Conflito Negativo de Atribuição

 

Protocolado n.º 115.924/09

Inquérito Policial n. 1.296/09 – MM. Juizado Especial Criminal da Comarca de São Vicente

Investigada: (...)

Assunto: órgão competente para ilícito decorrente de venda a menores de bebidas alcoólicas

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENORES DE IDADE. CONTRAVENÇÃO PENAL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL.

1.      A venda de bebidas alcoólicas a menor de 18 anos não se subsume ao tipo insculpido no art. 243 do ECA (Lei n. 8.069/90). O mencionado ilícito dá-se quando o sujeito: “Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida”. Não se incluem na disposição bebidas alcoólicas. Tal conclusão é obtida com apoio no autorizado escólio de GARRIDO e CURY, mediante interpretação sistemática do Estatuto. Isto porque, no art. 81, constam destacadamente dentre os objetos cuja venda é proibida a crianças e adolescentes, “bebidas alcoólicas” (inciso II) e “produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida” (inciso III).

2.      O fato constitui, em tese, contravenção penal (art. 63 da Lei de Contravenções Penais), motivo por que deve se processar no âmbito do Juizado Especial Criminal. Precedentes do STJ (RHC n. 19.661, rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ de 18/09/2006, p. 339) e desta Procuradoria Geral de Justiça (protocolado n. 66.257/09).

Solução: dirimo o presente conflito para declarar que a atribuição incumbe ao i. Suscitante (Promotor de Justiça perante o Juizado Especial Criminal da Comarca).

 

Cuida-se de procedimento instaurado para apurar a venda de bebidas alcoólicas a adolescentes.

O feito foi distribuído ao Juízo Comum, tendo o mui competente Promotor de Justiça requerido sua remessa ao Juizado Especial Criminal (fls. 65).

O Ilustre Membro do Parquet a quem os autos foram encaminhados, todavia, entendeu que não se tratava de infração de menor potencial ofensivo e suscitou o presente conflito negativo de atribuição (fls. 69/70).

É o relatório.

Na hipótese vertente, a investigada teria fornecido a adolescentes bebidas com teor alcoólico.

Não há falar-se, no caso em tela, no crime tipificado no art. 243 do ECA, com a devida vênia do combativo Suscitante.

O mencionado ilícito dá-se quando o sujeito: “Vender, fornecer ainda que gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente, sem justa causa, produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida”. Não se incluem na disposição bebidas alcoólicas.

Tal conclusão é obtida com apoio no autorizado escólio de GARRIDO e CURY, mediante interpretação sistemática do Estatuto. Isto porque, no art. 81, constam destacadamente dentre os objetos cuja venda é proibida a crianças e adolescentes, “bebidas alcoólicas” (inciso II) e “produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida” (inciso III).

Não há dúvida que, do ponto de vista objetivo, a substância cuja venda foi efetuada pode causar dependência.

Ocorre, todavia, que o elemento típico inserido no art. 243 do ECA não tem caráter objetivo, mas normativo. Significa que seu alcance deve ser obtido por meio da interpretação do texto legal, com apoio no conceito legal de produtos cujos componentes sejam potenciais provocadores de dependência física ou psíquica.

A conduta do sujeito, destarte, não consubstancia o crime em questão. Pode ser enquadrada, entretanto, na contravenção penal do art. 63, inc. I, do Decreto-lei n. 3.688, de 1941 (“Servir bebidas alcoólicas: I – a menor de dezoito anos”).

            Nesse sentido, inclusive, já decidiu o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

 

HABEAS CORPUS. PENAL. VENDA DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR DE 18 ANOS. CONDUTA QUE CARACTERIZA CONTRAVENÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO EVIDENCIADA. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

DESCUMPRIMENTO DE ALVARÁ JUDICIAL. INGRESSO E PERMANÊNCIA DE MENORES EM CASA DE ESPETÁCULOS. PREVISÃO DE SANÇÃO ADMINISTRATIVA EM LEI ESPECÍFICA. FATO ATÍPICO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA A AÇÃO PENAL. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

(...)

2. Não há falar em trancamento da ação penal iniciada por denúncia que satisfaz todos os requisitos do art. 41 do CPP, sendo mister a elucidação dos fatos que em tese caracterizam a contravenção penal prevista no art. 63 do Decreto Lei 3.688/41, à luz do contraditório e da ampla defesa, durante o regular curso da instrução criminal.

(...)

(STJ, RHC n. 19.661, rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, DJ de 18/09/2006, p. 339; grifo nosso).

 

Diante do exposto, dirimo o presente conflito para declarar que a atribuição para atuar no feito compete ao Ilustre Suscitante. Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, já que a presente decisão colide com sua opinio delicti, designo outro promotor de justiça oficiar na causa, requerendo o que de direito. Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006. Expeça-se portaria. Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 23 de setembro de 2009.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

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