Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 100.842/15

Autos n.º 0104376-96.2014.8.26.0050 – MM. Juízo da Vara do Juizado Especial Criminal Central da Comarca da Capital

Suscitante: Promotoria de Justiça do Juizado Especial Criminal da Capital

Suscitada: 2.ª Promotoria de Justiça Criminal da Capital

Assunto: divergência sobre o enquadramento típico dos fatos com reflexo na atribuição funcional

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DIVERGÊNCIA ACERCA DO ENQUADRAMENTO LEGAL DA CONDUTA. INJÚRIA SIMPLES (CP, ART. 140, CAPUT) OU QUALIFICADA (CP, ART. 140, §3.º). EXPRESSÃO OFENSIVA QUE ALUDE À ORIGEM NORDESTINA DO SUJEITO PASSIVO, SUBSUMINDO-SE, PORTANTO, À FIGURA QUALIFICADA. FATO QUE NÃO CONSTITUI INFRAÇÃO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. ATRIBUIÇÃO DO DOUTO PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL.

1.     O endereçamento do caso a esta Chefia Institucional se assenta no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93, de vez que configurado o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça. Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

2.     Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

3.     A razão assiste ao Douto Suscitante, com a máxima vênia da Ilustre Suscitada; senão, vejamos.

4.     Percebe-se dos elementos informativos que os investigados discutiram e se agrediram mutuamente, resultando lesões corporais leves. No bojo do entrevero, uma das autoras ofendeu a honra do sujeito passivo, injuriando-o com expressões pejorativamente irrogadas alusivas à sua condição de nordestino. Houve, em tese, injúria qualificada, fato que não se subsume ao conceito de infração de menor potencial ofensivo.

Solução: conhece-se do presente conflito para declarar que a atribuição incumbe à Douta Suscitada, designando-se outro membro ministerial a fim de resguardar sua independência funcional.

 

 

 

 

Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração dos crimes de lesão corporal dolosa leve cometidos reciprocamente por MARIA ELIZA REZENDE MEGALE, RAVI BARONI DIAS, KAYSSI CRISTINA NERIS DA SILVA e KELLY CRISTINA NERIS DA SILVA.

Além disso, apura-se injúria cometida por MARIA ELIZA em face de JOSÉ CÍCERO DA SILVA.

A Douta Promotora de Justiça Criminal, recebendo o feito, ponderou que a infração cogitada seria de menor potencial ofensivo, requerendo a remessa do expediente ao Juizado Especial (fls. 37, verso).

O Ilustre Representante Ministerial nele oficiante, todavia, entendendo configurado, entre outros, o delito de injúria na forma qualificada (art. 140, §3.º, do CP), suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 40/43).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento do caso a esta Chefia Institucional se assenta no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93.

Encontra-se configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão assiste ao Douto Suscitante, com a máxima vênia da Ilustre Suscitada; senão, vejamos.

Percebe-se dos elementos informativos amealhados ter MARIA ELIZA, em tese, cometido injúria qualificada.

Isto porque supostamente assacou a honra subjetiva do ofendido imputando-lhe qualidades negativas, em parte vinculadas à sua condição de nordestino.

A pena máxima cominada a tal infração é de três anos.

O preclaro DAMÁSIO DE JESUS, a respeito do tema, ensina:

 

“O art. 2º da Lei n. 9.459, de 13 de maio de 1997, acrescentou um tipo qualificado ao delito de injúria, recentemente modificado pela Lei n. 10.741, de 1º de outubro de 2003, impondo penas de reclusão, de um a três anos, e multa, se cometida mediante “utilização de elementos referentes a raça, cor, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência”. A alteração legislativa foi motivada pelo fato de que réus acusados da prática de crimes descritos na Lei n. 7.716, de 5 de janeiro de 1989 (preconceito de raça ou de cor), geralmente alegavam ter praticado somente delito de injúria, de menor gravidade, sendo beneficiados pela desclassificação. Por isso, o legislador resolveu criar uma forma típica qualificada envolvendo valores concernentes a raça, cor etc., agravando a pena.” (Código Penal anotado, 19ª edição, São Paulo, Saraiva, 2009, pág. 502).

Ressalte-se, outrossim, que, com respeito à natureza da ação penal, a Lei n.º 12.033, de 29 de setembro de 2009, alterando-a, a transformou em delito de ação pública condicionada à representação do ofendido:

 

“Art. 145. Nos crimes previstos neste Capítulo somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da violência resulta lesão corporal. Parágrafo único. Procede-se mediante requisição do Ministro da Justiça, no caso do inciso I do caput do art. 141 deste Código, e mediante representação do ofendido, no caso do inciso II do mesmo artigo, bem como no caso do § 3º do art. 140 deste Código”.

 

No caso em testilha, JOSÉ CÍCERO ofertou a devida representação, como se pode inferir a fls. 09.

Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando que a atribuição para atuar no caso recai sobre a Douta Suscitada.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, porém, designa-se outro representante ministerial para intervir no feito, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n.º 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n.º 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 20 de julho de 2015.

 

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

                           

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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