Código de Processo Penal, art. 28

 

Protocolado n.º 9.341/11

Autos n.º 190/10 – MM. Juízo da 14.ª Vara Criminal do Foro Central da Comarca da Capital

Ré: (...)

Assunto: análise de proposta de suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei n. 9.099/95)

 

EMENTA: CPP, ART. 28. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (art. 89 da Lei n. 9.099/95). RECEPTAÇÃO DOLOSA SIMPLES (CP, art. 180, caput). AUSÊNCIA DE REQUISITOS SUBJETIVOS. ACENTUADA CULPABILIDADE. DESCABIMENTO DA MEDIDA.

1.     O cabimento da suspensão condicional do processo não se prende, exclusivamente, a requisitos de ordem objetiva. Além disso, como expressamente dispõe a Lei, é necessário que a “culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício”.

2.     No caso dos autos, o grau de reprovabilidade da conduta mostrou-se acentuado, porquanto se trata da receptação de carga roubada, perpetrada no mesmo dia da prática do crime antecedente, de modo a revelar perniciosa proximidade entre a receptadora e os autores da subtração.

Decisão: insisto no descabimento da medida e deixo de propor ao agente a suspensão condicional do processo.

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público em face de (...), imputando-lhe, na peça inaugural de fls. 01-d/03-d, o crime tipificado no art. 180, caput, do CP (receptação).

Uma vez ofertada a denúncia, determinou-se a abertura de vista dos autos ao Ministério Público para análise da proposta de suspensão condicional (art. 89 da Lei n. 9.099/95), tendo a Douta Promotora de Justiça se recusado justificadamente a fazê-lo (fls. 74/76).

A MM. Juíza julgou improcedente as razões invocadas e por entender cabível a medida, ordenou o envio do procedimento a esta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fls. 90/91).

Eis a síntese do necessário.

Com respeito à remessa do processo a este Órgão, deve-se destacar que esta se deu em observância aos ditames constitucionais. O art. 129, inc. I, da CF, atribui ao MINISTÉRIO PÚBLICO a titularidade exclusiva da ação penal pública. Deveras, tratando-se do dominus litis, ao Parquet incumbe verificar o cabimento das medidas despenalizadoras contidas na Lei n. 9.099/95, notadamente da suspensão condicional do processo. Nesse sentido, a Súmula 696 do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

Deve-se verificar, portanto, o preenchimento dos requisitos legais para a concessão do benefício.

Pois bem. Com o máximo respeito que se pode tributar à Magistrada, o beneplácito cogitado não se mostra cabível. Deveras, há de prevalecer o óbice levantado pela Ilustre Promotora de Justiça a fls. 74/76.

É importante destacar que se mostra errônea, com a devida vênia, a concepção de que a suspensão condicional do processo sujeita-se, tão somente, a requisitos objetivos. A simples leitura do art. 89, caput, da Lei n. 9.099/95, que faz expressa remissão ao art. 77 do CP, desmente a equivocada assertiva acima exposta.

Com efeito, a formulação de proposta de sursis processual requer o se examine a culpabilidade (i.e., gravidade concreta do fato), os antecedentes, a personalidade, a conduta social, os motivos e as circunstâncias do crime.

A culpabilidade deve ser entendida como gravidade concreta do comportamento ou, ainda, como o grau de censurabilidade da conduta. No caso concreto, a intensa reprovabilidade do ato cometido revela o despropósito da concessão do benefício.

Isto porque a indiciada foi surpreendida depois de ocultar vultosa quantidade de bens subtraídos no mesmo dia, revelando intensa proximidade com os autores do delito patrimonial antecedente, que se cuida de roubo de carga.

Conclui-se, portanto, que muito embora a denunciada não possua ação penal em andamento ou condenação definitiva, a aplicação da medida despenalizadora não atenderá aos postulados da prevenção e retribuição pelo fato ocorrido.

Diante do exposto, deixo de propor a suspensão condicional do processo ou de designar promotor de justiça para fazê-lo e insisto na postura já adotada pelo Ministério Público. Publique-se a ementa.

São Paulo, 20 de janeiro de 2011.

 

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

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