Protocolado nº 100.873/08 – Conflito de Atribuições
Inquérito Policial n. 050.07.019520-0 – (DIPO 4)
Suscitante: 5.ª Promotoria de Justiça Criminal da
Capital
Suscitado: Promotoria de Justiça do Juizado Especial da
Capital
Cuida-se
de feito que teve como origem notitia
criminis de lesão corporal dolosa leve praticada, em tese, por (...) contra
(...), com quem o agente manteve relação amorosa.
Relatado
o inquérito policial, o Douto Promotor de Justiça Criminal requereu a remessa
dos autos ao Juizado Especial (fls. 34).
O
competente Promotor de Justiça que oficia no âmbito do JECRIM, de sua parte,
postulou o retorno dos autos ao Juízo Comum, por entender aplicável à espécie a
Lei n. 11.340/06 (fls. 53).
O
Promotor oficiante na Vara Comum, então, suscitou o presente conflito negativo
de atribuição (fls. 55).
É
o relatório.
Cumpre
verificar, de início, como os fatos se deram. Segundo o relato da ofendida, no
dia dos fatos, seu ex-namorado a procurou e, inconformado com a separação, a
agrediu fisicamente com socos e pontapés, produzindo-lhe lesões corporais
descritas no laudo de fls. 33.
O
autor do fato admitiu ter agredido a ofendida, muito embora apontasse outros
motivos para sua atitude.
A
questão fulcral no presente conflito consiste em saber se a Lei Maria da Penha
é aplicável ao caso sub examen. A
definição de violência doméstica no que diz respeito à incidência da citada Lei
consta de seu art. 5.º: “Para os efeitos
desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer
ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento
físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”. Os incisos do
dispositivo deixam claro que o fato pode se dar no âmbito da “unidade doméstica” (inc. I), no bojo “da família” (inc. II) ou em “qualquer relação íntima de afeto, na qual o
agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação” (inc. III; grifo nosso).
As
características do fato, consoante narradas pela vítima, sugerem a presença do
inciso III do art. 5º da Lei n. 11.340/06. O fato de não terem os envolvidos
mantido união estável ou constituído matrimônio não afasta, de per si, a
incidência da Lei, uma vez que não se exige coabitação por parte do casal.
É de
notar-se que, no caso em testilha, o agente admitiu a relação amorosa com a
vítima.
Em face
disto, assiste razão à Promotoria de Justiça do Juizado Especial Criminal,
aplicando-se ao caso a Lei Maria da Penha, cuja constitucionalidade de seu art.
41 já foi ressaltada por esta Procuradoria-Geral de Justiça recentemente (vide protocolados n. 48.346/08 e
50.045/08). No mesmo sentido: STJ, HC n. 84.831, rel. Min. Félix Fischer, DJe de 05.05.2008.
No
que pertine à competência para o exame da causa, esta deve se dar na esfera do
Juízo Comum e, por conseqüência, a atribuição é da 5.ª Promotoria de Justiça
Criminal da Capital. Vide decisão
exarada no protocolado n. 49.671/08 (conflito de atribuição).
Cabe
acrescentar que o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio da Colenda
Câmara Especial, já decidiu que a Lei Maria da Penha se aplica aos casos de
violência doméstica ou familiar contra a mulher, independentemente da natureza
da relação afetiva ou de sua duração:
“CONFLITO NEGATIVO - Violência Doméstica – Crime de lesão corporal -
Pedido de medidas de proteção fundado na Lei n° 11.340/2006 - Irrelevância da natureza da relação afetiva
e sua duração - Aplicação do art. 5.º da citada Lei - Competência do Juízo Criminal - Constitucionalidade
do art. 41 (da mencionada Lei) - O
legislador constitucional, ao estabelecer a competência do Juizado
Especial Criminal, deixou a cargo do legislador ordinário a definição das
infrações de menor potencial ofensivo - Matéria afeta à Competência da União -
Inocorrência de violação ao princípio da isonomia - Conflito procedente –
Competência do Juízo suscitado”.
(TJSP, CONFLITO DE JURISDIÇÃO n°
157.138-0/0-00, rel. Des. MARIA OLIVIA
ALVES, julgado em 24.03.2008; grifo nosso).
Diante do
exposto, dirimo o presente conflito para declarar que compete à 5.ª Promotoria
de Justiça Criminal da Capital a atribuição para atuar no feito. Para que não
haja violação à independência funcional do i. Suscitante, designo outro
promotor de justiça para atuar no feito e prosseguir em seus ulteriores termos.
São Paulo, 19 de agosto de 2008.
FERNANDO GRELLA VIEIRA
Procurador-Geral de
Justiça