Código de Processo Penal, art. 28

 

 

Protocolado n.º 12.015/10

Autos n.º 593/09 – MM. Juízo da 2.ª Vara Judicial do Foro Distrital de Brás Cubas

Investigado: (...)

Assunto: revisão de proposta de arquivamento

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. CRIME DE AMEAÇA (CP, ART. 147). GRAVIDADE OBJETIVA DO MAL PROMETIDO E SERIEDADE EM SUA INFUSÃO. ANÁLISE DE ELEMENTOS PARA O OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA. PALAVRA DA VÍTIMA. SUFICIÊNCIA PARA SE DEFLAGRAR A AÇÃO PENAL.

1.     O crime de ameaça exige, para sua configuração, seja o mal prometido injustamente pelo sujeito ativo sério e objetivamente capaz de difundir temor na vítima. É o que ocorre em se tratando de ameaças de morte.

2.     A seriedade no modo de agir, in casu, reside na maneira como o agente se porta, chegando, inclusive, em certas ocasiões, a brandir o facão em direção às vítimas. Não que se falar, portanto, em mera bazófia. Eventual relação de parentesco ou disputa patrimonial entre os envolvidos não elide a caracterização do ilícito penal ou reduz, ao menos na fase inquisitiva, a força probante de suas declarações.

3.     O delineamento do delito em análise, ademais, independe de se comprovar, por parte do investigado, sua disposição de cumprir o mal verberado. Basta que o ato infunda temor verossímil perante os sujeitos passivos, como de fato ocorreu.

4.     Cuidando-se de comportamento relacionado com violência (psicológica) doméstica ou familiar contra a mulher, fica afastada a possibilidade de transação penal, ex vi do art. 41 da Lei n. 11.340/06.

Solução: designação de outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar a prática, em tese, do crime de ameaça (CP, art. 147), que teria sido perpetrado por (...).

A Ilustre Promotora de Justiça oficiante pugnou pelo arquivamento dos autos, entendendo que a autoria e a materialidade do ilícito não restaram suficientemente comprovadas, aduzindo que, mesmo se indícios houvesse, os elementos de informação não permitiriam formar convicção segura quanto à ocorrência de ameaça séria, já que o agente não ostenta antecedentes (fls.  26/28).

O MM. Juiz, discordando de tal posicionamento, remeteu o feito a esta Procuradoria Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 29).

É o relatório.

Com a devida vênia do entendimento esposado pela d. Representante Ministerial, assiste razão ao d. Magistrado.

Narra o presente que o investigado reside no mesmo terreno que sua sobrinha (...) e sua irmã (...), porém em imóveis distintos.

Ocorre que ambas desejam desmembrar o lote, e o indiciado, não concordando com tal divisão, teria passado a ameaçá-las.

No dia 16 de setembro de 2009, por volta de 06 horas, (...) se dirigiu à Delegacia de Polícia, uma vez que no dia anterior (...) dissera que iria matar a todos porque teriam sumido suas ferramentas, brandindo um facão, que já comumente levava consigo.

As declarações de (...), (...) e (...) (pai da primeira e esposo da segunda) encontram-se a fls. 06, 10 e 19/20.

Valdemar foi ouvido a fls. 12, negando a prática delituosa.

Pois bem.

O quadro probatório acima sintetizado, data maxima venia, recomenda que a ação penal seja proposta.

O crime de ameaça restou configurado. A gravidade do mal prometido se traduz em seu conteúdo – ameaça de morte. A seriedade reside na maneira como o agente se porta, chegando, inclusive, em certas ocasiões, a brandir o facão em direção às vítimas.

Deve-se frisar que o delineamento do delito em análise independe de se comprovar, por parte do investigado, sua disposição de cumprir o mal verberado. Basta que o ato infunda temor verossímil perante os sujeitos passivos, como de fato ocorreu.

De outro lado, não se pode olvidar que, segundo nossos tribunais:

 

“A palavra da vítima representa viga mestra da estrutura probatória e a sua acusação firme e segura, em consonância com as demais provas, autoriza a condenação.” (TJDF, Ap. 10.389, DJU 15.5.90, p. 9859, Ap. 13.087, DJU 22.9.93, pp. 39109-20, in RBCCr 4/176, TJMG 128/367).

 

Frise- se, por derradeiro, que, para o oferecimento da denúncia, a lei não exige provas rigorosas, como aquelas que são necessárias para uma condenação. Como lembra PAGANELLA BOSCHI,

 

“para o desencadeamento da persecução, basta que as provas sejam capazes de despertar um juízo de suspeito, o suficiente para mostrar que a acusação não é um fruto de criação cerebrina ou mero capricho da acusação” (Ação Penal, Rio de Janeiro, Editora AIDE, 1997, 2.ª ed., p. 94).

 

Em face do exposto, reconhece esta Procuradoria-Geral de Justiça que há elementos para se propor a ação em face do investigado, alertando que se cuida de comportamento relacionado com violência (psicológica) doméstica ou familiar contra a mulher, fica afastada a possibilidade de transação penal, ex vi do art. 41 da Lei n. 11.340/06.

Diante disso, designo outro promotor de justiça para oferecer a peça inaugural, bem como para prosseguir no feito em seus ulteriores termos.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria.

 

São Paulo, 27 de janeiro de 2010.

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

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