Código de Processo Penal, Art. 28
Protocolado n.
71.519/13
Autos n. 29/12 - MM. Juízo da Vara Judicial
da Comarca de Paranapanema
Investigado: (...)
Assunto: revisão de pedido de arquivamento
de inquérito policial
EMENTA: CPP, ART. 28. ARQUIVAMENTO
DE INQUÉRITO POLICIAL FUNDADO
1. O arquivamento de inquérito policial somente pode se lastrear em excludente de ilicitude (real ou putativa) quando referida causa verifique-se cabalmente demonstrada. Na hipótese vertente, a qual versa sobre possível legítima defesa (CP, art. 25), tal não se pode afirmar.
2. Isto porque das narrativas apresentadas pelas
testemunhas e diante, inclusive, do depoimento do indiciado, não se pode
afirmar, com razoável grau de certeza, ter o sujeito ativo atuado em legítima
defesa. De outra parte, nesta fase da persecução penal, eventuais dúvidas, se
existentes, hão de ser dirimidas em favor da sociedade. Nesse sentido, a
jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (vide STJ, Conflito de
Competência n. 113.020, rel. MIN. OG FERNANDES, julgado em 23/03/2011).
3. Cumpre salientar, por derradeiro, que não se trata de fazer um juízo definitivo de censura, mas apenas de constatar a existência de um mínimo de embasamento para a deflagração do devido processo legal.
Solução: designa-se outro promotor de justiça para oferecer denúncia e prosseguir no feito em seus ulteriores termos.
Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração das circunstâncias por meio das quais (...) sofreu golpes com instrumento pérfuro-cortante, que resultaram lesões corporais de natureza grave, perpetrados por (...).
Concluídas as providências de polícia judiciária, o Douto Promotor de Justiça, entendendo que o agente atuou em legítima defesa, postulou o arquivamento do feito (fls. 65/67).
O Digníssimo Magistrado, porém, discordou de tal posicionamento, encaminhando a questão para análise desta Procuradoria-Geral de Justiça, nos termos do art. 28 do CPP (fl. 68).
Eis a síntese do necessário.
A razão se encontra com o Meritíssimo Julgador, com a máxima vênia do Ilustre Representante do Parquet.
Dos elementos de informação coligidos infere-se, em breve síntese, que, no dia 23 de outubro de 2011, no interior do estabelecimento comercial situado à Praça da Matriz, Centro, na Comarca de Paranapanema, (...), efetuando brincadeira inoportuna com o investigado, alcunhado de “(...)”, o derrubou da cadeira; este, então, inconformado, o golpeou na cabeça com uma garrafa, causando-lhe lesões de natureza leve.
(...) (apelidado de “(...)”), vendo a situação, teria buscado apartar a briga e, após o confronto, quando este deixava o local, o investigado o atingira com um canivete várias vezes, na região peitoral e dorsal, de modo que ele perdesse os sentidos.
(...), que testemunhou os fatos, asseverou que “(...)” chutou (...)” e posteriormente outro rapaz. Quando (...) procurou revidar a abordagem de (...), (...) intentou detê-lo, contexto no qual foi ferido levemente por ele (fl. 38).
(...) alegou que, segundo ficou sabendo, “(...)” agrediu “(...)” e insistia em continuar a briga; “(...)” procurou apartá-los, mas o primeiro o golpeou. Nesse momento, o indiciado sacou o canivete e passou a desferir golpes a esmo, atingindo a vítima e a ele também, acreditando, contudo, que não o acertara dolosamente. Acrescentou que “(...)” socou o ofendido (fl. 39).
Os policiais militares que atenderam à ocorrência receberam no hospital a informação de que o autor da conduta fora “(...)” (fls. 33/35).
(...) manifestou seu desejo de representar em face do suspeito (fl. 16), mas (...), (...) e (...) não o fizeram (fls. 17/19).
Foram realizados exames periciais nos sujeitos passivos, concluindo pela produção de lesões corporais de natureza leve nos três últimos (fls. 30/30/32), mas graves no primeiro, inclusive com perigo de vida (fls. 06, 13 e 15).
(...), em suas declarações, confirmou as versões de (...) e (...); entretanto, aduziu:
“... que nesse momento, “(...)” parou
de agredir “(...)”, ficou encarando o declarante e seu amigo (...) e saiu em
direção ao veículo dele, quando alguém gritou para que não fosse atrás dele,
pois “(...)” portava uma arma no interior do veículo; que por saber que “(...)”
costumeiramente tem armas em seu poder, partiu na direção dele para evitar que
ele pegasse uma arma no veículo e o matasse, momento em que desferiu golpes de
canivete contra ele...” (fl. 40).
O
relatório de investigação de fl. 07, não obstante, informa que o increpado,
questionado acerca da arma utilizada nas agressões, apresentou um canivete de
cor preta, marca “Feng Li”, o qual, segundo ele, foi utilizado para golpear as
vítimas, instrumento este objeto de perícia (fls. 10/11).
Pois bem.
Como é cediço, o arquivamento de procedimento criminal fundado em causas de justificação somente pode ter lugar quando incontroversa a prova, de tal modo a não pairar qualquer incerteza a respeito de sua verificação.
Nesta fase da persecução penal, eventuais dúvidas, se existentes, hão de ser dirimidas em favor da sociedade. Nesse sentido, a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (vide STJ, Conflito de Competência n. 113.020, rel. MIN. OG FERNANDES, julgado em 23/03/2011).
Os
elementos já apontados, portanto, são suficientes para se concluir, com a
devida vênia do Douto Promotor de Justiça oficiante, pela viabilidade do
prosseguimento da persecução penal.
Cumpre salientar que não se trata de fazer um juízo definitivo de censura, mas apenas de constatar a existência de um mínimo de embasamento para a deflagração do devido processo legal. Não é outro, aliás, o entendimento de nossos tribunais:
“não se exige, na primeira fase da persecutio criminis, que a autoria e a
materialidade da prática de um delito sejam definitivamente provadas, uma vez
que a verificação de justa causa para a ação penal pauta-se em juízo de
probabilidade, e não de certeza”
(STJ, HC n. 100.296, rel. Min. ARNALDO
ESTEVES LIMA, 5.ª TURMA, DJe de
Nada impede, por óbvio, que em juízo se confirme a presença da legítima defesa, operando-se, quiçá, a absolvição sumária do sujeito (CPP, art. 415).
É mister, porém, que a ação penal seja proposta e, em cognição judicial ampla, se conheçam os fatos em sua integralidade.
Frise-se que há base para excogitar de crime doloso contra a vida, na modalidade tentada, na conduta do sujeito ativo.
Diante disso, designa-se outro representante ministerial para oferecer denúncia e prosseguir no feito em seus ulteriores termos.
Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.
Expeça-se portaria designando o substituto automático.
Publique-se a ementa.
São Paulo, 20 de maio de 2013.
Márcio Fernando Elias Rosa
Procurador-Geral de Justiça
/aeal