Processo n.º 2.306/02 – MM. Juízo do
I Tribunal do Júri da Comarca da Capital
Réu: (...)
EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. JUIZ QUE “DESCONSTITUI” PROMOTOR DE
JUSTIÇA. RECUSA DO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
1. No caso dos autos, o Promotor de Justiça requereu o adiamento da
sessão de julgamento pelo Tribunal do Júri, em virtude da ausência do ofendido,
arrolado em caráter de imprescindibilidade. A MM. Juíza indeferiu o
requerimento pelo fato de a vítima não ter sido localizada, muito embora o
Membro do Parquet tenha requerido
prazo para indicar seu paradeiro. O Promotor de Justiça, então, informou que
não sustentaria a acusação, deixando de se manifestar, o que fez com que a
Magistrada o “desconstituísse”.
3. Não pode o Poder Judiciário imiscuir-se na atribuição funcional do Parquet. Não cabe, portanto, designação
de outro promotor de justiça, ainda mais porquanto inexistiu expressa invocação
do art. 28 do CPP.
Solução: deixo de designar outro promotor de justiça para oficiar nos
autos.
Cuida-se
de pedido de providências encaminhado a esta Procuradoria-Geral de Justiça pela
Meritíssima Juíza do I Tribunal do Júri da Comarca de São Paulo, solicitando a
adoção de providências para “indicar outro Membro do Ministério Público para
atuar na acusação”, uma vez que o promotor natural fora “desconstituído” por
decisão judicial.
É
o relatório.
Deve-se
ponderar, de início, que não poderia a MM. Juíza “desconstituir” o
Representante Ministerial, como o fizera. Com a devida vênia da d. Magistrada,
não cabe ao Poder Judiciário se imiscuir em esfera privativa do Ministério
Público, qual seja, a definição da atribuição para oficiar nos autos.
A
justificativa de tal impossibilidade é, segundo nos parece, singela. É que o
Ministério Público constitui, como é cediço, Instituição permanente e essencial
à função jurisdicional do Estado e possui como princípios a unidade, a
indivisibilidade e a independência funcional (CF, art. 127).
Ademais
disso, conta o Parquet com
independência e autonomia em relação aos Poderes Constituídos, motivo pelo qual
descabe ao Judiciário dispor sobre a atribuição funcional dos membros do
Ministério Público.
Acrescente-se,
ainda, que a prevalecer a postura judicial, haveria patente afronta ao
princípio do promotor natural.
Pelas
razões acima expostas, a solicitação judicial não pode ser acolhida.
É
de se esclarecer, outrossim, que não é possível analisar eventual designação de
outro promotor de justiça neste protocolado, à luz do art. 28 do CPP. Deveras,
a leitura dos documentos que instruem o ofício, que revela o inteiro teor da r.
decisão judicial, demonstra não ter se excogitado da aplicação do mencionado
dispositivo legal.
Como
pondera ANDRÉ ESTEFAM: “O julgamento será obrigatoriamente
adiado. O Juiz Presidente deverá verificar, então, se a ausência foi
justificada ou injustificada. Nesse caso, deverá comunicar o fato ao
Procurador-Geral de Justiça (ou da República). Este somente poderá designar outro membro do MP para atuar no
julgamento se o Juiz, na comunicação, expressamente requerer a aplicação do
art. 28 do CPP” (O Novo Júri.
3ª ed. São Paulo: Editora Damásio de Jesus. 2009, pág. 58; grifo nosso).
De
ver que muito embora a MM. Juíza tenha mencionado a hipótese de esta
Procuradoria-Geral “indicar” (sic)
outro promotor, não há notícia de que tenha encaminhado os autos do processo
para análise. Não se pode olvidar que o art. 28 do Estatuto Processual Penal
dispõe que o Juiz “fará remessa do
inquérito ou peças de informação ao procurador-geral”. Daí conclui-se que
só poderá o Chefe do Parquet analisar
a imprescindibilidade da providência postulada se mantiver contato com todo o
processo, e não com algumas cópias.
De
mais a mais, trata-se, no caso concreto, da oitiva da vítima. Deve-se sublinhar
que, com respeito a este meio de prova, o CPP é categórico: “Sempre que
possível, o ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da
infração, quem seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar,
tomando-se por termo as suas declarações”
(art. 201, caput, com redação dada
pela Lei n. 11.690/08).
Conclui-se,
destarte, que não cumpre ao Procurador Geral designar outro membro ministerial
para oficiar neste processo.
Registre-se,
por derradeiro, que a postura ministerial não se enquadra, data maxima venia, na hipótese do art. 455 do CPP, uma vez que o Órgão
do Ministério Público compareceu ao julgamento, tendo atendido ao pregão e permanecido
em Plenário. É de ver que o diligente Representante Ministerial só deixou o
recinto depois de ser “desconstituído” pela MM. Juíza.
Diante
do exposto, deixo de designar outro promotor de justiça para oficiar nos autos,
destacando que a incumbência de sustentar a acusação em Plenário, na data
designada para o julgamento, deve recair sobre o promotor natural, com base nas
atribuições da Promotoria de Justiça do I Tribunal do Júri da Capital. Remeta-se
cópia desta manifestação à MM. Juíza e ao Douto Promotor de Justiça, com as
homenagens de estilo. Publique-se a ementa. Em seguida, arquivem-se os autos.
São Paulo, 09 de janeiro de 2009.
FERNANDO GRELLA VIEIRA
Procurador-Geral de Justiça