Código de Processo Penal, ARt. 28

 

Protocolado n.º 66.257/09

Inquérito Policial n. 424.01.2008.001836-0 – MM. Juízo da Vara do Foro Distrital de Pariquera Açu

Investigado: (...)

Assunto: proposta de transação penal

 

 

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENORES DE IDADE. CONTRAVENÇÃO PENAL. TRANSAÇÃO PENAL. CABIMENTO.

1.      A venda de bebidas alcoólicas a menor de 18 anos não se subsume ao tipo insculpido no art. 243 do ECA (Lei n. 8.069/90).

2.      O fato constitui contravenção penal (art. 63 da Lei de Contravenções Penais), motivo por que admite, em tese, a transação penal.

Solução: designo outro promotor de justiça para oficiar nos autos e propor ao agente a medida despenalizadora.

 

 

Cuida-se de inquérito policial instaurado para apurar a venda de cerveja a adolescente.

O feito foi distribuído ao Juízo Comum, tendo a mui competente Promotora de Justiça requerido sua remessa ao Juizado Especial Criminal (fls. 37/38).

O Ilustre Membro do Parquet a quem os autos foram encaminhados, todavia, entendeu que não se tratava de infração de menor potencial ofensivo e ofereceu denúncia em face do suspeito.

O MM. Juiz, de sua parte, deixou de receber a exordial e designou audiência preliminar, tendo o Douto Promotor oficiante discordado quanto ao cabimento da transação penal (fls. 68).

Aplicou-se, então, o art. 28 do CPP (fls. 70).

É o relatório.

Na hipótese dos autos, (...) forneceu a um adolescente uma garrafa de cerveja, sem indagar-lhe sobre a idade ou solicitar-lhe documentos.

Uma integrante do Conselho Tutelar, acompanhada de policiais militares, surpreendeu o menor ingerindo a bebida no estabelecimento empresarial do autor e o encaminhou ao Distrito Policial.

Não há falar-se, no caso em tela, no crime tipificado no art. 243 do ECA, com a devida vênia do combativo Representante Ministerial.

O mencionado ilícito dá-se quando o sujeito: “Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida”. Não se incluem na disposição bebidas alcoólicas.

Tal conclusão é obtida, como bem ponderou a i. Promotora de Justiça, com apoio no autorizado escólio de GARRIDO e CURY, mediante interpretação sistemática do Estatuto. Isto porque, no art. 81, constam destacadamente dentre os objetos cuja venda é proibida a crianças e adolescentes, “bebidas alcoólicas” (inciso II) e “produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida” (inciso III).

Não há dúvida que, do ponto de vista objetivo, a substância cuja venda foi efetuada pode causar dependência.

Ocorre, todavia, que o elemento típico inserido no art. 243 do ECA não tem caráter objetivo, mas normativo. Significa que seu alcance deve ser obtido por meio da interpretação do texto legal, com apoio no conceito legal de produtos cujos componentes sejam potenciais provocadores de dependência física ou psíquica.

A conduta do sujeito, destarte, não consubstancia o crime em questão. Pode ser enquadrada, entretanto, na contravenção penal do art. 63, inc. I, do Decreto-lei n. 3.688, de 1941 (“Servir bebidas alcoólicas: I – a menor de dezoito anos”).

            Nesse sentido, inclusive, já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

HABEAS CORPUS. PENAL. VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR DE 18 ANOS. CONDUTA QUE CARACTERIZA CONTRAVENÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

DESCUMPRIMENTO DE ALVARÁ JUDICIAL. INGRESSO E PERMANÊNCIA DE MENORES EM CASA DE ESPETÁCULOS. PREVISÃO DE SANÇÃO ADMINISTRATIVA EM LEI ESPECÍFICA. FATO ATÍPICO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

1. O trancamento da ação penal por esta via justifica-se somente quando verificadas, de plano, a atipicidade da conduta, a extinção da punibilidade ou a ausência de indícios de autoria e prova da materialidade, o que não se vislumbra na hipótese dos autos. Precedentes.

2. Não há falar em trancamento da ação penal iniciada por denúncia que satisfaz todos os requisitos do art. 41 do CPP, sendo mister a elucidação dos fatos que em tese caracterizam a contravenção penal prevista no art. 63 do Decreto Lei 3.688/41, à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.

3. Não caracteriza crime de desobediência (art. 330 do Código Penal) o descumprimento de determinação constante em alvará judicial que regula o ingresso e a permanência de menores em casa de espetáculos se, para tal descumprimento, há previsão de sanção de natureza administrativa no próprio Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo o fato atípico. Precedentes.

4. Ordem parcialmente concedida apenas para determinar o trancamento da ação penal quanto ao crime previsto no art. 330 do Código Penal.”

 (STJ, RHC 19661, rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ de 18/09/2006, p. 339).

 

Mostra-se cabível, destarte, a transação penal.

Diante do exposto, designo outro promotor de justiça para avaliar o preenchimento dos requisitos subjetivos à medida despenalizadora, formulando a proposta de acordo com a prática adotada na Comarca.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria.

 

São Paulo, 05 de junho de 2009.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

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