Código de Processo Penal, art. 28

 

Protocolado n.º 7.892/10

Autos n.º 050.09.100013-0 – MM. Juízo do DIPO 4 (Comarca da Capital)

Investigados: Representantes da empresa “CENTRO AUTOMOTIVO REAL CELEBRETY LTDA.”

Assunto: revisão de promoção de arquivamento

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. LEI N. 8.137/90, ART. 1º.  INADMISSIBILIDADE. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.

1.      Há muito se discute a incidência do princípio da insignificância aos delitos contra a ordem tributária, o que resultaria na atipicidade material da indevida redução ou supressão de valor devido a título de obrigação pecuniária da mencionada natureza.

2.      As infrações penais tributárias enfeixam o chamado Direito Penal Secundário e, como tal, não podem ser alheias aos princípios norteadores do Direito Penal, embora fiquem sujeitas a características especiais decorrentes de sua natureza pluriofensiva. Assim, por exemplo, no tocante à consumação do ilícito, a qual somente se produz com a inscrição definitiva do débito na dívida ativa, daí fluindo o prazo da prescrição da pretensão punitiva (vide STF, HC n. 85.051; STJ, RHC n. 25.393, DJe de 22/06/2009; Protocolado n. 128.755/09 – PGJ – CPP, art. 28).

3.      Nossos tribunais superiores, com referência ao assunto debatido nos autos, vêm revendo posturas excessivamente liberais antes adotadas, como se nota no julgado cuja ementa abaixo se transcreve, proferido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em maio de 2009: “EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PENAL. CRIME DE DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. VALOR SUPERIOR ÀQUELE PREVISTO NO  ART. 18, § 1.º, DA LEI N.º 10.522/2002. 1. Hipótese em que foram apreendidas ao entrarem ilegalmente no país 644 (seiscentos e quarenta e quatro) pacotes de cigarro de diversas marcas e 12 (doze) litros de wisky (sic), todas mercadorias provenientes do Paraguai, avaliadas à época em R$ 6.920,00 (seis mil novecentos e vinte reais). Impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância. 2. Não é possível utilizar o art. 20 da Lei n.º 10.522/02 como parâmetro para aplicar o princípio da insignificância, já que o mencionado dispositivo se refere ao ajuizamento de ação de execução ou arquivamento sem baixa na distribuição, e não de causa de extinção de crédito. 3. O melhor parâmetro para afastar a relevância penal da conduta é justamente aquele utilizado pela Administração Fazendária para extinguir o débito fiscal, consoante dispõe o art. 18, § 1.º, da Lei n.º 10.522/2002, que determina o cancelamento da dívida tributária igual ou inferior a R$ 100,00 (cem reais). 4. Há de se ressaltar que, no caso, existe controvérsia sobre o montante da dívida tributária, que pode até ser maior do que R$ 10.000,00, além de se tratar a denunciada de pessoa que ostenta outras duas condenações por crimes da mesma espécie, revelando, em princípio, reiteração criminosa. 5. Embargos de divergência acolhidos para, cassando o acórdão embargado, negar provimento ao recurso especial” (E.R.Esp. n. 966.077, rel. Ministra  LAURITA VAZ, 3ª Seção, DJe de 20/08/2009).

 

Conclusão: diante do exposto, designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

O presente feito originou-se a partir do ofício nº DRTC-III nº 329/2009 “R”, encaminhado pela Delegacia Regional Tributária de São Paulo, noticiando a inobservância, em tese, aos arts. 413/A, I, 494 e 251, § 4º, do Decreto n. 45.490/00 (RICMS), por parte da pessoa jurídica denominada “CENTRO AUTOMOTIVO REAL CELEBRETY LTDA.”, a ensejar, a partir daí, a prática de crime contra a ordem tributária.

O Ilustre Promotor de Justiça oficiante pugnou pelo arquivamento dos autos, diante do valor insignificante do tributo reclamado, já que o valor da multa atribuída aos indiciados no Auto de Infração constituiria sanção tributária, não compondo o elemento essencial do tipo previsto no art. 1º da Lei n. 8.137/90 (fls. 89/90).

A MM. Juíza, discordando da incidência à hipótese do princípio da insignificância, encaminhou o expediente a esta Procuradoria Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 92/93).

É o relatório.

Consta do presente feito que, na data de 30 de junho de 2008, foi lavrado o AIIM nº 3.082.348-1 (fl. 5), contra a pessoa jurídica acima citada, por manter em estoque combustível não originado de fonte regular de produção ou importação, não submetido anteriormente a nenhuma tributação; por deixar de exibir notas fiscais requeridas pela autoridade, e, também, não ter comunicado à repartição fiscal a que está vinculado o “Pedido de Cessação de Uso de Equipamento Emissor de Cupom Fiscal”, referente ao equipamento marca Yanco, modelo 6000 Plus, classe ECF-MR, nº de fabricação 00509450.

