Código de Processo Penal, art. 28
Protocolado n.º 65.878/09
Inquérito
Policial n.º 032.01.2008.024730-0 – MM. Juízo da 2ª Vara Criminal da Comarca de
Araçatuba
Indiciado: (...)
Assunto: revisão
de promoção de arquivamento
EMENTA: CPP, ART. 28. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. CTB, ART. 306 (COM REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.705/08). NÍVEL DE DOSAGEM ALCOÓLICA ATESTADO POR ETILÔMETRO (“BAFÔMETRO”). VALIDADE DA PROVA. CRIME DE PERIGO ABSTRATO.
1. O nível de dosagem alcoólica, que constitui requisito típico, pode ser comprovado por qualquer meio em direito admitido, desde que se possa determinar cientificamente a alcoolemia.
2. O etilômetro (“teste do bafômetro”) consubstancia mecanismo válido para tal fim, conforme reiterado entendimento jurisprudencial.
3. O delito em questão configura crime de perigo abstrato e sua descrição legal não atenta contra princípios constitucionais, até porque é científica e estatisticamente comprovado que a condução de veículo automotor por quem ingeriu álcool ou substâncias psicoativas em determinado patamar põe em risco a incolumidade física e a vida de terceiros, dada a diminuição dos reflexos, da percepção sensorial e motora, entre outros.
Solução: designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.
Cuida-se de inquérito policial instaurado a partir de auto de prisão em flagrante, visando à apuração da conduta de (...), que, em tese, teria praticado o delito de embriaguez ao volante (CTB, art. 306).
O Douto Promotor de Justiça oficiante pugnou pelo arquivamento do feito, aduzindo que não se demonstrou que o indiciado dirigia, por ocasião dos fatos, de forma anormal, e que a prova colhida por meio do etilômetro não se mostrava idônea à comprovação do requisito típico (fls. 39/45).
O MM. Juiz, de sua parte, nos termos do art. 28 do CPP, remeteu os autos a esta Procuradoria Geral de Justiça, diante da controvérsia existente acerca da questão em tela (fls. 46).
É o relatório.
Dos
fatos
Consta do feito que, no dia
O automóvel era conduzido pelo investigado, tendo como passageiro (...). Em contato com (...), os milicianos constataram que aparentava estar sob influência de bebida alcoólica, visto que falava e andava com dificuldade.
Foi submetido, então, ao teste do bafômetro, com resultado positivo de 1mg/L (um miligrama de álcool por litro de sangue) (fls. 07).
Os depoimentos dos policiais encontram-se a fls. 10 e 12/13 e do agente a fls. 15.
Alegou este que por ocasião dos fatos estaria se sentindo bem, e apenas ingerira bebida alcoólica na noite anterior. Acrescentou, entretanto, que não era a primeira vez que era preso pelo mesmo motivo.
Da
natureza jurídica do crime de embriaguez ao volante
O tipo penal infringindo, antes da modificação trazida pela Lei n. 11.705/08, exigia expressamente que o agente conduzisse veículo “sob influência” de álcool ou substância análoga. Cuidava-se, portanto, de crime de perigo concreto. Com a alteração recentemente introduzida, o legislador retirou o requisito mencionado, transformando-o em crime de perigo abstrato.
Nada há de inconstitucional na construção típica em apreço, em que pese as opiniões contrárias de renomados juristas.
É preciso ponderar, na esteira dos ensinamentos de Fernando Capez, que são válidos e constitucionais os delitos de perigo presumido. Com efeito, pondera o autor que:
“...subsiste a possibilidade de tipificação dos crimes de perigo abstrato em nosso ordenamento legal, como legítima estratégia de defesa do bem jurídico contra agressões em seu estágio ainda embrionário, reprimindo-se a conduta, antes que ela venha a produzir um perigo concreto ou um dano efetivo. Trata-se de cautela reveladora de zelo do Estado em proteger adequadamente certos interesses. Eventuais excessos podem, no entanto, ser corrigidos pela aplicação do princípio da proporcionalidade” (Curso de direito penal, vol. 1, 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 2002, p. 25).
