Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n. 33.659/13

Autos n. 159/11 – MM. Juízo da 2.ª Vara Judicial da Comarca de Ibiúna

Indiciada: (...)

Assunto: revisão de promoção de arquivamento de inquérito policial

 

EMENTA: CPP, ART. 28. FALSIDADE DE DOCUMENTO PARTICULAR (CP, ART. 298). ADVOGADA NOMEADA (CONVÊNIO OAB/PGE) QUE FALSIFICOU ASSINATURA DA AUTORA EM PETIÇÃO JUDICIAL, A FIM DE HOMOLOGAR ACORDO SEM A ANUÊNCIA DESTA. SUJEITO PASSIVO SECUNDÁRIO QUE, AO TOMAR CONHECIMENTO DA COMPOSIÇÃO, REVELOU DISCORDAR DE SEUS TERMOS. PRESENÇA DOS ELEMENTOS INDISPENSÁVEIS À CARACTERIZAÇÃO DO CRIME DE FALSIDADE.

1. Impende sublinhar que a infração penal imputada à suspeita constitui delito contra a fé pública e, como tal, submete-se à presença dos elementos indispensáveis à caracterização dos crimen falsii.

2. Conforme pontificava SYLVIO DO AMARAL, tais requisitos se consubstanciam nos seguintes: a) a alteração da verdade sobre fato juridicamente relevante (immutatio veritatis); b) a imitação da verdade (immitatio veritatis); c) a potencialidade de dano (falsum punitur licet nemini damun inferret, sufficit enim quod potuit damnum inferre); d) o dolo (animus fallendi).

3. Cuida-se a immutatio veritatis da essência do delito, pois o que busca o falsário não é outra coisa senão alterar a verdade, modificando as condições relativas a um fato ou relação jurídica. Complementando o requisito anterior, entende-se indispensável a imitação da verdade (immitatio veritatis), ou seja, o meio executivo do qual se vale o sujeito deve ter como alvo a reprodução do verdadeiro, de modo a iludir as pessoas.  A immitatio veritatis e a potencialidade de dano guardam, como todos os itens expostos, verdadeira interdependência.

4. Recorde-se, nesse sentido, que a lei penal visa tutelar a força probante dos documentos (em sentido lato), por meio do reforço à crença de sua veracidade e autenticidade. Se a falsificação for grosseira ou inverossímil, o objeto produzido ou modificado será totalmente incapaz de enganar as pessoas, de modo que o agente não lesará a fé pública ou seu consectário, a segurança no tráfico jurídico probatório.

5. No caso em apreço, não fosse a declaração da autora da demanda, prestada em audiência cível, revelando não ser a subscritora do documento, a fraude documental passaria despercebida. É bem verdade que o confronto entre a assinatura da prejudicada com a falsamente aposta pela advogada apresenta discrepância. Ocorre, porém, como já mencionado, que tal circunstância não seria notada caso a própria representada não houvesse se manifestado oportunamente.

6. Acrescente-se que não se exige na espécie dano efetivo, mas possibilidade de dano (essa é justamente a diferença entre os “crimes contra a fé pública” e os delitos contra o patrimônio que têm o falso como meio executivo). “Se a ação do falsário é dirigida no sentido de modificar o documento, visando primordialmente alterar suas qualidades intrínsecas ou extrínsecas como meio de prova de fato juridicamente relevante, basta que se criem condições de perigo de alteração da verdade a dano de outrem para a perfeita integração do crime consumado de falsidade; ao contrário, sempre que a enunciação mendaz feita através da falsificação não passa de meio ardiloso de que se vale o agente para ludibriar o ofendido, isto é, de instrumento material da fraude cometida, a figura delituosa (estelionato, sob qualquer de suas formas) se terá por meramente tentada, quando o prejuízo não vier a concretizar-se” (AMARAL, Sylvio do, Falsidade documental, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1958, pág. 67).

7. Pondere-se ainda que o prejuízo visado não precisa ser de natureza econômica, mas de qualquer ordem, conquanto possua o condão de macular algum bem ou direito alheio. Exige-se, por derradeiro, ação dolosa, admitida expressamente pela investigada em suas declarações.

Solução: designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia, prosseguindo no feito em seus ulteriores termos.

 

 

 

Cuida-se de procedimento instaurado a partir de cópias extraídas do processo n. 238.01.2010.003600-7, em trâmite perante a MM. 2.ª Vara Judicial da Comarca de Ibiúna, visando à apuração da conduta praticada pela advogada (...), que constituiria, em tese, crime contra a fé pública.

No curso das investigações, deve-se ressaltar, a agente impetrou habeas corpus pugnando pelo trancamento do caso, tendo a Colenda 14.ª Câmara de Direito Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo denegado a ordem (fls. 77/81).

