Parecer em Incidente de Inconstitucionalidade

 

 

Processo n. 0170844-32.2013.8.26.0000

Suscitante: 13ª Câmara de Direito Público

 

 

 

 

 

 

Ementa: Constitucional. Administrativo. Incidente de Inconstitucionalidade. Não conhecimento. § 2º do art. 43 da LCE 1.059/08, na redação dada pela LCE 1.122/10. Servidor público. Licença-prêmio. Conversão em pecúnia. Limite remuneratório. Improcedência. 1. O incidente de inconstitucionalidade não se consubstancia em consulta do órgão julgador fracionário ao tribunal pleno nem tem outra finalidade senão a declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum, competindo ao órgão fracionário, em qualquer hipótese, se pronunciar sobre a inconstitucionalidade suscitada, fundamentando seu acolhimento ou sua rejeição. 2. Não conhecimento de incidente de inconstitucionalidade de lei se a turma julgadora simplesmente determina sua instauração sem pronunciamento positivo ou negativo da inconstitucionalidade. 3. Em razão da aposentadoria, o servidor público tem direito à conversão em pecúnia de licença-prêmio não usufruída por necessidade do serviço. 4. Sua base de cálculo é valor da remuneração mensal descontado o limite remuneratório. 4. Inexistência de ofensa ao art. 115, XII e § 7º, da CE/89. 5. Improcedência da arguição.

 

 

 

 

 

Colendo Órgão Especial:

 

 

1.                Trata-se de incidente de inconstitucionalidade suscitado pela colenda 13ª Câmara de Direito Público no julgamento da Apelação nº 001688-40.2011.8.26.0053, da respeitável sentença que julgou procedente o pedido para conversão em pecúnia de licença-prêmio a servidor público inativo sem incidência do limite remuneratório, por alegação de incompatibilidade do § 2º do art. 43 da Lei Complementar Estadual n. 1.059/08, na redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 1.122/10, com o § 7º do art. 115 da Constituição Estadual (fls. 111/118).

2.                O venerando acórdão está assim ementado:

“Servidores Públicos Estaduais – Pagamento da indenização referente à licença-prêmio sem o redutor salarial – Inteligência do art. 43, §§ 1º e 2º da LC nº 1.059/08 – Indenização a ser paga em valor equivalente ao que teria sido recebido pelos meses trabalhados a mais, atingidos, mês a mês e não no total, pelo teto remuneratório – Incidente de inconstitucionalidade examinado pelo C. Órgão Especial – Nova redação do § 2º do artigo 1º da Lei Complementar Estadual nº 1.059/08 – Aparente incompatibilidade – Necessidade de novo incidente, que se suscita” (fl. 218).

3.                É o relatório.

4.                Segundo o venerando acórdão, “os autores apontam incompatibilidade entre a nova redação do § 2º e o disposto no § 1º, e arguem violação ao art. 115, § 7º, da Constituição Estadual” (fl. 114).

5.                A eminente Desembargadora Relatora ressaltando interpretação pessoal no sentido de que "não ocorreu a apontada inépcia legislativa e que leitura cuidadosa revela a compatibilidade dos dispositivos” (fl. 114) e lembrando decisão do colendo Órgão Especial que rejeitara inconstitucionalidade na primitiva fórmula normativa da Lei Complementar Estadual n. 1.059/08 (fls. 117/118), assim expõe:

“Então, ‘a contrario senso’, teria o § 2º, na nova redação, ao determinar a aplicação do teto, e dizer expressamente que sua aplicação reflete e permite a indenização pelo valor que o servidor recebia e receberia se tivesse gozado licença prêmio no último mês de trabalho, resulta em inconstitucionalidade por ofensa aos direitos constitucionalmente assegurados referidos no v. acórdão do C. Órgão Especial, ou, ao contrário, essa norma dá efetividade ao teto constitucional, indeniza pelo valor que o servidor teria recebido caso houvesse gozado o período de licença prêmio quando em atividade, e retira a dúvida na interpretação do dispositivo? Essa questão deve ser examinada pelo C. Órgão Especial, salvo melhor juízo, à luz da alteração legislativa, por envolver declaração de (in)constitucionalidade de norma estadual e, ainda, refletir em cumprimento adequado a v. acórdão proferido em incidente recentemente julgado pela C. Corte.” (fls. 117/118).

