Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 125.264/14

Autos n.º 0003277-76.2014 - MM. Juízo da 4.ª Vara Criminal de Sorocaba

Suscitante: Promotoria de Justiça Criminal de Sorocaba

Suscitada: Promotoria de Justiça do Juizado Especial Criminal de Sorocaba

Assunto: divergência quanto à atribuição para oficiar no feito

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. AUTOR DO FATO NÃO LOCALIZADO PARA INTIMAÇÃO VISANDO AO COMPARECIMENTO À AUDIÊNCIA PRELIMINAR. REMESSA AO JUÍZO COMUM SEM OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. DESCABIMENTO. COMPETÊNCIA DO JECRIM AFASTADA SOMENTE QUANDO NECESSÁRIO EFETUAR CITAÇÃO POR EDITAL, O QUE PRESSUPÕE TENHA A INICIAL JÁ SIDO AFORADA. AJUIZAMENTO DA PEÇA EXORDIAL QUE INCUMBE AO DOUTO PROMOTOR DE JUSTIÇA DO JUIZADO ESPECIAL.

1. Quando não encontrado o autor do fato para comparecimento à audiência preliminar, resta inviabilizada a formulação de proposta de transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/95), cumprindo ao Promotor de Justiça oficiante na esfera dos Juizados Especiais Criminais elaborar a denúncia; persistindo a não localização do agente, por ocasião da fase citatória, remetem-se os autos ao Juízo Comum, para concretizar sua citação editalícia.

2. Nesse sentido, o art. 78, §1.º, da Lei n. 9.099/95, reza que, se o acusado não estiver presente na audiência preliminar, deverá ser citado na forma do art. 66, com as advertências constantes do art. 68. Assim, será levado a efeito o chamamento ao processo no próprio Juizado (quando comparecer o autor da infração) ou por mandado (quando ausente). O parágrafo único do art. 66, por fim, impõe que, se o indiciado não for encontrado para ser citado pessoalmente, o Magistrado enviará as peças existentes ao Juízo Comum.

3. No caso em análise, a opinio delicti deveria ter sido formada pelo Ilustre Representante do Parquet oficiante no Juizado Especial Criminal, já que se mostrou inviável o comparecimento do sujeito à audiência preliminar, por não ter sido localizado.

4. O encaminhamento à Vara Comum ocorreu, portanto, antes de observadas as formalidades exigidas pela Lei n. 9.099/95. Essa remessa somente poderia acontecer se, repise-se, fosse apresentada a exordial e o réu não fosse encontrado para citação pessoal. Do contrário, se alteraria indevidamente a atribuição do promotor de justiça responsável pela formação da opinio delicti, bem como a competência judicial para sua apreciação, transferindo-as, sem previsão legal, do Juizado Especial para o Juízo Comum.

Solução: conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando que a atribuição de oficiar nos autos incumbe, por ora, ao Promotor de Justiça em exercício no âmbito dos Juizados Especiais Criminais.

 

 

Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração da suposta prática do crime de desacato (CP, art. 331) cometido, em tese, por (...).

O Douto Promotor de Justiça auxiliar da Comarca postulou a designação de audiência preliminar, desde já oferecendo ao indiciado proposta de transação penal (art. 76 da Lei n.º 9.099/95; fls. 17/18 e 33). A solenidade, contudo, viu-se prejudicada, porquanto o agente não foi localizado (fls. 37 e 51).

O Insigne Órgão do Parquet, diante de tal quadro, e pautando-se nos termos do art. 66, parágrafo único, da Lei dos Juizados Especiais, pleiteou a redistribuição do expediente ao MM. Juízo Comum (fl. 53).

O Nobre Representante Ministerial que o recebeu, por sua vez, ponderou que o encaminhamento do caso deveria ocorrer apenas se o suspeito não fosse encontrado para ser citado, e na hipótese em testilha não houve o oferecimento de denúncia; em consequência, suscitou conflito de atribuição (fls. 58/62).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento da causa a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

Parece-nos que assiste razão ao Douto Suscitante, com a devida vênia do Ilustre Suscitado; senão, vejamos.

Significa dizer que a inicial deve ser ofertada na esfera dos Juizados Especiais Criminais para então, vendo-se frustrada a citação real e diante da contingência de se efetuá-la na modalidade ficta, serem os autos remetidos ao Juízo Comum.

Isto porque o art. 78, §1.º, da Lei n.º 9.099/95, reza que, se o acusado não estiver presente na audiência preliminar, deverá ser citado na forma do art. 66, com as advertências constantes do art. 68.

Assim, será levado a efeito o chamamento ao processo no próprio Juizado (quando comparecer o autor da infração) ou por mandado (quando ausente).

O parágrafo único do art. 66, por fim, impõe que, se o indiciado não for encontrado para ser citado pessoalmente, o Magistrado enviará as peças existentes ao Juízo Comum.

No caso em análise, repise-se, a opinio delicti deveria ter sido formada pelo Ilustre Representante do Parquet oficiante no Juizado Especial Criminal (com oferecimento de denúncia ou arquivamento), já que se mostrou inviável o comparecimento do averiguado à audiência preliminar, por não ter sido localizado.

O encaminhamento à Vara Comum ocorreu, portanto, antes de observadas as formalidades exigidas pela Lei n. 9.099/95. Essa remessa somente poderá acontecer se, futuramente, for apresentada a exordial e o réu não for encontrado para citação pessoal.

Se a situação assim permanecesse, se alteraria indevidamente a atribuição do promotor de justiça responsável pela análise do mérito, bem como a competência judicial para sua apreciação, transferindo-as, sem embasamento legal, do Juizado Especial para o Juízo Comum.

Diante do exposto, conhece-se deste incidente para dirimi-lo, declarando competir a atribuição para atuar nos autos, por ora, ao Douto Representante Ministerial oficiante perante o JECrim.

Ressalte-se, por derradeiro, que se afigura desnecessária a designação de outro Membro do Parquet para prosseguir no feito, já que esta solução não malferirá sua independência funcional.

Isto porque não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

 

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime Jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo: Editora Verbatim, 2009, pág. 155; parêntese nosso).

 

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 27 de agosto de 2014.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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