Protocolado n.º 157.181/08

Processo n.º 2.306/02 – MM. Juízo do I Tribunal do Júri da Comarca da Capital

Réu: (...)

 

EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. JUIZ QUE “DESCONSTITUI” PROMOTOR DE JUSTIÇA. RECUSA DO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM SUSTENTAR A ACUSAÇÃO EM PLENÁRIO, JUSTIFICADA NA IMPRESCINDIBILIDADE DE INQUIRIÇÃO DO OFENDIDO, AUSENTE AO ATO. JULGAMENTO ADIADO. DESCABIMENTO DE DESIGNAÇÃO DE OUTRO PROMOTOR PARA ATUAR NA SESSÃO DE JULGAMENTO.

1. No caso dos autos, o Promotor de Justiça requereu o adiamento da sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, em virtude da ausência do ofendido, arrolado em caráter de imprescindibilidade. A MM. Juíza indeferiu o requerimento pelo fato de a vítima não ter sido localizada, muito embora o Membro do Parquet tenha requerido prazo para indicar seu paradeiro. O Promotor de Justiça, então, informou que não sustentaria a acusação, deixando de se manifestar, o que fez com que a Magistrada o “desconstituísse”.

2. A atitude verificada, com a devida vênia, não se mostra em consonância com a autonomia e independência inerentes ao Ministério Público e, ademais, resulta em violação ao princípio do promotor natural.

3. Não pode o Poder Judiciário imiscuir-se na atribuição funcional do Parquet. Não cabe, portanto, designação de outro promotor de justiça, ainda mais porquanto inexistiu expressa invocação do art. 28 do CPP.

Solução: deixo de designar outro promotor de justiça para oficiar nos autos.

 

 

                                      Cuida-se de pedido de providências encaminhado a esta Procuradoria-Geral de Justiça pela Meritíssima Juíza do I Tribunal do Júri da Comarca de São Paulo, solicitando a adoção de providências para “indicar outro Membro do Ministério Público para atuar na acusação”, uma vez que o promotor natural fora “desconstituído” por decisão judicial.

 

                                      É o relatório.

 

                                      Deve-se ponderar, de início, que não poderia a MM. Juíza “desconstituir” o Representante Ministerial, como o fizera. Com a devida vênia da d. Magistrada, não cabe ao Poder Judiciário se imiscuir em esfera privativa do Ministério Público, qual seja, a definição da atribuição para oficiar nos autos.

 

                                      A justificativa de tal impossibilidade é, segundo nos parece, singela. É que o Ministério Público constitui, como é cediço, Instituição permanente e essencial à função jurisdicional do Estado e possui como princípios a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional (CF, art. 127).

 

                                      Ademais disso, conta o Parquet com independência e autonomia em relação aos Poderes Constituídos, motivo pelo qual descabe ao Judiciário dispor sobre a atribuição funcional dos membros do Ministério Público.

 

                                      Acrescente-se, ainda, que a prevalecer a postura judicial, haveria patente afronta ao princípio do promotor natural.

 

                                      Pelas razões acima expostas, a solicitação judicial não pode ser acolhida.

 

                                      É de se esclarecer, outrossim, que não é possível analisar eventual designação de outro promotor de justiça neste protocolado, à luz do art. 28 do CPP. Deveras, a leitura dos documentos que instruem o ofício, que revela o inteiro teor da r. decisão judicial, demonstra não ter se excogitado da aplicação do mencionado dispositivo legal.

 

                                      Como pondera ANDRÉ ESTEFAM: “O julgamento será obrigatoriamente adiado. O Juiz Presidente deverá verificar, então, se a ausência foi justificada ou injustificada. Nesse caso, deverá comunicar o fato ao Procurador-Geral de Justiça (ou da República). Este somente poderá designar outro membro do MP para atuar no julgamento se o Juiz, na comunicação, expressamente requerer a aplicação do art. 28 do CPP” (O Novo Júri. 3ª ed. São Paulo: Editora Damásio de Jesus. 2009, pág. 58; grifo nosso).

 

                                      De ver que muito embora a MM. Juíza tenha mencionado a hipótese de esta Procuradoria-Geral “indicar” (sic) outro promotor, não há notícia de que tenha encaminhado os autos do processo para análise. Não se pode olvidar que o art. 28 do Estatuto Processual Penal dispõe que o Juiz “fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral”. Daí conclui-se que só poderá o Chefe do Parquet analisar a imprescindibilidade da providência postulada se mantiver contato com todo o processo, e não com algumas cópias.

 

                            De mais a mais, trata-se, no caso concreto, da oitiva da vítima. Deve-se sublinhar que, com respeito a este meio de prova, o CPP é categórico: “Sempre que possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por termo as suas declarações” (art. 201, caput, com redação dada pela Lei n. 11.690/08).

 

                                      Conclui-se, destarte, que não cumpre ao Procurador Geral designar outro membro ministerial para oficiar neste processo.

 

                                      Registre-se, por derradeiro, que a postura ministerial não se enquadra, data maxima venia, na hipótese do art. 455 do CPP, uma vez que o Órgão do Ministério Público compareceu ao julgamento, tendo atendido ao pregão e permanecido em Plenário. É de ver que o diligente Representante Ministerial só deixou o recinto depois de ser “desconstituído” pela MM. Juíza.

 

                                      Diante do exposto, deixo de designar outro promotor de justiça para oficiar nos autos, destacando que a incumbência de sustentar a acusação em Plenário, na data designada para o julgamento, deve recair sobre o promotor natural, com base nas atribuições da Promotoria de Justiça do I Tribunal do Júri da Capital. Remeta-se cópia desta manifestação à MM. Juíza e ao Douto Promotor de Justiça, com as homenagens de estilo. Publique-se a ementa. Em seguida, arquivem-se os autos.

São Paulo, 09 de janeiro de 2009.

 

FERNANDO GRELLA VIEIRA

Procurador-Geral de Justiça