Código de Processo Penal, art. 28

 

 

Protocolado n.º 109.990/09

Processo n.º 050.08.076134-8 – MM. Juízo do DIPO 4 (Comarca da Capital)

Indiciada: (...)

Assunto: revisão de pedido de arquivamento de inquérito policial

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. CRIME DE FALSO TESTEMUNHO (CP, ART. 342). INVERACIDADE DAS DECLARAÇÕES RECONHECIDA NA DECISÃO CONDENATÓRIA, QUANDO SE ANALISOU TODO O CONJUNTO PROBATÓRIO. MENTIRA DETECTADA PELO JULGADOR E CONFESSADA EM POSTERIOR INVESTIGAÇÃO. DENÚNCIA.

1.      O falso testemunho (CP, art. 342) é crime formal, cuja consumação dá-se quando o sujeito fizer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha, em depoimento prestado em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral.

2.      Não é necessário que as declarações induzam o julgador a erro, sendo suficiente que se mostrem potencialmente lesivas, isto é, capazes de influenciar fraudulentamente no resultado da lide. Não se deve confundir potencialidade lesiva com efetiva lesão, algo que o tipo penal não exige. Conforme já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça: “Para a configuração do delito de falso testemunho basta a verificação do efetivo potencial lesivo da conduta, não sendo necessária a demonstração do prejuízo” (STJ, HC n. 14.717, rel. Ministro EDSON VIDIGAL, DJ de 09/04/2001, p. 373).

3.      Na hipótese dos autos, o MM. Juiz prolator da sentença expressamente reconheceu o falsum cometido pela testemunha de defesa, em processo-crime por tráfico de drogas, tendo a autora do delito, quando ouvida no inquérito policial subsequentemente instaurado, confessado que faltou com a verdade para atender a pedido da genitora do réu.

Solução: designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar crime de falso testemunho (CP, art. 342) praticado, em tese, por (...), em depoimento prestado no processo n. 187/08, perante o MM. Juízo da 29.ª Vara Criminal da Capital, que apurava delito de tráfico de entorpecentes, perpetrado por (...).

A Douta Promotora de Justiça requereu o arquivamento do feito, aduzindo, em síntese, que as declarações em tela não influíram na decisão monocrática (fls. 92/93).

A MM. Juíza, entretanto, houve por bem remeter os autos a este Órgão, com fundamento no art. 28 do CPP (fls. 96/97).

É o relatório.

Com a devida vênia da i. Representante Ministerial, assiste razão à d. Magistrada.

As declarações prestadas pela indiciada na ação penal acima citada mostraram-se claramente falsas.

Muito embora o competente julgador tenha detectado a mentira e proferido a sentença em correspondência com a verdade dos fatos, o crime restou devidamente caracterizado. Ressalte-se que o d. julgador fez constar da decisão que:

 

“...vale o esclarecimento que a menção efetuada pela testemunha (...) acerca do terceiro ser (...) pode ser fruto de equívoco, mas com exceção a tal detalhe, todo o restante é fruto de conduta voltada a favorecer o réu, nitidamente ultrapassando os limites da verdade para se envolver em delito de falso ...” (fls. 30).

 

A seu final, inclusive, pediu a extração de cópias para instauração do presente inquérito policial.

De qualquer modo, a averiguada confessou a prática do ilícito, consoante se pode verificar a fls. 83:

 

“... a respeito dos fatos eu desejo me retratar e falar e verdade porque no dia que eu fui ouvida no Fórum de São Paulo, eu menti ...”.

 

Como bem ponderou a MM. Juíza oficiante no DIPO, o falso testemunho é crime formal e, portanto, consuma-se no momento em que se fizer a afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade em processo judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral.

Nesse sentido, há orientação do Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

“PROCESSUAL PENAL. FALSO TESTEMUNHO. POTENCIAL LESIVO. PARTICIPAÇÃO. ADVOGADO. POSSIBILIDADE.

1. Para a configuração do delito de falso testemunho basta a verificação do efetivo potencial lesivo da conduta, não sendo necessária a demonstração do prejuízo.

2. Ante o cometimento do falso testemunho, a instigação ou induzimento que ensejou a prática do crime passa a ser penalmente relevante, como participação. Precedentes.

                                3.  Habeas Corpus conhecido, pedido indeferido”.

(STJ, HC n. 14.717, rel. Ministro EDSON VIDIGAL, DJ de 09/04/2001, p. 373).

 

“PENAL. HABEAS-CORPUS. FALSO TESTEMUNHO. CRIME FORMAL, DE SIMPLES ATIVIDADE, QUE INDEPENDE DO RESULTADO. RECURSO ORDINARIO IMPROVIDO”.

(STJ, RHC n. 4.343, rel. Ministro LUIZ VICENTE CERNICCHIARO, DJ de 03/03/1997, p. 4.707).

 

Acrescente-se que o crimen do art. 342 do CP não exige qualquer finalidade especial a que se dirija o comportamento. Em outras palavras, trata-se de crime doloso, para o qual basta a voluntariedade do ato e a consciência por parte do agente da inveracidade das alegações.

In casu, o depoimento da indiciada é notadamente falso.

A mendacidade, assim, é patente, motivo por que se mostra evidente sua potencialidade lesiva. Note que “potencialidade lesiva” não se confunde com “efetiva lesão”. O testemunho da investigada não provocou dano (porquanto não foi suficiente a enganar o juízo), mas possuía inequívoco potencial de fazê-lo.

Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal. Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 8 de setembro de 2009.

 

 

Pedro Franco de Campos

        Procurador-Geral de Justiça em Exercício

 

 

 

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