPIO DE TAQUARITUBA. PENSÃO POR MORTE. BENEFICIÁRIOS. DESIGUALDADE DE TRATAMENTO QUANTO À LIMITAÇÃO ETÁRIA. Filho maior de 18 anos. Não enquadramento no rol de dependentes. Perda da qualidade de beneficiário para o filho que alcançar os 18 anos de idade independentemente da capacidade econômica para o próprio sustento e educação. Menor sob tutela. Persistência da qualidade de beneficiário pelo tutelado até o limite de 21 anos de idade. Desigualdade de tratamento. Maior restrição etária em relação ao filho do segurado. Possível ofensa ao Princípio Constitucional da Isonomia. Obrigatoriedade de atendimento da cláusula de reserva de plenário. Artigo 97 da CF/88 e Súmula Vinculante n. 10 do STF."
O recurso começou a ser analisado, mas a conclusão no sentido da inconstitucionalidade levou à instauração do presente incidente.
É o relatório.
O
incidente e a arguição de inconstitucionalidade comportam acolhida,
para que seja declarada a inconstitucionalidade da expressão "18 (dezoito)
anos de idade" contida no art. 8º, I e III, e § 3º, "a", no art.
9º, III e no art. 67, II, da Lei Complementar nº 11/2003, do Município de
Taquarituba, nos termos do v. acórdão da C. 9º Câmara de Direito Público (fls.
223/227).
A
inconstitucionalidade da expressão [ou idade] é manifesta.
A lei conferiu tratamento díspare a situações
análogas, dispondo regramento desigual a situações semelhantes.
De um lado a lei estabeleceu a idade de 18 (dezoito)
anos para a perda da condição de dependente e para a extinção da pensão por
morte aos filhos, equiparados e irmãos de
qualquer condição (ou seja, dependentes economicamente ou não), salvo se
inválidos; de outro, prescreveu a idade de 21 (vinte e um) anos aos
comprovadamente tutelados, dependentes economicamente, que não possuam bens
suficientes para o próprio sustento e educação.
Ao reconhecer como dependente o tutelado até os 21
(vinte e um) anos de idade economicamente dependente do segurado, a lei cometeu
injustiça - por ofensa ao princípio da igualdade - com os filhos e irmãos
maiores de 18 (dezoito) anos que se encontrem nessa mesma condição de
hipossuficiência.
A disparidade é patente e, pois, deve ser
reequilibrada, a fim de que se mantenha íntegra a lição Aristotélica de "tratar igualmente os iguais e
desigualmente os desiguais na medida de suas desigualdades", e de
assegurar assim a almejada igualdade substancial.
Celso Antônio Bandeira de Mello, em sua monografia
sobre o tema do princípio da igualdade, fala em três questões que devem ser
observadas, sob pena de desrespeito ao aludido princípio (Conteúdo jurídico do princípio da igualdade, p. 21, 23-43):
"a) a primeira diz com o elemento tomado como fator de desigualação; b) a
segunda reporta-se à correlação lógica abstrata existente entre o fator erigido
em critério de discrímen e a disparidade estabelecida no tratamento
jurídico diversificado; c) a terceira atina à consonância desta correlação
lógica com os interesses absorvidos no sistema constitucional e destarte
juridicizados".
Na hipótese, não há qualquer razão plausível para se
prestigiar tutelados em detrimento
dos filhos e irmãos dependentes economicamente do segurado. As situações são
iguais, razão pela qual merecem tratamento isonômico.
De outra parte, em sede de direito previdenciário, o
Supremo Tribunal Fedeal tem aplicado o princípio
da norma mais favorável ao segurado e seus dependentes (STF, Tribunal Pleno, ARE 709212/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, j.
em 13.11.2014; Primeira Turma, RE 612982 AgR/PE, rel. Min. Luiz Fux, j. em
28.05.2013), que conduz à declaração de inconstitucionalidade da idade de 18
(dezoito) anos e não a de 21 (vinte e um) para cessação da dependência e
extinção do benefício.
Portanto, a inconstitucionalidade da expressão
"18 (dezoito) anos de idade" contida nos arts. 8º, I e III, e § 3º,
"a", 9º, III e 67, II, da Lei Complementar nº 11/2003, do Município
de Taquarituba há que ser declarada.
Ante o exposto, nosso parecer é no sentido do conhecimento do incidente e de seu acolhimento, para declarar a inconstitucionalidade da expressão "18 (dezoito) anos de idade" contida nos arts. 8º, I e III, e § 3º, "a", 9º, III e 67, II, da Lei Complementar nº 11/2003, do Município de Taquarituba.
São Paulo, 28 de outubro de 2015.
Nilo Spinola Salgado Filho
Subprocurador-Geral de Justiça
Jurídico
lfmm