Processo n.º 1.270/07
– MM. Juízo da 4.ª Vara Criminal Central
Réu: (...)
EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO
PROCESSO. CRIME DE RACISMO (LEI N. 7.716/89). DELITO IMPRESCRITÍVEL.
CIRCUNSTÂNCIA QUE REVELA INCOMPATIBILIDADE DO ATO COM A MEDIDA DESPENALIZADORA.
REQUISITOS SUBJETIVOS AUSENTES. DESCABIMENTO DA MEDIDA.
1. O fato imputado ao agente constitui delito dos mais
graves dentre aqueles a que se referiu o legislador constituinte. Cuida-se de
crime inafiançável e imprescritível (CF, art. 5º, XLII). O tratamento dado pelo
Texto Maior a tal infração penal demonstra ser ela incompatível com a medida
despenalizadora cogitada (sursis processual).
2. Não fosse isso, ficou claro nos autos o
não-atendimento dos requisitos subjetivos da medida, haja vista a gravidade
concreta do comportamento atribuído ao agente, que cometeu o crime na presença
de inúmeras pessoas e, em momento algum, demonstrou qualquer arrependimento
pelo ato.
Solução: insisto no descabimento do sursis processual.
Cuida-se
de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...), imputando-lhe,
na denúncia de fls. 01-d/02-d, a prática do crime de preconceito de raça e cor,
tipificado no art. 20, caput, da Lei n.º 7.716/89.
Concluída
a instrução processual, o Ministério Público, fundamentadamente, deixou de
propor a suspensão condicional do processo (fls. 76/77).
Após a
apresentação de memoriais escritos pelas partes (fls. 78/90 e 92/99), a MM.
Juíza, entendendo presentes os requisitos objetivos para a concessão do
benefício, determinou a remessa dos autos a esta Procuradoria Geral de Justiça,
nos termos do art. 28 do CPP (fls. 101).
É o
relatório.
A remessa
dos autos por aplicação analógica do art. 28 do CPP encontra fundamento no art.
129, inc. I, da CF, o qual atribui ao MINISTÉRIO PÚBLICO a titularidade
exclusiva da ação penal pública. Deveras, tratando-se do dominus litis, ao Parquet
incumbe verificar o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n.
9.099/95, notadamente da suspensão condicional do processo. Nesse sentido, a
Súmula 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal.
Deve-se
verificar, portanto, o preenchimento dos requisitos legais.
Nesse
sentido, há de prevalecer, com a devida vênia do d. defensor e do MM. Juiz, o
óbice levantado pelo DD. Promotor de Justiça em sua manifestação de fls. 76/77.
Um
registro inicial há de ser feito. O delito imputado ao agente cuida-se de um
dos crimes mais graves dentre aqueles a que se referiu nossa Constituição
Federal. Com efeito, na extensa gama de infrações penais contidas em nosso
ordenamento jurídico-penal, somente duas delas, dentre as quais o racismo,
receberam a pecha da imprescritibilidade (CF, art. 5º, XLII). Esse tratamento é
sintomático de que o constituinte pretendeu imprimir a tal delito rigor
incompatível com o pretendido benefício legal.
A
par de tal obstáculo, o exame do material probatório reunido nos autos indica o
não-preenchimento dos requisitos subjetivos.
O
entendimento adotado pela MM. Juíza parte de premissa equivocada, com a devida
vênia. O sursis processual não se
sujeita apenas a requisitos objetivos. É o que se denota pela simples leitura
do art. 89, caput, da Lei n.
9.099/95, que faz expressa remissão ao art. 77 do CP.
Com
efeito, a formulação de proposta da suspensão condicional do processo requer o atendimento
a requisitos de ordem subjetiva, a saber: culpabilidade (i.e., gravidade concreta do fato), antecedentes, personalidade,
conduta social, motivos e circunstâncias do crime.
A
culpabilidade deve ser entendida como gravidade concreta do comportamento ou, ainda, como o grau de censurabilidade
da conduta. Ora, o grau de reprovabilidade do ato cometido revela o
despropósito da formulação da proposta. Como bem ressaltou o ínclito
representante ministerial, a maneira como o fato se deu, em meio a diversas
pessoas, indica a gravidade concreta da conduta do agente.
De outra
parte, o réu não demonstrou arrependimento algum pelo ato; pelo contrário,
admitiu a conduta, mas afirmou não considerar crime aquilo que fez (fls. 45).
Correta,
portanto, a atitude do Representante do Parquet.
Diante do
exposto, deixo de propor a suspensão condicional do processo ou de designar
promotor de justiça para fazê-lo e insisto na postura já adotada pelo
Ministério Público. Publique-se a ementa.
São Paulo, 18 de novembro de 2008.
FERNANDO GRELLA VIEIRA
Procurador-Geral de
Justiça