Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 78.983/14

Processo n.º 177/13 – MM. Juízo da Vara Judicial da Comarca de Monte Aprazível

Réu: (...)

Assunto: revisão da recusa ministerial quanto à proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95)

 

 

EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI N. 9.099/95). FUGA DE LOCAL DE ACIDENTE E EMBRIAGUEZ AO VOLANTE (CTB, ARTS. 305 E 306). AGENTE QUE, COM ELEVADO TEOR DE ÁLCOOL NO SANGUE, IMPRIME MARCHA A RÉ, ABALROANDO O AUTOMÓVEL DA VÍTIMA, E SE EVADE, TRANSITANDO DE FORMA A COLOCAR TRANSEUNTES EM SITUAÇÃO DE RISCO. ACENTUADA CULPABILIDADE. DESCABIMENTO DA MEDIDA.

1.      O art. 129, inc. I, da CF, atribui ao Ministério Público a titularidade exclusiva da ação penal pública. Deveras, tratando-se do dominus litis, ao Parquet incumbe aferir o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n. 9.099/95, notadamente da suspensão condicional do processo. Nesse sentido, a Súmula 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

2.      A admissibilidade do sursis processual não se prende, exclusivamente, a requisitos de ordem objetiva. Além disso, como expressamente dispõe a Lei, é necessário que a “culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício”.

3.      No caso dos autos, o grau de reprovabilidade do comportamento do réu mostrou-se acentuado, porquanto conduzia veículo automotor em acentuado estado de embriaguez (dois gramas de álcool por litro de sangue), teor mais de três vezes superior ao permitido em Lei.

4.      Ademais, ao buscar se evadir após o embate, transitou na via pública de forma a colocar transeuntes em risco.

Decisão: deixa-se de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insiste-se na postura já adotada pelo Ministério Público.

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...) imputando-lhe os crimes tipificados nos arts. 305 e 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

De acordo com a denúncia, amparada nos elementos informativos acostados ao inquérito policial, o acusado conduzia veículo em estado de ebriedade, pericialmente constatado (fl. 21), abalroando o automóvel dirigido por (...), e, em seguida, evadiu-se do local para se furtar à responsabilidade civil e criminal.

Ao cabo da instrução processual, o Digníssimo Magistrado entendeu por bem reconhecer a inconstitucionalidade do art. 305 do CTB, louvando-se em decisão proferida pelo Colendo Órgão Especial do Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo.

Com relação à infração remanescente, reconhecendo sua prática, verificou cabível a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n.º 9.099/95) e determinou ao Ilustre Promotor de Justiça que se manifestasse a respeito.

Havendo a negativa ministerial em outorgar o benefício, pautada na gravidade da conduta do agente (fls. 06/07), ordenou-se o encaminhamento do expediente a esta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fl. 05).

Eis a síntese do necessário.

Pondere-se, de início, que o art. 129, inc. I, da CF, atribui ao Ministério Público a titularidade exclusiva da ação penal pública, motivo por que, tratando-se do dominus litis, aos Membros da Instituição incumbe verificar o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n. 9.099/95, seja a transação penal ou a suspensão condicional do processo.

Nestes termos, a Súmula 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal e a jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça, o qual proclama cuidar-se a formulação da proposta de verdadeira prerrogativa funcional do Parquet (STJ, HC n. 150.416, rel. Ministro Gilson Dipp, 5.ª Turma, DJe de 18/10/2010).

Cumpre, destarte, aferir o cabimento do benefício pleiteado.

Pois bem.

Com o máximo respeito que se pode tributar ao Insigne Julgador, o beneplácito excogitado, que não é direito subjetivo público do acusado, mas prerrogativa institucional do Ministério Público, não se mostra cabível.

Há de prevalecer, deveras, o óbice levantado pelo Douto Promotor de Justiça a fls. 06/07.

Acentue-se, em primeiro lugar, que a multiplicidade de imputações contidas na exordial figura como obstáculo intransponível à formulação da proposta.

É bem verdade que a Augusta Corte Paulista declarou incompatível com a Constituição Federal o delito capitulado no art. 305 do CTB. De ver, contudo, que se cuida de decisão proferida em sede de controle difuso de constitucionalidade, operando, desta forma, eficácia meramente inter partes.

De qualquer modo, ainda que superado esse impedimento, a medida despenalizadora remanesceria inadequada.

É importante destacar que a suspensão condicional do processo não se sujeita, somente, à verificação de requisitos objetivos, como o revela o art. 89, caput, da Lei dos Juizados Especiais Criminais, ao fazer expressa remissão ao art. 77 do CP.

Com efeito, a formulação de proposta de sursis processual requer se examine a culpabilidade, os antecedentes, a personalidade, a conduta social, os motivos e as circunstâncias do crime.

A culpabilidade deve ser entendida como gravidade concreta do comportamento ou, ainda, como o grau de censurabilidade da conduta.

No caso concreto, o grau de reprovabilidade do ato cometido revela o despropósito da formulação da proposta.

Isto porque restou demonstrado nos autos que o réu conduzia veículo automotor em acentuado estado de embriaguez e, buscando evadir-se do local do embate, transitou na via pública de maneira a colocar transeuntes em risco.

A vítima, outrossim, em Juízo, afirmou que gritou às pessoas que passavam pela rua para se afastarem, e também para o sujeito, objetivando que parasse, mas ele não o fez.

O policial militar (...), por sua vez, além de perceber em (...) sinais de ebriedade, aduziu ter ele asseverado que não colidira com nenhum carro (mídia de fl. 12).

O exame levado a efeito, deveras, constatou a concentração de 2,0 g/L (dois gramas de álcool por litro de sangue), teor mais de três vezes superior ao permitido em Lei.

Tal contexto revela que a aplicação da medida despenalizadora não atenderá aos postulados da prevenção e retribuição pelo ilícito ocorrido.

Diante do exposto, deixa-se de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insiste-se na postura já adotada pelo Ministério Público.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 02 de junho de 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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