Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 53.522/12

Autos n.º 557/07 – MM. Juízo do V Tribunal do Júri da Comarca da Capital

Réu: (...)

Assunto: falta de apresentação de alegações finais por memoriais

 

CPP, ART. 28. FALTA DE APRESENTAÇÃO DE ALEGAÇÕES FINAIS POR MEMORIAIS POR PARTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. CABIMENTO DO MECANISMO PROCESSUAL INVOCADO COMO FORMA DE CONTROLE DO PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE DA AÇÃO PENAL PÚBLICA.

1.     Cuida-se de ação penal movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO imputando ao acusado homicídio qualificado tentado (art. 121, § 2.º, II e IV, c.c. art. 14, II, do CP). Concluída a instrução do sumário da culpa, determinou o MM. Juiz a conversão dos debates orais em memoriais escritos, encaminhando o procedimento ao Douto Promotor de Justiça, o qual requereu, antes de apresentar sua peça, fosse efetuada a transcrição da prova colhida em audiência, captada por meio de registro audiovisual. O Digníssimo Magistrado, entretanto, indeferiu a postulação e determinou nova abertura de vista ao Parquet. O Ilustre Representante Ministerial, desta feita, reiterou sua postura e, fundamentadamente, insistiu na postulação anterior, o que motivou o Nobre Julgador, diante da falta de apresentação das alegações finais excogitadas, a aplicar o art. 28 do CPP e ordenar o envio dos autos a esta Procuradoria-Geral de Justiça.

2.     Deve-se ressaltar, preliminarmente, que o mecanismo contido no art. 28 do CPP, invocado na r. decisão excogitada, constitui modalidade anômala de controle do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública (CPP, art. 24). Como se sabe, nosso processo criminal tem como princípio reitor, entre outros, o nec delicta maneant impunita. Bem por isso, quando se detectar que o membro do Ministério Público não exerce a ação penal pública, há de se remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para ser analisada a atitude verificada. Não há dúvida alguma que a sistemática sub examen deve ser sempre interpretada de maneira restrita. Não se pode ampliar sua incidência para situações processuais estranhas ao controle do princípio da legalidade da ação penal pública (ou de seu corolário, o princípio da indisponibilidade – arts. 42 e 576 do CPP). Isto não significa que somente tem lugar o art. 28 do CPP quando o promotor de justiça pedir o arquivamento e o Juiz discordar. Atualmente, como é cediço, também incide a norma mencionada para efeito de controle do exercício da transação penal, da suspensão condicional do processo, do aditamento da acusação nos casos de mutatio libelli (com expressa remissão no art. 384 do CPP, cuja redação foi dada pela Lei n. 11.709/08) e na hipótese de omissão ministerial (entendida como negativa de atuação). Em todas as situações enumeradas, a atuação do Procurador-Geral de Justiça, que age provocado pela autoridade judiciária, guarda íntima relação com o multicitado princípio da obrigatoriedade (ou seu consectário lógico – a indisponibilidade). Na hipótese sub examen, deve-se conhecer da remessa, justamente porque relacionada com o mencionado corolário da obrigatoriedade.

3.     No mérito, parece-nos que não pode o Ministério Público deixar de se manifestar na presente fase processual, com a devida vênia do Douto Promotor de Justiça e a despeito de sua postura afigurar-se devidamente motivada; explica-se. Cremos, de fato, que a melhor exegese relativamente à colheita da prova durante o judicium accusationis é a sustentada pelo Membro do Parquet, no sentido de que a norma geral do art. 405, §2.º, do CPP não se aplica ao rito especial de apuração dos delitos dolosos contra a vida. Isto porque, como bem destacou o Ilustre Representante Ministerial oficiante, tem o procedimento do Júri suas peculiaridades e, a prevalecer a determinação judicial, aos jurados seria obstada a análise dos depoimentos reunidos na primeira fase do processo. De acrescentar-se, na esteira desta argumentação, que o juiz leigo tem contato com o conteúdo anterior ao julgamento por meio da leitura dos registros colhidos. É o que se conclui mediante a interpretação sistemática dos arts. 472, parágrafo único, 480, caput e §§ 2.º e 3.º, todos do CPP. Registre-se, ainda, o teor do art. 475, parágrafo único, do CPP, o qual dispõe que a prova produzida em Plenário deverá ser transcrita para constar dos autos, bem revelando o espírito que norteou a Lei n. 11.689/08 que, por se cuidar de norma inserida no contexto do Tribunal do Júri, há de nortear o correto encaminhamento do tema. Razoável sustentar-se, desta feita, a necessidade de degravação das declarações coligidas.

