Protocolado n.º 140.427/08 – CPP, art. 28

Processo n.º 1.270/07 – MM. Juízo da 4.ª Vara Criminal Central

Réu: (...)

 

EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. CRIME DE RACISMO (LEI N. 7.716/89). DELITO IMPRESCRITÍVEL. CIRCUNSTÂNCIA QUE REVELA INCOMPATIBILIDADE DO ATO COM A MEDIDA DESPENALIZADORA. REQUISITOS SUBJETIVOS AUSENTES. DESCABIMENTO DA MEDIDA.

1. O fato imputado ao agente constitui delito dos mais graves dentre aqueles a que se referiu o legislador constituinte. Cuida-se de crime inafiançável e imprescritível (CF, art. 5º, XLII). O tratamento dado pelo Texto Maior a tal infração penal demonstra ser ela incompatível com a medida despenalizadora cogitada (sursis processual).

2. Não fosse isso, ficou claro nos autos o não-atendimento dos requisitos subjetivos da medida, haja vista a gravidade concreta do comportamento atribuído ao agente, que cometeu o crime na presença de inúmeras pessoas e, em momento algum, demonstrou qualquer arrependimento pelo ato.

Solução: insisto no descabimento do sursis processual.

 

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...), imputando-lhe, na denúncia de fls. 01-d/02-d, a prática do crime de preconceito de raça e cor, tipificado no art. 20, caput, da Lei n.º 7.716/89.

 

 

 

Concluída a instrução processual, o Ministério Público, fundamentadamente, deixou de propor a suspensão condicional do processo (fls. 76/77).

 

Após a apresentação de memoriais escritos pelas partes (fls. 78/90 e 92/99), a MM. Juíza, entendendo presentes os requisitos objetivos para a concessão do benefício, determinou a remessa dos autos a esta Procuradoria Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 101).

 

                                      É o relatório.

 

                                      A remessa dos autos por aplicação analógica do art. 28 do CPP encontra fundamento no art. 129, inc. I, da CF, o qual atribui ao MINISTÉRIO PÚBLICO a titularidade exclusiva da ação penal pública. Deveras, tratando-se do dominus litis, ao Parquet incumbe verificar o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n. 9.099/95, notadamente da suspensão condicional do processo. Nesse sentido, a Súmula 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

 

                                      Deve-se verificar, portanto, o preenchimento dos requisitos legais.

 

                                      Nesse sentido, há de prevalecer, com a devida vênia do d. defensor e do MM. Juiz, o óbice levantado pelo DD. Promotor de Justiça em sua manifestação de fls. 76/77.

 

                                      Um registro inicial há de ser feito. O delito imputado ao agente cuida-se de um dos crimes mais graves dentre aqueles a que se referiu nossa Constituição Federal. Com efeito, na extensa gama de infrações penais contidas em nosso ordenamento jurídico-penal, somente duas delas, dentre as quais o racismo, receberam a pecha da imprescritibilidade (CF, art. 5º, XLII). Esse tratamento é sintomático de que o constituinte pretendeu imprimir a tal delito rigor incompatível com o pretendido benefício legal.

 

                                      A par de tal obstáculo, o exame do material probatório reunido nos autos indica o não-preenchimento dos requisitos subjetivos.

 

                                      O entendimento adotado pela MM. Juíza parte de premissa equivocada, com a devida vênia. O sursis processual não se sujeita apenas a requisitos objetivos. É o que se denota pela simples leitura do art. 89, caput, da Lei n. 9.099/95, que faz expressa remissão ao art. 77 do CP.

 

                                      Com efeito, a formulação de proposta da suspensão condicional do processo requer o atendimento a requisitos de ordem subjetiva, a saber: culpabilidade (i.e., gravidade concreta do fato), antecedentes, personalidade, conduta social, motivos e circunstâncias do crime.

 

                                      A culpabilidade deve ser entendida como gravidade concreta do comportamento ou, ainda, como o grau de censurabilidade da conduta. Ora, o grau de reprovabilidade do ato cometido revela o despropósito da formulação da proposta. Como bem ressaltou o ínclito representante ministerial, a maneira como o fato se deu, em meio a diversas pessoas, indica a gravidade concreta da conduta do agente.

 

                                     De outra parte, o réu não demonstrou arrependimento algum pelo ato; pelo contrário, admitiu a conduta, mas afirmou não considerar crime aquilo que fez (fls. 45).

             

                                     Correta, portanto, a atitude do Representante do Parquet.

 

                                      Diante do exposto, deixo de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insisto na postura já adotada pelo Ministério Público. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 18 de novembro de 2008.

 

FERNANDO GRELLA VIEIRA

Procurador-Geral de Justiça