Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 109.391/15

Inquérito Policial n.º 0004650-46.2015.8.26.0073 – MM. Juízo da 2.ª Vara Criminal da Comarca de Avaré

Indiciado: (...)

Assunto: revisão de proposta de arquivamento de inquérito policial

 

EMENTA: CPP, ART. 28. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO SUPRIMIDA (ART. 16, PAR. ÚN., IV). ARMA INOPERANTE. DELITO DE PERIGO ABSTRATO. TIPICIDADE FORMAL E MATERIAL. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.

1.      O crime do art. 16 da Lei n.º 10.826/03 constitui delito doloso e, como tal, contenta-se com a vontade e a consciência de concretizar os elementos típicos objetivos. A norma penal não requer nenhuma finalidade especial a dominar a conduta do agente.

2.      De outra parte, o só fato de se apreender com o indiciado o instrumento bélico, ainda que desmuniciado, desmontado ou inoperante, justifica o oferecimento da denúncia. Confira-se recente julgado do Colendo Supremo Tribunal Federal nesse sentido: “(...) Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/03). Arma desmontada e desmuniciada. Crime de perigo abstrato. Tipicidade da conduta configurada. Precedentes. (...) 1. O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é de perigo abstrato o crime de porte ilegal de arma de fogo, sendo, portanto, irrelevante para sua configuração encontrar-se a arma desmontada ou desmuniciada. (...)” (STF, HC n.º 95.861, Relator  Min. CEZAR PELUSO, Relator p/ Acórdão  Min. DIAS TOFFOLI, 2.ª Turma, julgado em 02/06/2015).

3.      A natureza dos delitos capitulados no Estatuto do Desarmamento, inseridos na categoria de crimes de perigo abstrato, torna irrelevante o exame da potencialidade lesiva do armamento apreendido: “(...) Segundo o entendimento deste Eg. Superior Tribunal de Justiça, o crime previsto no art. 12 da Lei n. 10.826/2003 é de perigo abstrato, sendo suficiente, portanto, a prática dos núcleos do tipo "possuir" ou "manter sob guarda", sem autorização legal, arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido, para a caracterização da infração penal, pois tais condutas colocam em risco a incolumidade pública, independentemente da aferição da potencialidade lesiva dos objetos em questão. Incidência da Súmula 83/STJ” (STJ, AgRg nos EDcl no AREsp 445.204/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, 5.ª TURMA, julgado em 30/06/2015, DJe de 03/08/2015).

 

Solução: designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia, prosseguindo no feito em seus ulteriores termos.

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado a partir da lavratura de auto de prisão em flagrante, com o fim de apurar suposto crime de porte ilegal de arma de fogo de uso proibido (art. 16 da Lei n. 10.826/03), cometido, em tese, por (...).

O autor, segundo se apurou, foi surpreendido por policiais militares (fls. 03 e 05), depois de exibir em via pública, a populares, arma de fogo, de calibre 32, com numeração suprimida (fls. 12).

Concluídas as providências de polícia judiciária, entendeu por bem a Douta Promotora de Justiça requerer o arquivamento do inquérito policial, sustentando a atipicidade da conduta, uma vez que a arma, segundo a perícia levada a efeito (fls. 26/27), revelara-se inoperante e sem condições de funcionamento (fls. 34/36).

A MM. Juíza, todavia, discordando de tal posicionamento, determinou a remessa do feito a esta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 41/43).

Eis a síntese do necessário.

Com a devida vênia da Nobre Representante Ministerial, cremos que não lhe assiste razão; senão, vejamos.

Deve-se frisar que o crime do art. 16 da Lei n.º 10.826/03 constitui delito doloso e, como tal, contenta-se com a vontade e a consciência de concretizar os elementos típicos objetivos. A norma penal não requer nenhuma finalidade especial a dominar a conduta do agente.