Encerradas as providências de polícia judiciária, o Douto Promotor de Justiça postulou o arquivamento do feito, pois, segundo sua ótica, a falsificação perpetrada não se mostrou apta a causar dano, tornando o ato cometido penalmente atípico (fls. 89/94).

O MM. Juiz, entretanto, discordando de tal posicionamento, encaminhou a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 112/113).

A indiciada, então, opôs embargos de declaração (fls. 117/120), rejeitados pelo Digníssimo Magistrado (fls. 147/159).

Eis a síntese do necessário.

Com a devida vênia do Ilustre Representante Ministerial, cremos que não lhe assiste razão.

Em breve síntese, consta dos elementos de convicção coligidos que (...), na qualidade de advogada de (...), nos autos da Ação de Modificação de Visitas ajuizada contra (...), falsificou a assinatura da autora da demanda em petição contendo suposto acordo entre as partes (fls. 20/21).

Em sede de audiência de tentativa de conciliação, porém, (...) informou nunca ter firmado o mencionado documento e que não tomara parte em momento algum da avença, rejeitando-a (fl. 26).

A investigada, outrossim, reconheceu como de seu próprio punho a firma aposta, justificando seu ato nos poderes a ela outorgados por meio de instrumento de procuração (fl. 30).

A representada, quando auscultada, aduziu acreditar que a agente não agiu com má-fé, buscando, em verdade, ajudá-la (fl. 49).

Pois bem.

Impende sublinhar que a infração penal imputada à suspeita constitui delito contra a fé pública e, como tal, submete-se à presença dos elementos indispensáveis à caracterização dos crimen falsii.

Conforme pontificava SYLVIO DO AMARAL, tais requisitos se consubstanciam nos seguintes:

a) a alteração da verdade sobre fato juridicamente relevante (immutatio veritatis);

b) a imitação da verdade (immitatio veritatis);

c) a potencialidade de dano (falsum punitur licet nemini damun inferret, sufficit enim quod potuit damnum inferre);

d) o dolo (animus fallendi).

Cuida-se a immutatio veritatis da essência do delito, pois o que busca o falsário não é outra coisa senão alterar a verdade, modificando as condições relativas a um fato ou relação jurídica.

Complementando o requisito anterior, entende-se indispensável a imitação da verdade (immitatio veritatis), ou seja, o meio executivo do qual se vale o sujeito deve ter como alvo a reprodução do verdadeiro, de modo a iludir as pessoas.

A immitatio veritatis e a potencialidade de dano guardam, como todos os itens expostos, verdadeira interdependência.

Recorde-se, nesse sentido, que a lei penal visa tutelar a força probante dos documentos (em sentido lato), por meio do reforço à crença de sua veracidade e autenticidade. Se a falsificação for grosseira ou inverossímil, o objeto produzido ou modificado será totalmente incapaz de enganar as pessoas, de modo que o agente não lesará a fé pública ou seu consectário, a segurança no tráfico jurídico probatório.

No caso em apreço, não fosse a declaração de (...), prestada em audiência cível, revelando não ser a subscritora do documento, a fraude documental passaria despercebida.

É bem verdade que o confronto entre a assinatura da prejudicada com a falsamente aposta pela advogada apresenta discrepância. Ocorre, porém, como já mencionado, que tal circunstância não seria notada caso a própria representada não houvesse se manifestado oportunamente.

Acrescente-se que não se exige na espécie dano efetivo, mas possibilidade de dano (essa é justamente a diferença entre os “crimes contra a fé pública” e os delitos contra o patrimônio que têm o falso como meio executivo). “Se a ação do falsário é dirigida no sentido de modificar o documento, visando primordialmente alterar suas qualidades intrínsecas ou extrínsecas como meio de prova de fato juridicamente relevante, basta que se criem condições de perigo de alteração da verdade a dano de outrem para a perfeita integração do crime consumado de falsidade; ao contrário, sempre que a enunciação mendaz feita através da falsificação não passa de meio ardiloso de que se vale o agente para ludibriar o ofendido, isto é, de instrumento material da fraude cometida, a figura delituosa (estelionato, sob qualquer de suas formas) se terá por meramente tentada, quando o prejuízo não vier a concretizar-se” (AMARAL, Sylvio do, Falsidade documental, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1958, pág. 67).

Pondere-se ainda que o prejuízo visado não precisa ser de natureza econômica, mas de qualquer ordem, conquanto possua o condão de macular algum bem ou direito alheio.

Exige-se, por derradeiro, ação dolosa, constatada quando (...) confirmou ter rubricado com seu próprio punho o multicitado acordo (fls. 20/21).

Diante do exposto, designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia, prosseguindo no feito em seus ulteriores termos, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria designando o substituto automático. Publique-se a ementa.

São Paulo, 07 de março de 2013.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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