Parecer em incidente de Inconstitucionalidade

 

Processo nº 0170607-95.2013.8.26.0000

Suscitante: 13ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça

 

 

Ementa: Incidente de inconstitucionalidade do art. 122, parágrafo único, alínea "b", parte final, da Lei Orgânica do Município de Martinópolis, que submete a concessão do afastamento à discricionariedade. Limitações ao direito de licença para o exercício de mandato eletivo em sindicato representativo da categoria.  Norma parâmetro (art. 125, § 1º, CE) aplicável tão somente aos servidores públicos estaduais. Parecer pelo desacolhimento do incidente.

 

 

 

Colendo Órgão Especial,

Excelentíssimo Senhor Desembargador Presidente:

 

(...) impetrou Mandado de Segurança contra o Prefeito Municipal de Martinópolis, para garantir seu afastamento do cargo de servidora pública municipal, para exercer mandato eletivo como presidente do sindicato dos funcionários públicos do Município de Martinópolis, sem prejuízo de seus vencimentos e demais vantagens.

Pela r. sentença de fls. 133/136, a pretensão esposada na inicial foi acolhida, da qual adveio apelação.

O recurso foi regularmente processado, sem contrarrazões da recorrida (fl. 220).

O v. Acórdão de fls. 229/234 determinou a suspensão do julgamento da apelação, para que, em atenção à cláusula da reserva de Plenário (Súmula vinculante nº 10), o E. Órgão Especial se pronuncie sobre a constitucionalidade do art. 122, parágrafo único, alínea "b", parte final, da Lei Orgânica do Município de Martinópolis.

Este é o resumo do que consta dos autos.

Com todo respeito, nosso entendimento é de que o incidente deva ser desacolhido, ante a falta de inconstitucionalidade do questionado dispositivo legal.

A irresignação da autora é contra a limitação do direito de afastamento, sujeito à discricionariedade estabelecida no preceito em tela, que assim dispõe:

"Artigo 122 - O funcionário Público poderá sindicalizar-se livremente.

Parágrafo Único: A entidade sindical que congregue mais de 100 associados garantirá ao seu presidente:

(...)

b) afastamento remunerado, se entender conveniente."

Por seu turno, a previsão da Constituição Estadual é a seguinte:

“art. 125 - O exercício do mandato eletivo por servidor público far-se-á com observância do art. 38 da Constituição Federal.

§ 1º- Fica assegurado ao servidor público, eleito para ocupar cargo em sindicato de categoria, o direito de afastar-se de suas funções, durante o tempo em que durar o mandato, recebendo seus vencimentos e vantagens, nos termos da lei.”

A Constituição Federal consagrou o direito à livre associação sindical (art. 8º, V), inclusive em favor dos servidores públicos civis (art. 37, VI), mas em nenhuma de suas passagens ela trata da questão do afastamento remunerado de servidor eleito dirigente sindical e da possibilidade de sujeição à discricionariedade de quem quer que seja, matérias essas que, portanto, poderão ser disciplinadas livremente pelas entidades federativas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), nos limites de sua autonomia administrativa.

                   Nesse sentido, HELY LOPES MEIRELLES ensina que:

  “A competência para organizar o serviço público é da entidade estatal a que pertence o respectivo serviço. Sobre esta matéria as competências são estanques e incomunicáveis. As normas estatutárias federais não se aplicam aos servidores estaduais ou municipais, nem as do Estado-membro se estendem aos servidores dos Municípios.” (g.n.)

Cada entidade estatal é autônoma para organizar seus serviços e compor seu pessoal. Atendidos os princípios constitucionais e os preceitos das leis nacionais de caráter complementar, a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios instituirão seus regimes jurídicos, segundo suas conveniências administrativas e as forças de seus erários (CF, arts. 39 e 169)” (Cf. ‘Direito Administrativo Brasileiro’, Malheiros, São Paulo, 28.ª edição, 2003, atualizada por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho, p. 403).

Como se vê, na organização de seus serviços e na fixação de regras peculiares ao seu funcionalismo, os Municípios devem obediência apenas aos princípios da Constituição Federal e às leis nacionais de caráter complementar que versem sobre o assunto, não podendo, assim, a Constituição Estadual impor limites a sua autonomia (Cf. Pontes de Miranda, “Comentários à Constituição de 1946”, v. 1, p. 486), sob pena de tornar letra morta os dispositivos constitucionais federais que consagram a autonomia municipal (CF, arts. 18 e 30, inciso I).

 Decorre daí que a regra prevista no art. 125, § 1º, da Carta Política Estadual, não é de observância compulsória pelos Municípios, os quais podem dispor livremente sobre a organização de seu próprio funcionalismo, nos limites da autonomia municipal consagrada nos arts. 18 e 30, inciso I, da Constituição Republicana.

Na verdade, a norma constitucional estadual adotada como parâmetro de controle de constitucionalidade, na presente ação, é que se afigura inconstitucional, porquanto disciplina matéria peculiar ao regime jurídico do funcionalismo, a qual é reservada com exclusividade ao Executivo, ex vi do disposto no art. 24, § 2º, 4, da Constituição do Estado de São Paulo.

Demais, cumpre obtemperar, a Carta Política em vigor assegura ao servidor público apenas o direito à livre associação sindical, que é consubstanciado na capacidade de filiar-se ou manter-se filiado, mas não o direito ao afastamento remunerado de servidor eleito dirigente sindical, durante o prazo de duração do mandato.

Isto posto, o parecer é pelo não acolhimento do presente incidente de inconstitucionalidade.

 

São Paulo, 14 de outubro de 2013.

 

 

        Sérgio Turra Sobrana

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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