Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 154.221/11

Autos n.º 1.532/10 – MM. Juízo da 14.ª Vara Criminal do Foro Central da Capital

Réu: (...)

Assunto: revisão da recusa ministerial quanto à proposta de suspensão condicional do processo

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. DESCLASSIFICA- ÇÃO DE ROUBO PARA RECEPTAÇÃO OPERADA NA SENTENÇA. PENA CONCRETA APLICADA. DECISÃO TRANSITADA EM JULGADO. INVIABILI- DADE DA MEDIDA DESPENALIZADORA.

1. A suspensão condicional do processo ou sursis processual trata-se de instituto que se insere dentre as medidas alternativas à prisão. Cuida-se, especificamente, de medida alternativa não detentiva de exclusão da jurisdição (RENÉ ARIEL DOTTI). Significa que, por sua natureza, tal providência resulta na suspensão da ação penal em curso, a fim de que o réu, cumprindo determinadas condições, não seja declarado culpado, operando-se a extinção da punibilidade sem a prolação da sentença.

2. Quando o magistrado, ao julgar a causa, desclassifica o crime, analisa a culpabilidade do agente, profere a condenação e, segundo o critério trifásico, aplica a pena concreta, torna-se juridicamente impossível aplicar-se o art. 89 da Lei n. 9.099/95. Não há como suspender o que já se encerrou por decisão transitada em julgado (conforme reconhecido nos autos).

Solução: deixo de propor a suspensão condicional do processo ou de designar outro promotor de justiça para fazê-lo.

 

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...), imputando-lhe, na denúncia de fls. 1-d/2-d, crime de roubo duplamente circunstanciado (CP, art. 157, § 2.º, I e II).

Encerrada a instrução processual, as partes apresentaram memoriais escritos (fls. 137/142 e 144/158).

A MM. Juíza, então, prolatou sentença, desclassificando o delito para receptação (art. 180, caput, c.c. art. 65, I, ambos do CP), e, desde logo, condenou o réu a um ano de reclusão, além do pagamento de dez dias-multa, substituída a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos (fls. 160/167).

Após o trânsito em julgado, determinou-se o encaminhamento dos autos ao Ministério Público a fim de que propusesse a suspensão condicional do processo. A diligente Representante do Parquet, todavia, recusou-se a formular a proposta, aduzindo que o benefício excogitado não poderia ser posterior à condenação (fls. 172/174).

A Digníssima Magistrada, vislumbrando ser cabível o beneplácito ao réu, abriu nova vista do feito ao Ministério Público (fls. 187/190), tendo a Ilustre Promotora de Justiça insistido em seu posicionamento anterior (fls. 192/194), o que ensejou a remessa do expediente a esta Procuradoria-Geral de Justiça, com fundamento no art. 28 do CPP (fls. 195).

Eis a síntese do necessário.

Com a devida vênia da MM. Julgadora, assiste razão à combativa Representante Ministerial.

Com efeito, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória torna absolutamente impossível a formulação da proposta de suspensão condicional do processo.

Mostra-se relevante analisar, nesse contexto, a natureza jurídica do sursis processual.

O instituto constitui medida alternativa não detentiva de exclusão da jurisdição. RENÉ ARIEL DOTTI, ao discorrer sobre o assunto, classifica as medidas alternativas em detentivas e não detentivas:

 

“As primeiras”, ensina, “aparecem sob as modalidades de prisão domiciliar, prisão-albergue, prisão de fim de semana e prisão descontínua. As segundas assumem as modalidades de: a) limitativas de liberdade (proibição de frequentar determinados lugares, liberdade vigiada, trabalhos em favor da comunidade, suspensão condicional da pena, regime de prova, livramento condicional e parole); b) limitativas da capacidade jurídica (inabilitações e interdições); c) sanções pecuniárias (multa, confisco, indenização à vítima e reparação simbólica); d) providências éticas (admoestação, retração e perdão judicial); e) exclusão da jurisdição (suspensão do procedimento e extinção do processo)” (“O novo sistema de penas”, “in”, Reforma Penal, São Paulo, Saraiva, 1985, pág. 106).

 

Damásio de Jesus, de sua parte, comentando o art. 89 da Lei n. 9.099/95 afirma que:

 

Trata-se de uma alternativa à jurisdição penal, um instituto de despena­lização: sem que haja exclusão do caráter ilícito do fato, o legislador procura evitar a aplicação de pena” (Lei dos Juizados Especiais Anotada, São Paulo, Saraiva, 2009, pág. 117).

 

Das lições acima reproduzidas, verifica-se que a suspensão condicional do processo não pode, em absoluto, ser concedida após o trânsito em julgado da decisão.

Não há como suspender o que já se encerrou. O instituto destina-se a evitar o strepitus fori, isto é, o constrangimento (legal) decorrente de uma ação penal. Ademais, só pode ter lugar enquanto a sanção concreta não foi proferida.

In casu, há um título judicial perfeito, acabado e apto a fundamentar a pretensão executória, consistente no cumprimento das penas expressamente impostas na r. decisão.

Nem se diga que tem aplicação ao caso a Súmula n. 337 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça ou o disposto no art. 383 do CPP (com redação dada pela Lei n. 11.709/08), pois, como já se enfatizou, a condenação tornou-se definitiva.

Diante do quanto se expôs, com a devida vênia da MM. Juíza, entende esta Procuradoria-Geral de Justiça que há óbice insuperável à concessão do benefício.

         Destarte, deixo de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insisto na postura já adotada pela competente Membro do Parquet, pugnando pela execução da pena concretamente aplicada.

Cumpra-se. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 09 de novembro de 2011.

 

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

/aeal