Código de Processo Penal, art. 28

 

Protocolado n.º 17.938/10

Autos n.º 385/09 – MM. Juízo do Juizado Especial Criminal da Comarca de Itararé

Indiciado: (...)

Assunto: revisão de pedido de arquivamento de termo circunstanciado

 

 

CPP, ART. 28. CONTRAVENÇÃO PENAL. PORTE DE ARMA (LCP, ART. 19). REVOGAÇÃO APENAS PARCIAL DA DISPOSIÇÃO. NORMA VIGENTE NO QUE SE REFERE ÀS ARMAS BRANCAS. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL. PROSSEGUIMENTO DA CAUSA QUE SE IMPÕE.

1.      A contravenção penal capitulada no art. 19 da LCP subsiste no que se refere ao porte de armas brancas, conduta sobejamente demonstrada durante a fase investigatória.

2.      O Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu no sentido da vigência da mencionada disposição legal (STJ, R.esp. n. 549.056, rel. Ministra Laurita Vaz, DJU de 01.03.2004, p. 194).

Solução: designação de outro promotor de justiça para propor transação penal ou oferecer denúncia, conforme o disposto no art. 76 da Lei n. 9.099/95.

 

 

 

 

O presente termo circunstanciado foi instaurado para apurar a prática, em tese, do delito de porte ilegal de arma branca (LCP, art. 19), que teria sido perpetrado por (...).

O d. Promotor de Justiça, ao manifestar-se, postulou pelo arquivamento do feito, em virtude da atipicidade da conduta atribuída ao investigado (fls. 22/23).

O MM. Juiz, discordando de tal entendimento, determinou a remessa do expediente a esta Procuradoria Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 28/30).

Eis a síntese do necessário.

Dos elementos de informação colhidos nos presentes autos infere-se que, no dia 17 de junho de 2009, por volta de 22 horas e 27 minutos, os Guardas Municipais (...) e (...) foram acionados a comparecerem à Santa Casa de Itararé, pois dois homens embriagados discutiam no interior do Pronto Socorro.

Para lá se dirigiram, percebendo um volume nas costas de (...), o qual foi abordado, lhe sendo retirado da cintura um facão.

Este aduziu que o objeto pertenceria ao investigado, e narrou que ambos estavam em um bar, pertencente a (...), quando (...), ébrio, começou a provocá-lo, brandindo em sua direção o citado facão, que lhe foi atirado, após ter o indiciado lhe desferido um chute.

(...) o pegou e informou ao agente que iria até o hospital para fazer curativos, mas o levaria consigo para entregá-lo às autoridades.

O increpado, não conformado, foi até o local, e os guardas, que lá já estavam, não puderam entender o que dizia, diante de seu visível estado de embriaguez.

Quando de seu depoimento, o suspeito disse sofrer de doença mental, e por isso não conseguiria se explicar detalhadamente, mas confirmou ser seu o facão, e o utilizaria em seu trabalho.

(...), por sua vez, alegou não ter presenciado o ocorrido, mas (...) lhe teria dito no dia seguinte que (...), conhecido como “(...)”, tomara seu objeto, e o levara para os Guardas Municipais que estavam na Santa Casa de Misericórdia.

As declarações foram acostadas a fls. 08/09, 10, 11, 13, 15.

Pois bem.

Pelo que dos autos consta, é forçoso concluir que assiste razão ao d. Magistrado, com a devida vênia do entendimento esposado pelo i. Representante Ministerial.

A solução da quaestio requer se analise se a contravenção penal de porte ilegal de arma branca continua em vigor.

Em primeiro lugar, é preciso compreender a estrutura do tipo penal. O comportamento incriminado consiste em “trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta”. A parte final do dispositivo, traduzida no elemento normativo “sem licença da autoridade”, referia-se tão somente às armas de fogo. Em matéria de armas brancas, “não existe órgão que expeça autorização (...). Daí por que todo o porte de arma branca é proibido” (ANDREUCCI, Ricardo Antônio. Legislação penal especial. 3ª ed. São Paulo: Saraiva. 2007. pág. 505).

SÉRGIO DE OLIVEIRA MÉDICI, em clássica obra, pondera que: “O agente que, ostensivamente, num lugar público, apresenta-se com uma navalha à cinta, pode praticar a contravenção do art. 19? Cremos que sim, diante da impropriedade do emprego do instrumento e de outras circunstâncias objetivas, que sempre devem ser levadas em consideração” (Contravenções Penais. 2ª ed. Bauru: Jalovi, 1980. pág. 77).

O outro ponto a ser tratado refere-se à definição de arma branca. Entende-se como tal todo instrumento vulnerante, de ataque ou de defesa, não abrangido pelo conceito de arma de fogo. Dividem-se em armas próprias (especialmente destinadas a servirem como tal) e impróprias (instrumentos criados para outra finalidade, empregados pelo autor da conduta como objetos vulnerantes).

Com relação às últimas, seu uso dentro do âmbito das suas finalidades específicas constitui fato lícito. Fora daí, configura a contravenção penal.

Ressalte-se que o facão foi descrito no laudo constante a fls. 17, e poderia eficazmente ser utilizado como instrumento pérfuro-cortante.

Acrescente-se, por outro lado, que a jurisprudência já firmou entendimento sobre a subsistência da infração mencionada.

 

“RECURSO ESPECIAL. PENAL. ART. 19 DA LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS. REVOGAÇÃO PARCIAL. ART. 10 DA LEI n.º 9.437/97.  SUBSISTÊNCIA DA CONTRAVENÇÃO QUANTO AO PORTE DE ARMA BRANCA.

1. Com a edição da Lei n.º 9.437/97 (diploma que instituiu o Sistema Nacional de Armas e tipificou como crime o porte não autorizado de arma de fogo), o art. 19 da Lei das Contravenções Penais foi apenas derrogado, subsistindo a contravenção quanto ao porte de arma branca.

2. Recurso especial conhecido e provido”.

(STJ, R.Esp. n. 549.056, rel. Ministra LAURITA VAZ, DJU de 01.03.2004, p. 194).

 

Pois bem. Diante da prova encartada, não se pode afastar a ocorrência da última hipótese acima formulada, qual seja, o uso irregular do objeto.

Diante disso, designo outro promotor de justiça para oficiar nos autos e propor transação penal ou oferecer denúncia, com fundamento no art. 76 da Lei n. 9.099/95, bem como prosseguir no feito em seus ulteriores termos, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria, designando o substituto automático.

São Paulo, 09 de fevereiro de 2010.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

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