Código de Processo Penal, art. 28
Protocolado n.º
117.566/11
Autos n.º
310/10 – MM. Juízo da 2.ª Vara Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de
Socorro
Investigados: (...)
e (...)
Assunto: revisão
de pedido de arquivamento de inquérito policial
EMENTA: CPP, ART. 28. ARQUIVAMENTO
DE INQUÉRITO POLICIAL FUNDADO
1. O arquivamento de inquérito policial somente pode se lastrear em excludente de ilicitude (real ou putativa) quando referida causa encontre-se cabalmente demonstrada. Na hipótese vertente, onde se cogita de possível estrito cumprimento de dever legal (CP, art. 23, III), tal não se pode afirmar.
2. É preciso sublinhar que a versão dos milicianos não se mostrou totalmente compatível com a prova produzida durante a fase inquisitiva, a ponto de se excluir, com segurança, a ocorrência de um comportamento típico e antijurídico. Acrescente-se, ainda, que as testemunhas arroladas confirmaram que o ofendido portava-se calmamente e, de modo voluntário, se dispôs a sair do local, de forma que a revista pessoal, a colocação de algemas e a condução à Delegacia de Polícia mostraram-se abusivas. Essa conclusão se reforça pelo fato de que um dos policiais é atual companheiro da ex-mulher da vítima.
3. Cumpre salientar, por derradeiro, que não se trata de fazer um juízo definitivo de censura, mas apenas de se constatar a existência de um mínimo de embasamento para a deflagração do devido processo legal.
Solução: designação de outro promotor de justiça para prosseguir no feito em seus ulteriores termos, verificando o cabimento da transação penal.
Cuida-se de inquérito policial instaurado para apuração do crime de abuso de autoridade, cometido, em tese, pelos milicianos (...) e (...).
O Ilustre Promotor de Justiça oficiante pugnou pelo arquivamento dos autos, fundamentando seu pleito na licitude do proceder dos investigados, os quais teriam se limitado ao emprego de força física moderada para conter o sedizente ofendido (fls. 112/123).
O MM. Juiz, entretanto, discordando de tal posicionamento, remeteu o expediente a esta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 125/126).
Eis a síntese do necessário.
Com
a devida vênia do entendimento esposado pelo Douto Representante Ministerial, assiste
razão ao MM. Julgador.
Deve-se
anotar que os fatos se passaram no dia
Ocorre,
porém, que ela, ao vê-lo, acionou seu atual companheiro, o policial militar (...),
que se deslocou ao estabelecimento de ensino na viatura, juntamente com seu
colega de farda (...).
Os
milicianos, então, abordaram a vítima e a submeteram, desnecessariamente, a uma
revista pessoal, defronte à escola, submetendo-o, desta forma, a desnecessário
constrangimento.
Em
seguida, o algemaram, de maneira francamente ilícita, em patente afronta aos
preceitos contidos na Súmula Vinculante n. 11 do STF; in verbis:
“Só é lícito o uso de
algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à
integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros,
justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade
disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou
do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do
Estado".
Os
servidores, por fim, o conduziram ao Distrito Policial, alegando ter ele
cometido os crimes de desobediência e resistência. A d. autoridade de plantão,
porém, de pronto notou que tais fatos inexistiram e se limitou a lavrar um
boletim de ocorrência e, em seguida, instaurou-se o presente inquérito
policial.
Deve-se
frisar que diversas testemunhas foram ouvidas e, de maneira uníssona, revelaram
que (...), tão logo notou que a ex-esposa estava na escola, manifestou
publicamente que não participaria da reunião em virtude da proibição judicial
de dela se aproximar (fls. 35, 37, 38 e 87).
Ficou
claro, portanto, que o sujeito passivo não cometeu desobediência ou
resistência.
O
vínculo amoroso entre o policial militar (...) e (...), ademais, somente
corrobora com a conclusão de que aquele, em vez de cumprir sua função, atuou
para atender a interesse particular, e, com esse propósito, cometeu, juntamente
com (...), abuso de autoridade em face de (...).
Ressalte-se,
ainda, que a anotação na agenda da infante, em que o ofendido registrou seu
inconformismo com a negativa de participação na reunião escolar, não altera o
quadro. Trata-se de uma legítima postura do genitor, que não pretendia descumprir
a determinação judicial, mas apenas participar das atividades letivas de sua
filha. Tanto assim que, percebendo a presença de (...), dispôs-se
voluntariamente a deixar o recinto.
Os
elementos acima apontados são suficientes para se concluir, com a devida vênia
do Promotor de Justiça oficiante, pela viabilidade do prosseguimento da
persecução penal.
Cumpre salientar, por derradeiro, que não se trata de fazer um juízo definitivo de censura, mas apenas de se constatar a existência de um mínimo de embasamento para a deflagração do devido processo legal. Não é outro, aliás, o entendimento de nossos tribunais:
“não se exige,
na primeira fase da persecutio criminis,
que a autoria e a materialidade da prática de um delito sejam definitivamente
provadas, uma vez que a verificação de justa causa para a ação penal pauta-se
em juízo de probabilidade, e não de certeza” (STJ, HC n. 100.296, rel. Min.
ARNALDO ESTEVES LIMA, 5.ª TURMA, DJe
de
Diante disso, designo outro representante ministerial para prosseguir no feito em seus ulteriores termos, verificando, segundo sua independência funcional, a presença dos requisitos para a propositura da transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/95).
Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.
Expeça-se portaria designando o substituto automático. Publique-se a ementa.
São Paulo, 31 de agosto de 2011.
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
/aeal