Tendo
em vista cuidar-se de delito de perigo presumido, torna-se despicienda a
comprovação de que houve conduta anormal.
Não
é menos relevante anotar que, cientifica e estatisticamente, já se demonstrou
que o fato de o motorista encontrar-se com determinado nível de álcool (ou
substância psicoativa) em seu sangue reduz consideravelmente seus reflexos e
percepção, provocando risco efetivo a ele próprio e a todos os demais que se
encontram ao seu redor.
Bem
por isso, não se admite como válido o argumento de que há violação ao princípio
da ofensividade, na medida em que a conduta não produziria, de per si, riscos
aos valores maiores (vida e integridade corporal) salvaguardados por nossa
Constituição.
Da
validade da prova obtida por meio do etilômetro
Não convence, com a devida vênia do mui competente colega, que a prova obtida por meio do etilômetro não merece valia.
Cuida-se de meio técnico hábil a determinar a alcoolemia, notadamente com vistas ao enquadramento do fato ao tipo penal insculpido no art. 306 do CTB.
Nesse sentido, inclusive, têm se manifestado nossos tribunais:
“APELAÇÃO CRIMINAL. CÓDIGO DE
TRÂNSITO BRASILEIRO. EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA APLICADA PELO
JUÍZO DE PRIMEIRO GRAU
(TJRS, Apel. Crim. N. 7002.8349470,
rel. Des. MARTINEZ LUCAS, 1ª Câm. Crim., julgado em
“APELAÇÃO-CRIME. DESOBEDIÊNCIA. NÃO DEMONSTRADA. EMBRIAGUEZ AO
VOLANTE. ABSOLVIÇÃO INCABÍVEL. MANTIDA CONDENAÇÃO. 1- Imprescindível para a
configuração do delito do artigo 330 que o agente tenha consciência da ordem
legal e a desobedeça. No caso, duvidoso tivesse percebido se tratava da
polícia. 2- Quem dirige na contra-mão de direção, é abordado, submetido ao
teste do bafômetro que acusa 0,81mg/l, expondo a perigo potencial a incolumidade
de terceiros, os próprios policiais, comete o delito do artigo 306. PARCIAL
PROVIMENTO” (TJRS, Apel. Crime nº
“CRIMES DOLOSOS E CULPOSOS CONTRA A PESSOA.
EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (ARTIGO 306, DA LEI Nº 9.503/97). Trata-se de crime de
embriaguez ao volante, tipificado no artigo 306, da Lei nº 9.503/97, que
recentemente teve sua redação alterada pela Lei nº 11.705, de
“APELAÇÃO-CRIME. EMBRIAGUEZ AO
VOLANTE. A materialidade delitiva restou comprovada pelo boletim de ocorrência,
pelo teste de bafômetro e pela prova oral. A autoria também é certa e mesmo
ante a ausência do acusado para ser interrogado, veio comprovada diante da
prova oral colhida. Apenamento - adequação, levando em conta a análise das
operadoras do artigo 59 do Código Penal. Apelo improvido”. (TJRS, Apel. Crime nº
Na hipótese dos autos, a prova técnica atestou que o indiciado encontrava-se com o equivalente a 1mg/L (miligrama de álcool por litro de sangue); vide fls. 07.
Merece referência, ainda, o depoimento dos milicianos, os quais não deixaram dúvidas quanto aos sinais exteriores de embriaguez (fls. 10 e 12) e o documento de fls. 21, o qual atesta já ter sido o agente surpreendido dirigindo embriagado.
Conclusão
Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da causa.
Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato
Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de
Expeça-se portaria designando o substituto automático. Publique-se a ementa.
São Paulo,
Fernando Grella Vieira
Procurador-Geral de Justiça
/aeal