Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 179.598/11

Inquérito Policial n.º 420/11 – MM. Juízo da 1.ª Vara Criminal da Comarca de Tupã

Indiciado: (...)

Assunto: revisão de proposta de arquivamento de inquérito policial

 

 

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. POSSE ILEGAL DE ARMA DE FOGO (LEI N. 10.826/03, ART. 12). INSTRUMENTOS BÉLICOS APREENDIDOS NA RESIDÊNCIA DO INDICIADO, EM CUMPRIMENTO A MANDADO DE BUSCA E APREENSÃO DOMICILIAR. ALEGAÇÃO DE QUE SE TRATA DE HERANÇA DE FAMÍLIA. OBJETOS APTOS A DEFLAGRAÇÃO DE DISPAROS. JUSTA CAUSA PRESENTE. REGIME JURÍDICO IMPLEMENTADO PELA LEI 11.706/08, PRORROGADO PELA LEI 11.922/09. NORMA QUE CONSAGRA A EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM FACE DA ENTREGA VOLUNTÁRIA (SITUAÇÃO INOCORRENTE NO CASO), ATITUDE SEM A QUAL O FATO É PUNÍVEL. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.

1.     As armas foram apreendidas na residência do suspeito, quando policiais federais para lá se dirigiram, em cumprimento de mandado judicial expedido no bojo da operação denominada “Tapete Persa”. Submetidas à perícia, constatou-se sua eficácia para a deflagração de disparos. Inexiste dúvida, por outro giro, quanto à propriedade dos objetos materiais. Reconhece-se, desta feita, a presença de justa causa para se deflagrar a persecução penal em juízo.

2.     Pouco importa que as espingardas constituam herança de família e, menos ainda, que não tenham sido utilizadas recentemente, até porque não se cogita de imputar o delito (mais grave) de disparo de arma de fogo.

3.     O regime legal da posse de armas de fogo de uso permitido, cujo detentor não as têm regularizadas, por qualquer motivo, modificou-se com o passar dos anos, desde o início da vigência do Estatuto do Desarmamento. Na hipótese dos autos, a apreensão dos instrumentos bélicos ocorreu em julho de 2010, devendo a questão ser analisada nos termos do art. 32 da Lei n. 10.826/03, segundo o qual se admite a entrega espontânea do armamento aos órgãos federais competentes, atitude esta que provocará a extinção da punibilidade.

4.     Arremate-se, nesta ordem de ideias, que se a norma proclama a extinção do direito de punir do Estado, deve-se concluir, por imperativo lógico, que a conduta, até então, era punível. Em outras palavras, sem essa conduta espontânea, permanecerá incólume o ius puniendi estatal.

Solução: designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia e verificar o cabimento da suspensão condicional do processo, cumprindo-lhe prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado a partir de auto de prisão em flagrante, para apurar suposto crime de posse irregular de arma de fogo (art. 12 da Lei n. 10.826/03).

O Douto Promotor de Justiça requereu o arquivamento dos autos, asseverando que os instrumentos bélicos encontravam-se em péssimo estado de conservação e não eram utilizados há muito tempo, o que tornaria o fato penalmente irrelevante (fls. 52/53).

O MM. Juiz, todavia, discordando de tal posicionamento, determinou a remessa do feito a esta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 54/55).

Eis a síntese do necessário.

Com a devida vênia do Ilustre Representante Ministerial, não lhe assiste razão.

Deve-se asseverar, de pronto, que as armas foram apreendidas em operação desencadeada pela Polícia Federal e que, depois de periciadas, constatou-se sua eficácia para a deflagração de disparos (fls. 32/37).

Inexiste dúvida, por outro giro, quanto à propriedade dos objetos materiais.

Reconhece-se, desta feita, a presença de justa causa para se deflagrar a persecução penal em juízo.

Pouco importa, à luz do quadro sinteticamente exposto, que as espingardas constituam herança de família e, menos ainda, que não tenham sido utilizadas recentemente, até porque não se cogita de imputar o delito (mais grave) de disparo de arma de fogo.

Pondere-se, outrossim, que o atual regime legal da posse de armas de fogo de uso permitido, cujo detentor não as têm regularizadas, por qualquer motivo, modificou-se com o passar dos anos, desde o início da vigência do Estatuto do Desarmamento.

Na hipótese dos autos, a apreensão dos instrumentos bélicos ocorreu em julho de 2010, devendo a questão ser analisada nos termos do art. 32 da Lei n. 10.826/03 (cujo prazo foi prorrogado pela Lei n. 11.922/09), segundo o qual se admite a entrega espontânea do armamento aos órgãos federais competentes, atitude esta que provocará a extinção da punibilidade.

Não há mais falar-se, portanto, em abolitio criminis temporária, como ocorria nos primeiros anos da vigência do Diploma mencionado.

A Comissão do Senado Federal que examinou o Projeto de Lei do qual resultou na elaboração da Lei n. 11.706/08, em face da conversão da Medida Provisória n. 417, em parecer, exarou que:

 

“Como ressalva, um comentário sobre a polêmica tese da descriminalização da posse de arma de fogo em razão do art. 32 da Lei n. 10.826, de 2003. Temia-se que a possibilidade de entrega, a qualquer tempo, da arma de fogo mediante indenização e presunção de boa-fé fosse entendida como uma estratégia de descriminalização, na linha de algumas decisões do Superior Tribunal de Justiça e do próprio Supremo Tribunal Federal.

Ciente dessa disputa jurídica, o PLV utiliza, no art. 32 da Lei n. 10.826, de 2003, a expressão ‘ficando extinta a punibilidade de eventual posse irregular da referida arma’. Desse modo, não se poderá alegar que a posse ilegal de arma de fogo foi descriminalizada, pois o que se admitiu, tecnicamente, foi a ‘extinção da punibilidade’ pela entrega voluntária. Noutras palavras: se, ao cumprir um mandado de busca e apreensão domiciliar, a polícia encontrar uma arma de fogo não registrada no interior da residência, o crime subsiste. A causa de extinção da punibilidade só incidirá se o interessado voluntariamente entregar a arma de fogo, buscando por iniciativa própria a polícia federal” (fonte: www.senado.gov.br).

 

Arremate-se, nesta ordem de ideias, que se a norma proclama a extinção do direito de punir do Estado, deve-se concluir, por imperativo lógico, que a conduta, até então, era punível. Em outras palavras, sem essa atitude espontânea, permanecerá incólume o ius puniendi estatal.

Tem-se, daí, que todo aquele que guarda em sua residência arma de fogo sem o devido registro, incorre na infração penal contida no art. 12 da Lei, a qual se encontra em pleno vigor.

De mais a ver, as armas foram apreendidas na residência do suspeito, quando policiais federais para lá se dirigiram, em cumprimento de mandado judicial expedido no bojo da operação denominada “Tapete Persa”. Significa dizer que ele, em momento algum, procurou regularizar a posse do material.

Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e verificar o cabimento da suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95), prosseguindo no feito em seus ulteriores termos.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 09 de janeiro de 2012.

 

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

 

 

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