Protocolado nº 87.280/08- art. 28 do CPP

Inquérito policial nº 050.08.050982-7 – MM. Juízo do DIPO 3

Investigado: (...)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

                                     O presente inquérito policial foi instaurado porque (...) (interrogado a fls. 07) praticou, em tese, crime de furto tentado (CP, art. 155, caput, c.c. art. 14, inc. II).

 

                            Pelo que consta dos autos, no dia 03 de julho p. passado, no interior do estabelecimento empresarial denominado “Extra Hipermercado”, situado na Av. Brigadeiro Luis Antônio, n. 2.013, bairro Bela Vista, nesta Capital, o agente, subtraiu, para si, 41 (quarenta e uma) barras de chocolate, avaliadas em R$ 167,59 (cento e sessenta e sete reais e cinqüenta e nove centavos) (auto de avaliação de fls. 12).

 

                                     Ao término das investigações, o d. Promotor de Justiça requereu o arquivamento dos autos, baseando-se na atipicidade da conduta, por entender presente a figura do art. 17 do CP e no princípio da insignificância (fls. 35/37).

 

                                     A MM. Juíza, discordando do pedido, remeteu os autos a esta Procuradoria-Geral de Justiça, aplicando o disposto no art. 28 do CPP (fls. 39/40).

 

                                     É o relatório.

 

                                      A tese abraçada pelo competente Promotor de Justiça, com a devida vênia, não pode ser aceita, em que pese suas bem lançadas razões.

 

                            Os objetos cuja subtração o agente tentou lograr foram avaliados em R$ 167,59 (cento e sessenta e sete reais e cinqüenta e nove centavos) (auto de fls. 12). Reconhece-se que tal valor não é expressivo, mas daí a dizê-lo insignificante, não nos parece correto.

 

                                      É importante verificar, ainda, que as testemunhas ouvidas apontaram o agente como o autor da subtração, sendo com ele encontrada a res furtivae. Os seguranças, com efeito, o abordaram no estacionamento do estabelecimento empresarial e localizaram quarenta e uma barras de chocolate no interior de sua bolsa.

 

                                     De notar-se, ainda, que o indiciado possui antecedentes criminais, notadamente por delito contra o patrimônio (fls. 20/26).

 

                                      A se aplicar o princípio da insignificância, resultando na atipicidade material da conduta, estar-se-ia dando ao agente salvo conduto para subtrair, diariamente, objetos de pouco valor econômico em prejuízo da vítima. Em outras palavras, estar-se-ia estimulando o cometimento de furtos de objetos de pequeno valor.

 

                                      De ver-se, ademais, que a jurisprudência não admite beneficiar com tal princípio agentes que reiteram na prática de crimes patrimoniais (caso dos autos). Vide STJ, R.Esp. n. 960.066, rel. Min. FÉLIX FISCHER, DJU de 14.04.2008,  pág. 01.

 

                                      Pode ser que a conduta atribuída ao indiciado seja considerada, oportunamente, como furto privilegiado (art. 155, §2º, do CP), mas não como fato atípico.

                                       

                                     Não há que se falar, portanto, em insignificância no caso sub examen.

 

                                      Com respeito ao outro argumento ventilado pelo i. Promotor de Justiça, qual seja, a de que o fato não constitui delito por força do disposto no art. 17 do CP, novamente parece-nos que não lhe assiste razão.

 

                                      O fato de que representantes da vítima não deixaram, em momento algum, de exercer vigilância sobre o patrimônio não torna atípica a conduta de quem tenta subtrair o bem.

 

                            Com efeito, o crime impossível pressupõe absolta ineficácia do meio executório ou impropriedade do objeto material do crime.

 

                            No presente caso, o objeto material era idôneo e o meio executório, eficaz. O crime não se consumou somente porque um dos vigilantes suspeitou da atitude do indiciado, acionando seguranças, que intercederam e constataram o delito.

 

                            Não há como se vislumbrar o argumento de que é impossível a consumação do fato. São incontáveis os casos que, em circunstâncias semelhantes, resultam na subtração efetiva dos bens.

 

                            Tal tese tem sido contundentemente repelida por nossos tribunais. Nesse sentido:

 

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. 
1. CRIME IMPOSSÍVEL. CONDUTA PRATICADA SOB VIGILÂNCIA. TENTATIVA POTENCIAL.
2. TENTATIVA DE FURTO. PEQUENO VALOR. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. LESÃO SIGNIFICATIVA AO BEM JURÍDICO TUTELADO. DESVALOR DA CONDUTA. TIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA. 
3. ORDEM DENEGADA.
1. A vigilância da conduta do agente por preposto do estabelecimento comercial não retira a potencialidade delitiva, ainda mais quando presente, no caso, a realização e a efetivação do ato volitivo de subtração.
2. É de se reconhecer a tipicidade material da conduta de tentativa de furto de bens de supermercado quando o desvalor da conduta afigura-se significativo frente à violação do bem jurídico tutelado pela norma incriminadora.
3. Na espécie, chama atenção a incongruência da defesa da acusada, cujo interrogatório foi no sentido de negar a existência do crime, enquanto que em outra linha admite-o, porém revestido da insignificância.
4. Ordem denegada”.

(STJ, HC n. 81.769, rel. Min. Assis Moura, 6ª Turma, D.J.U. de 17-03-2008, p. 01).

                                     

                                      Não há falar-se, ainda, em atos meramente preparatórios, haja vista que o agente praticou a conduta nuclear referida no art. 155 do CP, ao tomar para si o bem e tentar sair do local com o objeto. Também do ponto de vista material houve conatus, posto que se deu início à agressão ao bem jurídico tutelado.

 

                                     Em face do exposto, reconhece esta Procuradoria-Geral de Justiça que há elementos para se oferecer denúncia em face do investigado.

 

                                     Diante disso, designo outro Promotor de Justiça para oferecer denúncia, bem como para prosseguir no feito em seus ulteriores termos, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria.

São Paulo, 16 de julho de 2008.

 

FERNANDO GRELLA VIEIRA

Procurador-Geral de Justiça