4.     Ocorre, todavia, que não cabe à Procuradoria-Geral de Justiça ditar as regras procedimentais que devem presidir o andamento da ação penal. Cumpre-lhe, na verdade, verificar tão somente a postura ministerial consistente na falta de apresentação de manifestação indispensável ao seguimento da causa. Sob essa ótica, afigura-se-nos impossível respaldar a, repise-se, devidamente justificada postura ministerial; isto porque, a prevalecer a negativa do Parquet, secundada que fosse por esta Chefia Institucional, criar-se-ia insolúvel impasse, com evidente prejuízo à administração da Justiça, à apuração da verdade, à responsabilização dos culpados e, em última análise, à sociedade que o Ministério Público representa. O oferecimento dos memoriais, destarte, é medida que se impõe. Isto não quer dizer que a discussão processual haurida no caso encontrar-se-á preclusa. Pelo contrário, parece-nos que deva persistir, inclusive, se assim entender o promotor natural, com a interposição dos meios de impugnação cabíveis para que a transcrição pretendida, fundamental não só para a acusação senão também para a defesa, se viabilize.

Solução: conhece-se da presente remessa para, sem desautorizar a fundamentação contida no pleito ministerial, designar outro promotor de justiça para oficiar no caso, apresentando as alegações finais escritas, cumprindo-lhe prosseguir na causa até final conclusão, sem prejuízo de, caso assim entenda, interpor medidas jurisdicionais adequadas, perante a Superior Instância, com o fim de ver a pretensão de transcrição dos depoimentos acolhida até a realização do Plenário.

 

Cuida-se o presente de ação penal movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de (...), imputando-lhe o crime tipificado no art. 121, § 2.º, II e IV, c.c. art. 14, II, ambos do CP.

Concluída a instrução do sumário da culpa, determinou o MM. Juiz a conversão dos debates orais em memoriais escritos (fls. 325), encaminhando o procedimento ao Douto Promotor de Justiça, o qual requereu, antes de apresentar sua peça, fosse efetuada a transcrição da prova colhida em audiência, captada por meio de registro audiovisual (fls. 328).

O Digníssimo Magistrado, entretanto, indeferiu a postulação e determinou nova abertura de vista ao Parquet (fls. 329).

O Ilustre Representante Ministerial, desta feita, reiterou sua postura e, fundamentadamente, insistiu na postulação anterior (fls. 333/335), o que motivou o Nobre Julgador, diante da falta de apresentação das alegações finais excogitadas, a aplicar o art. 28 do CPP e ordenar o envio dos autos a esta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 336/337).

Eis a síntese do necessário.

Deve-se ressaltar, preliminarmente, que o mecanismo contido no art. 28 do CPP, invocado na r. decisão excogitada, constitui modalidade anômala de controle do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública (CPP, art. 24). Como se sabe, nosso processo criminal tem como princípio reitor, entre outros, o nec delicta maneant impunita. Bem por isso, quando se detectar que o membro do Ministério Público não exerce a ação penal pública, há de se remeter os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para ser analisada a atitude verificada.

Não há dúvida alguma que a sistemática sub examen deve ser sempre interpretada de maneira restrita. Não se pode ampliar sua incidência para situações processuais estranhas ao controle do princípio da legalidade da ação penal pública (ou de seu corolário, o princípio da indisponibilidade – arts. 42 e 576 do CPP).

