Código de Processo Penal, Art. 28

Protocolado n. 70.607/13

Autos n. 1.858/11 – MM. Juízo da 2.ª Vara Criminal da Comarca de Ribeirão Preto

Réu: (...)

Assunto: recusa ministerial em propor ao réu a suspensão condicional do processo

 

EMENTA: ART. 28 DO CPP. RECUSA MINISTERIAL EM PROPOR AO RÉU A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO (ART. 89 DA LEI N. 9.099/95). AGENTE QUE INDICA PESSOA DIVERSA COMO CONDUTORA DE VEÍCULO EM DOCUMENTO EMITIDO POR FORÇA DE INFRAÇÃO DE TRÂNSITO QUE ELE MESMO COMETEU. CRIME DE USO DE DOCUMENTO IDEOLOGICAMENTE FALSIFICADO (ART. 304, C.C. ART. 299, AMBOS DO CP). SUJEITO QUE PREENCHE OS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS PARA CONCESSÃO DA MEDIDA DESPENALIZADORA. OUTORGA DO BENEFÍCIO.

1.   Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público imputando ao acusado o delito de falsificação de documento público (art. 297, §2.º, c.c. art. 29, ambos do CP), pois indicou outro indivíduo como motorista de biciclo em documento emitido por força de infração de trânsito perpetrada por ele.

2.   O MM. Juiz entendeu que a conduta atribuída ao acusado envolveria o uso de documento ideologicamente falso (CP, art. 304), ao qual se cominaria a pena prevista no art. 299 do CP; abriu, assim, vista dos autos ao Parquet para se manifestar acerca do benefício pleiteado, mas houve recusa em outorgá-lo, motivo pelo qual o Digníssimo Magistrado encaminhou a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos da Súmula n. 696 do STF.

3. O comportamento narrado na peça vestibular configura, in thesi, uso de documento ideologicamente falsificado (art. 304, c.c. art. 299, ambos do CP). Nesse sentido, inclusive, há precedentes desta Procuradoria-Geral de Justiça (vide Protocolado n. 163.325/12).

4. Dá-se o falso ideal ou expressional, com efeito, quando alguém mente no tocante ao conteúdo de documento fisicamente verdadeiro. Não é o exterior que é falso, mas o interior, a ideia exposta no documento. Trata-se a falsidade ideológica, portanto, da mentira reduzida a termo. Nesta, “o agente forma um documento até então inexistente para, através dele, fraudar a verdade. O documento assim elaborado pelo falsificador é extrinsecamente verdadeiro, pois quem o escreve é efetivamente quem aparece no texto como seu autor; o que há nele de inverídico é o conteúdo ideológico, pois seu texto é falso ou omisso em relação à realidade que deveria consignar” (Sylvio do Amaral, Falsidade Documental, p. 47).

5. O falso ideal também fica sujeito à verificação dos quatro requisitos gerais relativos à falsidade documental, a saber: a mudança da verdade (immutatio veritatis), a imitação da verdade (immitatio veritatis), a potencialidade de dano (falsum punitur licet nemini damun inferret, sufficit enim quod potuit damnum inferre) e o dolo (animus fallendi). Em se cuidando de falsidade ideológica, porém, a immitatio veritatis deverá ser entendida como verossimilhança do conteúdo.

6. O falso ideal, recorde-se, não envolve a modificação da peça, do instrumento, do objeto, etc., mas a inserção de conteúdo inverídico sobre estes. Assim, deve a mentira aposta no documento ser hábil a iludir. A falsidade ideológica pressupõe, portanto, como em todos os crimes contra a fé pública, idoneidade (capacidade de enganar o homem médio) e potencialidade lesiva.

7. Com respeito ao dolo, outra característica do crime reside em que não basta o elemento subjetivo genérico, pois requer também a existência de uma finalidade ulterior à qual deve a conduta do agente dirigir-se, consistente no fim de “prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”. Note-se que a lei condiciona a existência do delito a que o conteúdo do falso refira-se a fato juridicamente relevante. Entende-se como tal a declaração capaz de criar, alterar ou extinguir relações jurídicas, algo que constitua a essência do ato ou documento, e não uma simples mentira sem maiores consequências legais. Os requisitos nomeados, repise-se, fizeram-se presentes.

8. A infração, destarte, insere-se na esfera de abrangência da medida despenalizadora. É preciso analisar, a partir daí, o cabimento do sursis processual. Relevante anotar, nesta ordem de ideias, que o acusado não responde a outro feito criminal e, com respeito aos quesitos subjetivos, não se mostram desfavoráveis.

Solução: conhece-se da presente remessa, propondo-se ao réu a suspensão condicional do processo, mediante condições desde logo especificadas.

 

 

Cuida-se de ação penal movida pelo Ministério Público, imputando a (...) o delito de falsificação de documento público (art. 297, §2.º, c.c. art. 29, ambos do CP).

