Código de Processo Penal, art. 28
Protocolado n.º
16.598/10
Inquérito
Policial n.º 050.09.008598-1– MM. Juízo do DIPO 3 (Comarca da Capital)
Indiciado: (...)
e (...)
Vítima: (...)
Assunto: revisão de pedido de arquivamento
de inquérito policial
EMENTA: CPP, ART. 28. TENTATIVA DE FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE DUAS OU MAIS PESSOAS (CP, ART. 155, §4º, I, C.C. ART. 14, II). AGENTES QUE INGRESSAM NO ESTABELECIMENTO E, ENQUANTO UM DELES DISTRAI OS FUNCIONÁRIOS, O OUTRO SE APODERA DOS BENS. COMPORTAMENTO OBSERVADO, À DISTÂNCIA, PELO RESPONSÁVEL LEGAL DA LOJA, QUE NÃO INTERFERIU NA EXECUÇÃO CRIMINOSA. RELEVÂNCIA TÍPICA DO ATO. CRIME CARACTERIZADO. DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.
1. Não há falar-se em atos meramente preparatórios quando os autores da conduta, visando à subtração de coisa alheia móvel, ingressam no estabelecimento pertencente à vítima e, enquanto um deles procura captar a atenção dos funcionários, seu comparsa toma para si bens existentes no local.
2. Inexiste, ainda, crime impossível – art. 17 do CP – de vez que não houve induzimento de quem quer que seja no ato dos indiciados, senão apenas observação passiva do comportamento delitivo, caracterizando a figura do flagrante esperado e não preparado (Súmula n. 145 do STF).
Solução: designação de outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.
Instaurou-se o presente inquérito policial a partir de auto de prisão em flagrante, porque os indiciados acima epigrafados foram surpreendidos cometendo tentativa de furto no interior de um estabelecimento empresarial.
Ao término das investigações, o Douto Promotor de Justiça requisitou diligências (fls. 47/48) e, ao final, pugnou pelo arquivamento do expediente, por lhe parecer atípica a conduta perpetrada, vislumbrando tão somente atos preparatórios impuníveis (fls. 83/84).
A MM. Juíza, discordando de tal entendimento, remeteu os autos a esta Procuradoria Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 86/87).
Eis a síntese do necessário.
A tese abraçada pelo competente Representante Ministerial, com a devida vênia, não pode ser aceita, em que pese suas bem lançadas razões.
Note-se que os fatos são incontroversos; vale dizer, no dia
Isto porque dera falta de alguns frascos de perfume no dia anterior, e, questionando os funcionários a respeito, obtivera a alegação de que os investigados já teriam estado no local por mais de uma vez, com o mesmo comportamento, ou seja, (...) distraía os empregados, pedindo informações sobre vários itens, e reservava alguns produtos para buscá-los em outro dia. Enquanto isso, (...) andava pela loja.
No dia em questão, (...) ficou do lado de fora, com outras pessoas, vigiando-os, e viu que, repetindo os atos já levados a efeito, o increpado pegou um recipiente e o colocou na cintura, sob a camiseta que usava.
Ela, então, fechou a porta de entrada, solicitando ao segurança do Shopping que chamasse a Polícia.
(...), a seguir, pediu-lhe para fazer um “acordo”, aduzindo que iria buscar os outros produtos subtraídos, permanecendo (...) no local.
Voltou cerca de quarenta e cinco minutos depois, mas não os portava, e, como os milicianos já estavam ali, lhes disse onde os deixara, mas nada foi localizado.
As declarações dos policiais militares foram acostadas a fls. 03 e 05, de (...) a fls. 06 e 77 e de um funcionário da loja, (...), a fls. 76.
Os agentes foram ouvidos a fls. 08 e 09. Ela manteve-se em silêncio e ele negou o furto.
Pois bem. Da síntese exposta, infere-se que o estado flagrancial ficou claramente desenhado no comportamento dos autores.
Não há falar-se, com a devida vênia, em atos meramente preparatórios.
Com efeito, dá-se o início de execução desde as atitudes imediatamente anteriores ao início da conduta típica.
No caso, o iter criminis percorreu suficientemente a fase punível, até porque o comportamento dos agentes se subsume, com perfeição, ao cometimento de atos materiais que configuraram meio executório do furto cogitado por eles.
Nesse sentido de que há tentativa do delito, destaque-se o entendimento esposado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, quando decidiu:
“FURTO. ARROMBAMENTO. ATO EXECUTÓRIO. TENTATIVA. CONFIGURAÇÃO.
1. Considera-se iniciada a execução do crime de furto quando o agente é preso em flagrante, no interior de estabelecimento comercial, por ele arrombado, com o fim de subtrair coisa móvel alheia.
2. No crime de furto, para que reste configurada a tentativa, suficiente o início da execução, não sendo exigível a efetiva subtração.
3. Recurso especial conhecido e
provido”.
(STJ, R. Esp. n. 111.281, rel. Min. EDSON VIDIGAL, publicado no DJU de
Veja-se,
em particular, o seguinte julgado, em que o conatus
foi reconhecido em situação na qual os increpados sequer haviam ingressado
no imóvel:
“RECURSO ESPECIAL. FURTO QUALIFICADO PELO CONCURSO DE AGENTES.
Uso de barra de ferro para ingresso em residência de terceiro com "animus furandi". Não consumação do ingresso por
interferência de terceiros. Atos que se caracterizam
como início de execução.
- Recurso conhecido e provido”.
(STJ,
R. Esp. n. 113.603, rel. Min.
JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, publicado no DJU
de
É de se ponderar, por oportuno, que também não caberia cogitar-se de quase-crime, de vez que inexistiu qualquer induzimento por parte dos ofendidos ou terceiros, senão atitude meramente passiva, consistente em observar a conduta típica, sem nela interferir, salvo para evitar a consumação.
Diante das considerações acima expostas, o arquivamento não pode prosperar, data maxima venia.
Em face do exposto, designo outro promotor de justiça para
oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal,
facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302
(PGJ/CSMP/CGMP), de
São
Paulo,
Fernando
Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
/aeal