Conflito Negativo de Atribuição

 

Protocolado n.º 119.132/10

Autos n.º 1.570/09 – MM. Juízo da 4.ª Vara Criminal da Comarca de Sorocaba

Suscitante: Promotoria de Justiça de Sorocaba

Suscitada: Promotoria de Justiça de Votorantim

Assunto: foro competente para apuração do crime de denunciação caluniosa (CP, art. 339)

 

 

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA (CP, ART. 339). HIPÓTESE EM QUE O BOLETIM DE OCORRÊNCIA É LAVRADO EM SOROCABA E O INQUÉRITO POLICIAL É INSTAURADO EM VOTORANTIM. FORO COMPETENTE.

1.   O delito de denunciação caluniosa visa à tutela da administração da Justiça e, secundariamente, à proteção do status libertatis ou dignitatis do prejudicado (art. 339).

2.   In casu, o sujeito ativo nominou as pessoas que teriam praticado as infrações penais cuja existência sabia não ter ocorrido ao lavrar o boletim de ocorrência na Comarca de Sorocaba. O inquérito policial, contudo, foi instaurado em Votorantim, onde teriam ocorrido os ilícitos penais supostamente atribuídos às vítimas.

3.   O summatum opus da infração dá-se no instante da formalização de quaisquer dos procedimentos elencados no texto legal. Precedente do STJ.

Solução: dirimo o presente conflito para declarar que a atribuição de oficiar nos autos incumbe ao Douto Suscitado.

 

Cuida-se o presente de conflito negativo de atribuição entre os Doutos Promotores de Justiça em exercício nas Comarcas de Sorocaba e Votorantim, os quais divergem acerca do foro competente para apuração do fato e, via de consequência, sobre a incumbência de atuar no feito.

É o relatório.

Os elementos de informação reunidos neste caderno investigatório demonstraram que (...) imputou falsamente a (...) e a (...) os crimes de ameaça e parto suposto (CP, arts. 147 e 242).

O boletim de ocorrência foi lavrado em Sorocaba, mas o inquérito policial foi instaurado em Votorantim.

Pois bem.

Dá-se a denunciação caluniosa quando alguém der “causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente”.

Consuma-se o fato no instante da instauração de qualquer dos procedimentos elencados no texto legal. É verdade que, para alguns, não há necessidade de formalização, por exemplo, do inquérito policial, bastando a coleta de dados ou de elementos destinados à apuração do comportamento objeto da denúncia formulada. Mas o pensamento majoritário é no sentido da necessidade da instauração (STF, RT, 561/418; STJ, RHC 3.171-SP, em 7-2-1994).

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:

 

“PENAL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA. COMUNICAÇÃO FALSA DE CRIME. LOCAL DA CONSUMAÇÃO. COMPETÊNCIA DO LOCAL ONDE INICIADAS AS INVESTIGAÇÕES SOBRE O FATO INVERÍDICO.

1. Sendo indicadas e determinadas as pessoas contra as quais são imputadas a falsa prática de ilícito penal, tem-se configurado, em tese, o crime de denunciação caluniosa e o de comunicação falsa de crime ou contravenção.

2. Considera-se consumado o crime de denunciação caluniosa no local onde foram iniciadas as investigações, ainda que preliminares, sobre o fato denunciado.

3. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito da 1ª Vara Criminal da Comarca de São Vicente/SP, suscitante”.

(STJ, C.C. n. 32.496, rel. Min. ARNALDO ESTEVES, DJU de 02.03.2005).

 

Bem por isso, é inegável que o locus commissi delicti é a Comarca de Votorantim.

Diante do exposto, dirimo o presente conflito declarando competir a atribuição ao Douto Suscitado, sendo desnecessário designar outro Membro para oficiar nos autos.

Isto porque não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça: “a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (REGIME JURÍDICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO PENAL. São Paulo: Editora Verbatim, 2009. pág. 155; parêntese nosso). Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 16 de setembro de 2010.

 

Fernando Grella Vieira

Procurador Geral de Justiça

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