Protocolado n.º 125.084/08 – CPP, art. 28

Inquérito policial n.º 176/08 – MM. Juízo da Vara Judicial de Vila Mimosa (Comarca de Campinas)

Investigado: (...)

 

EMENTA: CPP, ART. 28. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. “LEI SECA”. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA, AINDA QUE INEXISTA CONDUÇÃO ANORMAL.

1. A recente modificação produzida no Código de Trânsito pela Lei n. 11.705/08, transformou o crime de embriaguez ao volante (CTB, art. 306) em delito de perigo abstrato.

2. Por esse motivo, prescinde-se a verificação, no momento da abordagem policial, se havia condução anormal por parte do motorista do veículo automotor. Até porque, se esta não se verificou no momento em questão, poderia ocorrer em outro instante, dado que o álcool reduz os reflexos e a percepção do motorista.

Solução: designação de outro promotor de justiça para oferecer denúncia.

 

 

                                      Os presentes autos foram instaurados porque, em 09 de agosto de 2008, por volta da meia-noite, na Av. Ruy Rodrigues, Jd. São Francisco, em Vila Mimosa, Comarca de Campinas, o investigado fora flagrado, em tese, praticando crime de embriaguez ao volante (CTB, art. 306).

 

                                      O Douto Promotor de Justiça, em judiciosa manifestação, requereu o arquivamento dos autos, sustentando a atipicidade da conduta, por entender que o delito é de perigo concreto e que não houve prova de condução anormal por parte do  motorista (fls. 29/31).

 

                            A MM. Juíza, discordando da manifestação, houve por bem remeter os autos a esta Procuradoria-Geral de Justiça, na forma do art. 28 do CPP (fls. 33/34).

 

                                      É o relatório.

 

                                      Pelo apurado, no dia dos fatos, policiais militares, durante bloqueio, abordaram o increpado conduzindo veículo automotor e o submeteram ao teste do bafômetro, constatando a quantidade de 0,6 mg/l por amostragem de ar expelido pelos pulmões (fls. 15). O agente por sua vez, alegou ter ingerido uma dose de “whiskie” e outra de cerveja na casa de amigos (fls. 06).

 

                                      O comportamento atribuído ao agente se subsume ao disposto no art. 306 da Lei n. 9.503/97, com as alterações decorrentes da Lei n. 11.705/08.

 

                                      O tipo penal infringindo, antes da modificação, exigia expressamente que o agente conduzisse “sob influência” de álcool ou substância análoga. Cuidava-se, portanto, de crime de perigo concreto. Com a modificação recentemente introduzida, o legislador retirou a exigência mencionada, transformando-o em crime de perigo abstrato.

 

                                      Nada há de inconstitucional na construção típica em apreço, em que pese as opiniões contrárias de renomados juristas.

 

                                      É preciso ponderar, na esteira dos ensinamentos de Fernando Capez, que são válidos e constitucionais os delitos de perigo presumido. Com efeito, pondera o autor que: “...subsiste a possibilidade de tipificação dos crimes de perigo abstrato em nosso ordenamento legal, como legítima estratégia de defesa do bem jurídico contra agressões em seu estágio ainda embrionário, reprimindo-se a conduta, antes que ela venha a produzir um perigo concreto ou um dano efetivo. Trata-se de cautela reveladora de zelo do Estado em proteger adequadamente certos interesses. Eventuais excessos podem, no entanto, ser corrigidos pela aplicação do princípio da proporcionalidade” (Curso de direito penal, vol. 1, 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p. 25).

 

                                      Em face do contexto acima analisado, não há como se concordar com as bem expostas razões que embasaram o pedido de arquivamento.

 

                                      É de se destacar que a dosagem alcóolica comprovadamente verificada apresentava-se acima do limite permitido.

 

                                      Não se ignora que a conduta de conduzir veículo automotor sob efeito de álcool ou substância psicoativa produz inegável risco à saúde, integridade física, patrimônio e à vida de terceiros.

 

                                      É bem possível que, no momento que antecedeu a abordagem, os policiais não tenham notado a  condução anormal. Ocorre que, com a dosagem verificada no organismo do indiciado, é certo que seus reflexos como motorista não se encontravam em normais condições.

 

                                      Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 14 de outubro de 2008.

 

FERNANDO GRELLA VIEIRA

Procurador-Geral de Justiça