Código de Processo Penal, art. 28

 

Protocolado n.º 146.433/10

Autos n.º 002.07.009466-9 – MM. Juízo da 3.ª Vara Criminal do Foro Regional de Santo Amaro (Comarca da Capital)

Investigado: (...)

Vítimas: (...), (...), (...) e (...)

Assunto: revisão de arquivamento de inquérito policial

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO POLICIAL. HOMICÍDIO E LESÕES CORPORAIS CULPOSAS NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR (CTB, ARTS. 302 E 303). AGENTE QUE PERDEU O CONTROLE DO AUTOMÓVEL E ATROPELOU AS VÍTIMAS SOBRE O PASSEIO PÚBLICO. IMPRUDÊNCIA CARACTERIZADA. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.

1.     Como se sabe, neste momento da persecução penal, não se exige a demonstração, plena e cabal, de culpa na conduta do suspeito. É preciso, em verdade, verificar a presença de indícios de quebra do dever de cuidado objetivo no comportamento investigado.

2.     O confronto crítico dos elementos de informação registrados nestes autos permite inferir que, por inegável imprudência, o condutor do veículo perdeu o controle do automóvel, tendo provocado, por conta disto, uma morte e três lesões corporais.

3.     Pode-se vislumbrar, portanto, a citada quebra do dever de cuidado exigido, não só pelo desrespeito das regras elementares de trânsito, mas sobretudo pela maneira desgovernada como, nos momentos imediatamente anteriores aos eventos finais, o suspeito se portava ao volante.

4.     A análise dos motivos que levaram o investigado a atuar imprudentemente, fator destacado pelo Douto Promotor de Justiça em seu pedido de arquivamento, se mostra, com a devida vênia, irrelevante para fins de imputação preambular. Nada obstante, pode-se cogitar das causas que fizeram com que ele assim procedesse, posto que, segundo consta do boletim de ocorrência, lavrado com base nas declarações do indiciado, que se apresentou espontaneamente à Delegacia de Polícia, ele havia adormecido antes do impacto.

Solução: designação de outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar crimes de homicídio e lesão corporal culposas na direção de veículo automotor, que teriam sido cometidos, em tese, por (...) contra as vítimas acima epigrafadas, no dia 20 de outubro de 2007, por volta das 03 horas e 20 minutos, na Estrada de Itapecerica, n. 3.557, nesta Capital.

O Douto Promotor de Justiça oficiante, entendendo não ter se demonstrado haver culpa no proceder do agente, requereu o arquivamento dos autos (fls. 90/91).

O MM. Juiz, discordando da manifestação, determinou a remessa do procedimento a esta Procuradoria Geral de Justiça, com fundamento no art. 28 do CPP (fls. 92).

Eis a síntese do necessário.

Como se sabe, neste momento da persecução penal, não se exige a demonstração, plena e cabal, de culpa na conduta do suspeito. É preciso, em verdade, verificar a presença de indícios de quebra do dever de cuidado objetivo no comportamento investigado.

Pois bem. Consta que (...) conduzia um veículo de sua propriedade em via pública e, de maneira súbita, precipitou o automóvel sobre a calçada, colhendo violentamente quatro pessoas que ali transitavam, uma das quais não resistiu à gravidade dos ferimentos e faleceu in loco.

No curso das investigações, ouviram-se o irmão do falecido (fls. 15), que não presenciou os fatos, e as vítimas sobreviventes (fls. 18, 19 e 30), as quais relataram terem sido atingidas pelas costas por um veículo desgovernado. Inquiriu-se, ainda, o policial militar acionado para atender à ocorrência (fls. 29).

O suspeito foi examinado, não se constatando vestígios de embriaguez (fls. 25).

O laudo de exame cadavérico apontou traumatismo crânio-encefálico como causa da morte (fls. 26/27). O exame de corpo de delito em (...) encontra-se encartado a fls. 28, não sendo conclusivo quanto à gravidade da lesão produzida.

Realizou-se, ainda, perícia no local, tendo a expert elaborado descrição da dinâmica do acidente, instruindo a peça com fotografias do sítio dos acontecimentos (fls. 32/55).

O confronto crítico dos elementos de informação registrados nestes autos permite inferir que, por inegável imprudência, o condutor do veículo perdeu o controle do automóvel, tendo provocado, por conta disto, uma morte e três lesões corporais.

Pode-se vislumbrar, portanto, de maneira inequívoca, a quebra do dever de cuidado objetivo, não só pelo desrespeito das regras elementares de trânsito, mas sobretudo pela maneira desgovernada como, nos momentos imediatamente anteriores aos eventos finais, o suspeito se portava ao volante.

Deve-se anotar que a análise dos motivos que levaram o investigado a atuar imprudentemente se mostra irrelevante para fins de imputação preambular. Pode-se cogitar, todavia, das causas que fizeram com que ele assim procedesse, posto que, segundo consta do boletim de ocorrência, lavrado com base nas declarações de (...), que se apresentou espontaneamente à Delegacia de Polícia, ele havia adormecido ao volante (fls. 05); não se nega que, posteriormente, quando formalmente interrogado, se desmentiu, embora não negasse ter atingido os sujeitos passivos sobre o passeio público (fls. 59/60).

Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e requerer a vinda aos autos dos exames de corpo de delito nos demais ofendidos, bem como a complementação da perícia realizada a fls. 28, devendo prosseguir nos ulteriores termos da causa.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático. Publique-se a ementa.

São Paulo, 17 de novembro de 2010.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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