Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 146.986/15

Autos n.º 0106261-82.2013.8.26.0050 – MM. Juízo da 2.ª Vara Criminal do Foro Central da Capital

Réu: (...)      

Assunto: análise do cabimento de proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n.º 9.099/95)

 

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI N. 9.099/95). RECEPTAÇÃO DOLOSA SIMPLES (CP, ART. 180, CAPUT). VEÍCULO AUTOMOTOR COMO OBJETO MATERIAL. CURTO PERÍODO DE TEMPO ENTRE A SUBTRAÇÃO E O RECEBIMENTO DA “RES”. AUSÊNCIA DE REQUISITOS SUBJETIVOS. ACENTUADA CULPABILIDADE. DESCABIMENTO DA MEDIDA.

1. O cabimento da suspensão condicional do processo não se prende, exclusivamente, a requisitos de ordem objetiva. Além disso, como expressamente dispõe a Lei, é necessário que a “culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício”.

2. No caso dos autos, o grau de reprovabilidade do comportamento do réu mostrou-se acentuado, porquanto se trata da receptação de veículo automotor roubado pouco tempo antes, revelando que possuiria proximidade com os autores do delito antecedente.

3. Atitudes com os traços concretos da ação cometida pelo réu fomentam a criminalidade cotidiana, no que se refere às infrações patrimoniais, corroborando com a negativa do benefício.

Decisão: deixa-se de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insiste-se na postura já adotada pelo Ministério Público.

 

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...), imputando-lhe o crime tipificado no art. 180, caput, do CP.

 Segundo os elementos de informação coligidos, no dia 05 de dezembro de 2013, por volta das 13 horas, na Estrada do Alvarenga, altura do n.° 4.500, esquina com a Rua Josephina Gianinni Elias Pedreira, nesta Capital, VINICIUS foi flagrado por policiais militares quando conduzia o veículo marca “VW”, modelo “Fox”, descrito na denúncia de fls. 01-i/02-i, sabendo ser produto de crime.

O veículo, pertencente à vítima (...), havia sido roubado no dia anterior, por volta das 18 horas (boletim de ocorrência de fls. 16/18).

Abordado pelos milicianos, (...) empreendeu fuga até colidir o veículo, sendo preso em flagrante.

A denúncia foi recebida (fl. 63/64), tendo o feito processamento regular.

Após ser instada pela MM. Juíza (fl. 74), a Douta Promotora de Justiça deixou de propor ao agente a suspensão condicional do processo, entendendo estar ausente requisito subjetivo (fl. 75/76, e verso).

Então, o Ilustre Magistrado, discordando das razões apresentadas pela Nobre Representante Ministerial, endereçou a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça (fl. 78/80).

Eis a síntese do necessário.

Com respeito ao endereçamento do procedimento a este Órgão, destaque-se ter se dado em observância aos ditames constitucionais.

O art. 129, inc. I, da CF, atribui ao Ministério Público a titularidade exclusiva da ação penal pública. Tratando-se do dominus litis, aos membros desta Instituição incumbe verificar o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n.º 9.099/95.

Nesse sentido, a Súmula n.º 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, que proclama cuidar-se a formulação das propostas de verdadeira prerrogativa funcional do Parquet (STJ, HC n.º 150.416, rel. Ministro GILSON DIPP, 5.ª TURMA, DJe de 18/10/2010).

Deve-se aferir, portanto, o preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício.

Pois bem.

Com o máximo respeito que se pode tributar ao MM. Juiz, o beneplácito excogitado, que não é direito subjetivo público do acusado, mas prerrogativa institucional do Ministério Público, não se mostra cabível.

Há de prevalecer, deveras, o óbice levantado pela Ilustre Representante Ministerial, vale dizer, a ausência de requisito subjetivo.

É importante destacar que a suspensão condicional do processo não se sujeita, somente, à verificação de requisitos objetivos, como revela o art. 89, caput, da Lei dos Juizados Especiais Criminais, ao fazer expressa remissão ao art. 77 do CP.

Com efeito, a formulação de proposta de sursis processual requer se examine a culpabilidade, os antecedentes, a personalidade, a conduta social, os motivos e as circunstâncias do crime.

A culpabilidade deve ser entendida como gravidade concreta do comportamento ou, ainda, como o grau de censurabilidade da conduta.

No caso concreto, o grau de reprovabilidade do ato cometido revela o despropósito da formulação da proposta.

Cuida-se de receptação de veículo roubado menos de um dia antes, revelando que o denunciado possuiria perniciosa proximidade com os autores da infração antecedente.

Atitudes com os traços da praticada fomentam a criminalidade cotidiana, no que se refere às infrações patrimoniais, corroborando com a negativa do benefício.

Não se pode desconsiderar, ainda, que o acusado se evadiu ao ser abordado pela Polícia Militar, empreendendo fuga pela via pública até colidir o veículo.

Trata-se de circunstância que denota especial culpabilidade em sua conduta, também obstativa da proposição do benefício.

Conclui-se, portanto, que muito embora o réu não possua ação penal em andamento ou condenação definitiva, a aplicação da medida despenalizadora não atenderá aos postulados da prevenção e retribuição pelo fato ocorrido.

Nesse sentido, inclusive, já se manifestou esta Procuradoria-Geral de Justiça:

“EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI N. 9.099/95). RECEPTAÇÃO DOLOSA SIMPLES (CP, ART. 180, CAPUT). AUSÊNCIA DE REQUISITOS SUBJETIVOS. ACENTUADA CULPABILIDADE. DESCABIMENTO DA MEDIDA.

1. O cabimento da suspensão condicional do processo não se prende, exclusivamente, a requisitos de ordem objetiva. Além disso, como expressamente dispõe a Lei, é necessário que a “culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício”.

2. No caso dos autos, o grau de reprovabilidade do comportamento do réu mostrou-se acentuado, porquanto se trata da receptação de veículo automotor roubado horas antes, revelando que possuiria proximidade com os autores do delito antecedente.

3. Destaque-se afigurar-se inconcebível acreditar que uma pessoa, depois de subtrair um automóvel, o ofereça a desconhecidos, concluindo-se, em consequência, haver comumente uma relação próxima entre os receptadores e os sujeitos ativos dos crimes anteriores.

Decisão: deixa-se de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insiste-se na postura já adotada pelo Ministério Público” (Protocolado n.º 165.402/13 – PGJ/SP)

 

Diante do exposto, deixa-se de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insiste-se na postura já adotada pelo Ministério Público. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 21 de outubro de 2015.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

/aeal