Código de Processo Penal, art. 28

Protocolado n.º 85.237/14

Autos n.º 6.677/12 – MM. Juízo do DIPO 3 (Comarca da Capital)

Indiciado: (...)

Assunto: análise de promoção de arquivamento do inquérito policial

 

EMENTA: CPP, ART. 28. FURTO (CP, ART. 155, CAPUT). FUNCIONÁRIO DE ESTACIONAMENTO QUE SE APODERA DE VEÍCULO DE CLIENTE, SEM AUTORIZAÇÃO, SENDO SURPREENDIDO POR POLICIAIS COM O BEM. AUTOMÓVEL DANIFICADO. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO FUNDADO NA SUPOSTA ATIPICIDADE, POR SE TRATAR DE “FURTO DE USO”. REQUISITOS NECESSÁRIOS À CONFIGURAÇÃO DO INSTITUTO AUSENTES, POIS O OBJETO NÃO FOI DEVOLVIDO VOLUNTARIAMENTE, MAS APREENDIDO POR AGENTES PÚBLICOS, E SE ENCONTRAVA COM DANOS MATERIAIS. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA QUE SE IMPÕE.

1.     O indiciado, funcionário do estacionamento onde a ofendida deixava seu veículo, saiu com o automóvel na companhia de terceiro, sem autorização da proprietária. Algum tempo depois, policiais militares o avistaram em atitude que reputaram suspeita, abordando-o. Os servidores constataram que o espelho retrovisor e a tampa plástica de proteção da parte elétrica se encontravam danificados.

2.     O tipo penal previsto no art. 155 do CP pressupõe, além do dolo, consistente na vontade e consciência de subtrair a res, o elemento subjetivo específico, decorrente das elementares “para si ou para outrem”. Ausente o ânimo de assenhoreamento definitivo, desconfigura-se o crime, verificando-se, no lugar, o chamado “furto de uso” – fato penalmente atípico na legislação penal comum.

3.     Tal comportamento, todavia, requer seja a utilização momentânea e resulte na devolução voluntária do bem, com seu status quo ante preservado.

4.     Na hipótese concreta, o automóvel foi apreendido pela Polícia em poder do agente, antes da necessária e voluntária restituição.

5.     Ademais disso, encontrava-se danificado, porquanto o espelho retrovisor e a tampa plástica foram destruídos pelo indiciado.

Solução: designa-se outro promotor de justiça para apresentar a peça acusatória, devendo prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

 

 

Cuida-se de investigação penal instaurada a partir da lavratura de auto de prisão em flagrante, visando à apuração da suposta prática do crime de furto qualificado (CP, art. 155, §4.º, II) cometido, em tese, por (...).

Encerradas as providências inquisitivas, o Douto Promotor de Justiça ponderou que não houve dolo do autor em subtrair o patrimônio alheio, considerando o fato atípico.

Com relação à avaria no espelho retrovisor interno do veículo, tratar-se-ia de dano de caráter ínfimo, não tendo o condão de subsumir a conduta do suspeito ao delito de furto, e, se interessasse à vítima, poderia ela valer-se da esfera cível para a reparação de eventual prejuízo.

Postulou, em consequência, o arquivamento do caso (fls. 59/62).

O MM. Juiz, entretanto, discordou de tal solução, pois, em sua ótica, o furto de uso somente se revelaria cabível quando a utilização fosse momentânea e a coisa restituída da mesma forma como retirada, não sendo o caso dos autos. Assim, determinou o envio da questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fl. 63).

Eis a síntese do necessário.

A razão se encontra com o Digníssimo Julgador, com a máxima vênia do Ínclito Membro Ministerial; senão, vejamos.

 

Dos fatos

Consta do feito, resumidamente, que, no dia 27 de outubro de 2012, (...), funcionário do estacionamento onde (...) deixava seu veículo, saiu com o automóvel na companhia de (...), sem autorização da proprietária.

Em seguida, policiais militares o avistaram em atitude que reputaram suspeita, abordando-o.

Os servidores constataram que o espelho retrovisor e a tampa plástica de proteção da parte elétrica se encontravam danificados.

O passageiro, por sua vez, apresentava sinais de embriaguez, dificultando a ação dos agentes públicos, mostrando-se necessário o uso de algemas. Durante o trajeto até a Delegacia, ele abriu a viatura, caindo ao solo e lesionando o rosto (fls. 03 e 05).

Em suas declarações, (...) confirmou parcialmente tal dinâmica, nada dizendo sobre a queda (fl. 06).

(...) admitiu ter retirado o objeto da vítima do estacionamento para encher os pneus, asseverando que o espelho se desprendeu depois que passou por um buraco. Alegou, por fim, estar arrependido de seu ato (fl. 08).

Pois bem.

 

Da tipicidade do ato

De fato, o tipo penal previsto no art. 155 do CP pressupõe, além do dolo, consistente na vontade e consciência de subtrair a res, o elemento subjetivo específico, decorrente das elementares “para si ou para outrem”.

Ausente o ânimo de assenhoreamento definitivo, desconfigura-se o crime, verificando-se, no lugar, o chamado “furto de uso”. Tal comportamento, todavia, requer seja a utilização momentânea e resulte na devolução voluntária do bem, com seu status quo preservado.

Na hipótese concreta, o automóvel foi apreendido pela Polícia em poder do agente, antes da necessária e voluntária restituição.

Ademais disso, encontrava-se danificado, porquanto o espelho retrovisor fora destruído pelo indiciado.

 

Solução

Diante do exposto, designa-se outro promotor de justiça para apresentar a peça acusatória, devendo prosseguir nos ulteriores termos da ação penal.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

 

             São Paulo, 13 de junho de 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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