Isto não significa que somente tem lugar o art. 28 do CPP quando o promotor de justiça pedir o arquivamento e o Juiz discordar. Atualmente, como é cediço, também incide a norma mencionada para efeito de controle do exercício da transação penal, da suspensão condicional do processo, do aditamento da acusação nos casos de mutatio libelli (com expressa remissão no art. 384 do CPP, cuja redação foi dada pela Lei n. 11.709/08) e na hipótese de omissão ministerial (entendida como negativa de atuação).

Em todas as situações enumeradas, a atuação do Procurador-Geral de Justiça, que age provocado pela autoridade judiciária, guarda íntima relação com o multicitado princípio da obrigatoriedade (ou seu consectário lógico – a indisponibilidade).

Na hipótese sub examen, deve-se conhecer da remessa, justamente porque relacionada com o mencionado corolário da obrigatoriedade.

No mérito, parece-nos que não pode o Ministério Público deixar de se manifestar na presente fase processual, com a devida vênia do Douto Promotor de Justiça e a despeito de sua postura afigurar-se devidamente motivada; explica-se.

Parece-nos, de fato, que a melhor exegese relativamente à colheita da prova durante o judicium accusationis é a sustentada pelo Membro do Parquet, no sentido de que a norma geral do art. 405, §2.º, do CPP não se aplica ao rito especial de apuração dos delitos dolosos contra a vida.

Isto porque, como bem destacou o Ilustre Representante Ministerial oficiante, tem o procedimento do Júri suas peculiaridades e, a prevalecer a determinação judicial, aos jurados seria obstada a análise dos depoimentos reunidos na primeira fase do processo.

De acrescentar-se, na esteira desta argumentação, que o juiz leigo tem contato com o conteúdo anterior ao julgamento por meio da leitura dos registros colhidos. É o que se conclui mediante a interpretação sistemática dos arts. 472, parágrafo único, 480, caput e §§ 2.º e 3.º, todos do CPP.

Registre-se, ainda, o teor do art. 475, parágrafo único, do CPP, o qual dispõe que a prova produzida em Plenário deverá ser transcrita para constar dos autos, bem revelando o espírito que norteou a Lei n. 11.689/08 que, por se cuidar de norma inserida no contexto do Tribunal do Júri, há de nortear o correto encaminhamento do tema.

Razoável sustentar-se, desta feita, a necessidade de degravação das declarações coligidas.

Ocorre, todavia, que não cabe à Procuradoria-Geral de Justiça ditar as regras procedimentais que devem presidir o andamento da ação penal. Cumpre-lhe, na verdade, verificar tão somente a postura ministerial consistente na falta de apresentação de manifestação indispensável ao seguimento da causa.

Sob essa ótica, afigura-se-nos impossível respaldar a, repise-se, devidamente justificada postura de fls. 333/335; isto porque, a prevalecer a negativa ministerial, secundada que fosse por esta Chefia Institucional, criar-se-ia insolúvel impasse, com evidente prejuízo à administração da Justiça, à apuração da verdade, à responsabilização dos culpados e, em última análise, à sociedade que o Ministério Público representa.

O oferecimento dos memoriais, destarte, é medida que se impõe.

Isto não quer dizer que a discussão processual haurida no caso encontrar-se-á preclusa. Pelo contrário, parece-nos que deva persistir, inclusive, se assim entender o promotor natural, com a interposição dos meios de impugnação cabíveis para que a transcrição pretendida, fundamental não só para a acusação senão também para a defesa, se viabilize.

Em face do exposto, conhece-se da presente remessa para, sem desautorizar a fundamentação contida no pleito ministerial, designar outro promotor de justiça para oficiar no caso, apresentando as alegações finais escritas, cumprindo-lhe prosseguir na causa até final conclusão, sem prejuízo de, caso assim entenda, interpor medidas jurisdicionais adequadas, perante a Superior Instância, com o fim de ver a pretensão de transcrição dos depoimentos acolhida até a realização do Plenário.

Cumpra-se. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 12 de abril de 2012.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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