6.                Friso, preliminarmente, que o incidente de inconstitucionalidade não se consubstancia em consulta do órgão julgador fracionário ao tribunal pleno nem tem outra finalidade senão a declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum em julgamento per saltum.

7.                Com a devida vênia, a colenda turma não se pronunciou sobre a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do preceito legal impugnado.

8.                Sua admissibilidade atende aos contornos legais e regimentais e, mormente, o art. 97 da Constituição Federal e o teor da Súmula Vinculante 10 do Supremo Tribunal Federal, impositivos da observância da cláusula de reserva de plenário quando a inconstitucionalidade de lei surja para o julgador em segundo grau de jurisdição como essencial para o julgamento da causa, ainda que assim não tenham postulado as partes no processo.

9.                O incidente somente seria inadmissível se o tribunal tivesse declarado no juízo abstrato, concentrado, direto e objetivo a inconstitucionalidade, com efeito erga omnes, da lei municipal questionada no controle difuso de constitucionalidade, como consta do parágrafo único do art. 481 do Código de Processo Civil ao determinar que “os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a arguição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão”. Neste sentido:

“3. ‘O princípio da reserva de plenário de que tratam os arts. 480 a 482 do CPC e 97 da CF/88 (...) é excetuado quando o Plenário ou Órgão Especial do Tribunal de origem ou o Supremo Tribunal Federal tenham declarado a inconstitucionalidade da norma impugnada’ (REsp 727.208/RR, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, Segunda Turma, DJe 16/4/09).” (STJ, AgR-AREsp 34.942-PE, 1ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima, 22-05-2012, v.u., DJe 28-05-2012).

10.              Consoante entendimento pacificado neste colendo Órgão Especial, o incidente de inconstitucionalidade não pode ser conhecido se o órgão judiciário suscitante não examina a questão da inconstitucionalidade, como ocorrido in casu em que o douto órgão fracionário determinou sua remessa ao colendo Órgão Especial abstendo-se de qualquer pronunciamento sobre a constitucionalidade ou não das normas mencionadas.

11.              A título de exemplo assim já decidiu este colendo Órgão Especial em venerando acórdão da lavra do eminente Desembargador Mário Devienne Ferraz, cujos valiosos fundamentos, no que interessa, são transcritos e incorporados expressamente:

“Ocorre que a instauração do incidente de inconstitucionalidade, regulado nos artigos 480 a 482 do Código de Processo Civil, exige que o órgão fracionário enfrente a alegação e decida se a acolhe ou a rejeita. Se a rejeitar, declarará as razões pelas quais concluiu nesse sentido e prosseguirá no julgamento de mérito. Na hipótese contrária, se acolher a arguição, deverá lavrar acórdão nesse sentido e suspenderá o julgamento, determinando a remessa dos autos ao Órgão Especial para decisão quanto à declaração incidental de inconstitucionalidade, nos moldes do que dispõe o artigo 97 da Constituição Federal e a Súmula Vinculante nº 10, do colendo Supremo Tribunal Federal. Se o Órgão Especial concluir pela constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei ou ato normativo, os autos de qualquer forma retornarão ao órgão fracionário, que prosseguirá no julgamento do mérito, ficando vinculado, entretanto, ao que for decidido pelo Órgão Especial.

(...)

Como visto, a leitura do acórdão revela que a questão relativa ao acolhimento ou não da inconstitucionalidade da norma atacada não foi submetida à turma julgadora, que sobre isso não se pronunciou” (Incidente de Inconstitucionalidade de Lei n. 172.877-0/2-00, Miguelópolis, Órgão Especial, v.u., 18-02-2009.

12.   Compete ao órgão fracionário, em qualquer hipótese, se pronunciar sobre a inconstitucionalidade suscitada, fundamentando seu acolhimento ou sua rejeição.

13.              O colendo Órgão Especial não tem conhecido de incidente de inconstitucionalidade de lei se a douta Turma Julgadora simplesmente determina sua instauração sem pronunciamento positivo ou negativo da inconstitucionalidade.

14.              Ora, nos termos em que suscitado o incidente, ele não merece conhecimento.

15.              Se superada a preliminar, a Lei Complementar Estadual n. 1.059/08 em sua redação original assim dispunha:

“Artigo 43 - Os períodos de licenças-prêmio não usufruídas, a que fazem jus os Agentes Fiscais de Rendas em atividade, poderão ser convertidos em pecúnia no momento da aposentadoria ou do falecimento, mediante requerimento.