De outra parte, o só fato de se apreender com o indiciado o instrumento bélico (ainda que desmunciado) justifica o oferecimento da denúncia. Confira-se, nesse sentido, o seguinte julgado do Colendo Supremo Tribunal Federal:

 

 

“’HABEAS CORPUS’. CONSTITUCIONAL. PENAL. ARTIGO 14 DA LEI 10.823/03. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO. ARMA DESMUNICIADA. TIPICIDADE DA CONDUTA. PRECEDENTES. ORDEM DENEGADA.

1. O crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido é de mera conduta e de perigo abstrato, consumando-se independentemente da ocorrência de efetivo prejuízo para a sociedade, sendo que a probabilidade de vir a ocorrer algum dano é presumida pelo tipo penal. Precedente.

2. O objeto jurídico tutelado pelo delito previsto no art. 14 da Lei 10.826/03 não é a incolumidade física, porque o tipo tem uma matiz supraindividual, voltado à proteção da segurança pública e da paz social. Precedente.

3. É irrelevante para a tipificação do art. 14 da Lei 10.826/03 o fato de estar a arma de fogo municiada, bastando a comprovação de que esteja em condições de funcionamento. Precedente.

4. Ordem denegada.”

(STF, HC n. 107.447/SP, rel. CÁRMEN LÚCIA, DJe de 06/06/2011).

 

 

É de se ponderar que a arma inoperante equivale à desprovida de munição.

De outra parte, é relevante frisar que se cuida o fato de delito de perigo abstrato, conforme jurisprudência consolidada do Pretório Excelso:

Habeas corpus. Penal. Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (art. 14 da Lei nº 10.826/03). Arma desmontada e desmuniciada. Crime de perigo abstrato. Tipicidade da conduta configurada. Precedentes. Ordem denegada. Prescrição da pretensão punitiva efetivada. Habeas corpus concedido de ofício para julgar extinta a punibilidade do paciente. 1. O Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é de perigo abstrato o crime de porte ilegal de arma de fogo, sendo, portanto, irrelevante para sua configuração encontrar-se a arma desmontada ou desmuniciada. 2. Entretanto, o caso é de concessão da ordem de ofício, em razão da efetivação da prescrição. 3. A pena máxima, abstratamente cominada para o delito imputado ao paciente (art. 14 da Lei nº 10.826/03), é de 4 (quatro) anos, razão pela qual seu prazo prescricional é de 8 (oito) anos (CP, art. 109, inciso V). Nessa conformidade, considerando que o último marco interruptivo se deu com o recebimento da denúncia (CP, art. 117, inciso I), em 18/6/04, é de se concluir que a prescrição foi alcançada aos 17/6/12. 4. Habeas corpus denegado. Ordem concedida de ofício para julgar extinta a punibilidade do paciente em virtude da consumação da prescrição da pretensão punitiva estatal, com fundamento no art. 107, IV, do Código Penal”.
(STF, HC 95.861, Relator  Min. CEZAR PELUSO, Relator p/ Acórdão  Min. DIAS TOFFOLI, 2.ª Turma, julgado em 02/06/2015).

 

A natureza dos delitos capitulados no Estatuto do Desarmamento, inseridos na categoria de crimes de perigo abstrato, torna irrelevante o exame da potencialidade lesiva do armamento apreendido; confira-se:

 

“(...) Segundo o entendimento deste Eg. Superior Tribunal de Justiça, o crime previsto no art. 12 da Lei n. 10.826/2003 é de perigo abstrato, sendo suficiente, portanto, a prática dos núcleos do tipo "possuir" ou "manter sob guarda", sem autorização legal, arma de fogo, acessório ou munição de uso permitido, para a caracterização da infração penal, pois tais condutas colocam em risco a incolumidade pública, independentemente da aferição da potencialidade lesiva dos objetos em questão. Incidência da Súmula 83/STJ” (STJ, AgRg nos EDcl no AREsp 445.204/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, 5.ª TURMA, julgado em 30/06/2015, DJe de 03/08/2015).

 

Diante do exposto, designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia, prosseguindo no feito em seus ulteriores termos.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n.º 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n.º 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 04 de agosto de 2015.

 

 

                        Márcio Fernando Elias Rosa

                        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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