O comportamento perpetrado pelo agente consistiu em indicar pessoa diversa como condutora de biciclo em documento emitido por força de infração de trânsito que ele mesmo cometeu.

Recebida a denúncia (fl. 33), o réu foi regularmente citado (fls. 34/35), apresentando defesa escrita, na qual postulou a desclassificação do delito para aquele tipificado no art. 299 do CP e, por conseguinte, lhe fosse proposta a suspensão condicional do processo – art. 89 da Lei n. 9.099/95 (fls. 40/43).

O Ilustre Promotor de Justiça insistiu no enquadramento legal descrito na petição inicial (fl. 44).

O MM. Juiz, por sua vez, entendeu que a conduta atribuída ao acusado envolveria o uso de documento ideologicamente falso (CP, art. 304), ao qual se cominaria a pena prevista no art. 299 do CP; abriu, assim, nova vista dos autos ao Parquet para se manifestar acerca do benefício pleiteado (fl. 45).

O Douto Representante Ministerial, então, recusou-se a outorgar a benesse (fl. 46), motivo pelo qual o Digníssimo Magistrado encaminhou a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos da Súmula n. 696 do STF (fl. 47).

Eis a síntese do necessário.

Com a devida vênia do Insigne Órgão do Ministério Público, assiste razão ao MM. Julgador.

O ato narrado na peça vestibular configura, in thesi, uso de documento ideologicamente falsificado (art. 304, c.c. art. 299, ambos do CP).

Nesse sentido, inclusive, há precedentes desta Procuradoria-Geral de Justiça (vide Protocolado n. 163.325/12).

Dá-se o falso ideal ou expressional, com efeito, quando alguém mente no tocante ao conteúdo de documento fisicamente verdadeiro. Não é o exterior que é falso, mas o interior, a ideia exposta no documento. Trata-se a falsidade ideológica, portanto, da mentira reduzida a termo.

Nesta, “o agente forma um documento até então inexistente para, através dele, fraudar a verdade. O documento assim elaborado pelo falsificador é extrinsecamente verdadeiro, pois quem o escreve é efetivamente quem aparece no texto como seu autor; o que há nele de inverídico é o conteúdo ideológico, pois seu texto é falso ou omisso em relação à realidade que deveria consignar” (Sylvio do Amaral, Falsidade Documental, p. 47).

O falso ideal também fica sujeito à verificação dos quatro requisitos gerais relativos à falsidade documental, a saber: a mudança da verdade (immutatio veritatis), a imitação da verdade (immitatio veritatis), a potencialidade de dano (falsum punitur licet nemini damun inferret, sufficit enim quod potuit damnum inferre) e o dolo (animus fallendi).

Em se cuidando de falsidade ideológica, porém, a immitatio veritatis deverá ser entendida como verossimilhança do conteúdo.

O falso ideal, recorde-se, não envolve a modificação da peça, do instrumento, do objeto, etc., mas a inserção de conteúdo inverídico sobre estes. Assim, deve a mentira aposta no documento ser hábil a iludir.

A falsidade ideológica pressupõe, portanto, como em todos os crimes contra a fé pública, idoneidade (capacidade de enganar o homem médio) e potencialidade lesiva.

Com respeito ao dolo, outra característica do crime reside em que não basta o elemento subjetivo genérico, pois requer também a existência de uma finalidade ulterior à qual deve a conduta do agente dirigir-se, consistente no fim de “prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante”.

Note-se que a lei condiciona a existência do delito a que o conteúdo do falso refira-se a fato juridicamente relevante. Entende-se como tal a declaração capaz de criar, alterar ou extinguir relações jurídicas, algo que constitua a essência do ato ou documento, e não uma simples mentira sem maiores consequências legais.

Os requisitos acima nomeados, repise-se, fizeram-se presentes.

A infração, destarte, insere-se na esfera de abrangência da medida despenalizadora. É preciso analisar, assim, o cabimento do sursis processual.

Relevante anotar, nesta ordem de ideias, que o acusado não responde a outro feito criminal.

Ressalte-se, outrossim, que a formulação da proposta requer o preenchimento de requisitos de ordem objetiva e subjetiva. Estes referem-se à culpabilidade (i.e., gravidade concreta do fato), antecedentes, personalidade, conduta social, motivos e circunstâncias do crime.

Com respeito aos quesitos subjetivos, também não se mostram desfavoráveis.

Em face do exposto, propõe-se ao réu a suspensão condicional do processo, por dois anos, mediante as seguintes condições:

(i) comparecimento mensal e obrigatório em juízo para justificar suas atividades;

(ii) proibição de frequentar determinados lugares a serem estipulados judicialmente;

(iii) proibição de ausentar-se da comarca onde reside sem autorização judicial;

(iv) a obrigação de prestar serviços à comunidade ou entidades públicas, pelo prazo de quatro meses, perfazendo 120 (cento e vinte) horas de tarefas gratuitas.

Publique-se a ementa.

São Paulo, 16 de maio de 2013.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

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