§ 1° - O valor pago nos termos do ‘caput’ deste artigo tem caráter indenizatório, não devendo ser considerado para fins de determinação do limite a que se refere o inciso XII do artigo 115 da Constituição Estadual.

§ 2° - O valor da indenização de que trata este artigo será calculado com base na remuneração do Agente Fiscal de Rendas, referente ao mês anterior ao do evento a que se refere o ‘caput’ deste artigo, e o pagamento será efetuado no prazo de 3 (três) meses subsequentes ao mês do requerimento”.

16.              Apreciando esse dispositivo, este colendo Órgão Especial decidiu:

“Arguição de inconstitucionalidade. 13° Câmara de Direito Público. Art. 43, §§ 1° e 2°, da Lei Complementar Estadual n° 1.059/08. Inconstitucionalidade em face da precedente EC n° 41/03. Natureza indenizatória do pagamento ao servidor aposentado relativamente aos períodos de licenças-prêmio não usufruídas no serviço ativo. Não incidência do teto ou subteto remuneratório, que não alcança as indenizações. Arguição improcedente” (II 0043808-75.2011.8.26.0000, Rel. Des. Luiz Pantaleão, v.u., 29-02-2012).

17.              Da fundamentação desse aresto colhe-se:

“Consequentemente, o disposto no § 1º, do art. 43, da LCE n° 1.059/08, apenas reflete dispositivos constitucionais induvidosos.

Também o § 2º, do mesmo dispositivo, ao prever o cálculo da indenização com base na remuneração do agente fiscal de rendas, não afrontou o teto constitucional, eis que a verba indenizatória é diversa e autônoma daquela correspondente aos vencimentos do servidor”.

18.              A Lei Complementar Estadual n. 1.122/10 alterou no art. 32, VI, b, a redação o § 2º do art. 43 da Lei Complementar Estadual n. 1.059/08, que passou a ter a seguinte redação:

“O valor da indenização de que trata este artigo será calculado com base na remuneração efetivamente percebida pelo Agente Fiscal de Rendas, referente ao mês anterior ao do evento a que se refere o ‘caput’ deste artigo, considerando-se, para sua determinação, o limite a que se refere o inciso XII do artigo 115 da Constituição Estadual, e o pagamento será efetuado no prazo de 6 (seis) meses subsequentes ao mês da aposentadoria, e em separado do demonstrativo dos proventos”.

19.              É ou não constitucional esse preceito?

20.              Ele determina que o valor da indenização será o da remuneração do servidor público “considerando-se, para sua determinação, o limite a que se refere o inciso XII do artigo 115 da Constituição Estadual”.

21.              Deveras, o valor a ser pago será o equivalente à remuneração mensal do servidor público estadual em quantia que não exceda ao teto (limite remuneratório), e não que a conversão em pecúnia seja inferior a esse limite.

22.              Em outras palavras, a base de cálculo é a remuneração mensal descontado o limite remuneratório, pois, não é lícito, segundo a lei, ao servidor público receber a conversão em pecúnia tomando como base a remuneração desprezando o teto remuneratório.

23.              Indiscutível que a conversão em pecúnia de licença-prêmio não gozada por necessidade de serviço, em favor do inativo, tem natureza indenizatória.

24.              Porém, se incidia à remuneração mensal do servidor público durante a atividade o limite remuneratório, a conversão em pecúnia não poderá sopesar valor excedente ao teto, conforme reza o § 2º do art. 43 da lei estadual, o que não significa que a indenização não possa superá-lo, como estabelece o § 1º do art. 43 da lei estadual.

25.              Por força do limite remuneratório o servidor público em atividade perde o direito a receber aquilo que o ultrapassa.

26.              É certo que o limite remuneratório só alcança verbas de natureza remuneratória, e não as de natureza indenizatória, mas, isto está delineado no § 1º do art. 43 da Lei Complementar Estadual n. 1.059, de 2008, sendo algo bem diverso o que se encontra disposto no § 2º de referido preceito.

27.              O § 2º do art. 43 da lei complementar estadual não desafia a Constituição Estadual no art. 115, XII, e § 7º.

28.              Opino pelo não conhecimento do incidente e, se superada essa preliminar, por sua improcedência.

         São Paulo, 27 de novembro de 2013.

 

 

 

        Sérgio Turra Sobrane

        Subprocurador-Geral de Justiça

        Jurídico

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