O ICMS devido foi fixado em R$ 1.710,26 (um mil, setecentos e dez reais e vinte e seis centavos), sendo-lhe imposta multa.

Regularmente notificado, o contribuinte não apresentou defesa, correndo à sua revelia o julgamento perante a Delegacia Tributária, que proferiu a decisão constante a fls. 54/60, contra a qual não houve recurso.

Foi, portanto, determinada a inscrição do montante em Dívida Ativa (fls. 80).

Pois bem.

As infrações penais tributárias enfeixam o chamado Direito Penal Secundário e, como tal, não podem ser alheias aos princípios norteadores do Direito Penal, embora fiquem sujeitas a características especiais decorrentes de sua natureza pluriofensiva. Assim, por exemplo, no tocante à consumação do ilícito, a qual somente se produz com a inscrição definitiva do débito na dívida ativa, daí fluindo o prazo da prescrição da pretensão punitiva (vide STF, HC n. 85.051; STJ, RHC n. 25.393, DJe de 22/06/2009; Protocolado n. 128.755/09 – PGJ – CPP, art. 28).

 

Nossos tribunais superiores, com referência ao assunto debatido nos autos, vêm revendo posturas excessivamente liberais antes adotadas, como se nota no julgado cuja ementa abaixo se transcreve, proferido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em maio de 2009:

 

 

“EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. PENAL. CRIME DE DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE. VALOR SUPERIOR ÀQUELE PREVISTO NO ART. 18, § 1.º, DA LEI N.º 10.522/2002. 1. Hipótese em que foram apreendidas ao entrarem ilegalmente no país 644 (seiscentos e quarenta e quatro) pacotes de cigarro de diversas marcas e 12 (doze) litros de wisky, todas mercadorias provenientes do Paraguai, avaliadas à época em R$ 6.920,00 (seis mil novecentos e vinte reais). Impossibilidade de aplicação do princípio da insignificância. 2. Não é possível utilizar o art. 20 da Lei n.º 10.522/02 como parâmetro para aplicar o princípio da insignificância, já que o mencionado dispositivo se refere ao ajuizamento de ação de execução ou arquivamento sem baixa na distribuição, e não de causa de extinção de crédito. 3. O melhor parâmetro para afastar a relevância penal da conduta é justamente aquele utilizado pela Administração Fazendária para extinguir o débito fiscal, consoante dispõe o art. 18, § 1.º, da Lei n.º 10.522/2002, que determina o cancelamento da dívida tributária igual ou inferior a R$ 100,00 (cem reais). 4. Há de se ressaltar que, no caso, existe controvérsia sobre o montante da dívida tributária, que pode até ser maior do que R$ 10.000,00, além de se tratar a denunciada de pessoa que ostenta outras duas condenações por crimes da mesma espécie, revelando, em princípio, reiteração criminosa. 5. Embargos de divergência acolhidos para, cassando o acórdão embargado, negar provimento ao recurso especial” (E.R.Esp. n. 966.077, rel. Ministra  LAURITA VAZ, 3ª Seção, DJe de 20/08/2009).

Nossos pretórios, desta feita, redimensionaram a esfera de atipicidade da conduta, adotando como parâmetro em tais casos o valor de R$ 100,00 (cem reais), consoante o disposto no art. 18, 1º, da Lei n. 10.522/02, relativo ao cancelamento de dívidas tributárias.

Relevante, outrossim, analisarmos a postura da Augusta Corte Bandeirante no tratamento da matéria. A respeito, há diversos julgados recentes do Colendo Tribunal de Justiça de São Paulo afastando a aplicação do princípio em casos semelhantes ao presente, como se nota no julgamento das apelações criminais de número 990.08.073732-5 (1ª Câmara de Direito Criminal), 993.07.104907-7 (2ª Câmara de Direito Criminal), 993.06.066251-1 (10ª Câmara de Direito Criminal) e HC 01073346.3 (9ª Câmara de Direito Criminal).

Em face do exposto, reconhece este Órgão que o arquivamento não pode prosperar. Designo, portanto, outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir nos ulteriores termos da ação penal, cumprindo-lhe, na condição de longa manus do Procurador-Geral de Justiça, interpor o recurso cabível caso a peça inaugural seja rejeitada pelos mesmos fundamentos rechaçados nesta manifestação. Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria.

São Paulo, 19 de janeiro de 2010.

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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