Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n. 136.937/12

Autos n. 1.098/11 – MM. Juízo da 3.ª Vara Criminal da Comarca de Santo André

Autor do fato: desconhecido

Vítima: (...)

Suscitante: Promotoria de Justiça Criminal de Santo André

Suscitado: 5.ª Promotoria de Justiça Criminal da Capital

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. FORO COMPETENTE PARA APURAÇÃO DE DESAUTORIZADA TRANSFERÊNCIA ELETRÔNICA DE VALOR ENTRE CONTAS CORRENTES. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELA FRAUDE. ATRIBUIÇÃO DO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM EXERCÍCIO PERANTE O JUÍZO DO LOCAL DA SUBTRAÇÃO DO MONTANTE.

1. Os autos retratam hipótese em que agente transferiu quantia da conta corrente da vítima sem sua anuência, depositando-a em outra, situada em Comarca diversa, por meio de envio, ao banco, de carta de autorização falsa, resultando em prejuízo ao correntista e, ao final, à instituição bancária.

2. A agência onde possui conta corrente o ofendido situa-se em Santo André, de modo que neste local deu-se a subtração do valor. Nesse sentido, precedente da Colenda 3.ª Seção do Egrégio STJ: C.At. n. 222/MG, rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 16/05/2011.

Solução: conflito dirimido para declarar que a atribuição incumbe à Douta Suscitante.

 

Cuida-se de procedimento instaurado visando à apuração do delito cometido em face de (...).

A Ilustre Promotora de Justiça de Santo André, vislumbrando perpetrado o crime de estelionato, consumado em São Paulo, postulou a remessa do procedimento (fls. 24).

A Douta Representante Ministerial que o recebeu, contudo, discordando do posicionamento de sua antecessora, requereu seu reenvio (fls. 30, verso).

O competente Órgão do Parquet, então, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 35/36).

O Digníssimo Magistrado, entendendo configurado furto mediante fraude, abriu nova vista dos autos ao Ministério Público (fls. 37), manifestando-se a Douta Promotora de Justiça no sentido de se tratar a causa do delito inicialmente aventado, reiterando o pleito de encaminhamento do expediente a esta Procuradoria-Geral de Justiça (fls. 38), o que foi deferido judicialmente (fls. 39).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que a vinda dos autos a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações, o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, de modo que não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe o dever de oficiar nos autos.

Pois bem.

Consta da narrativa do feito, em breve síntese, que (...), titular de conta corrente junto ao BANCO SANTANDER BRASIL S/A (agência situada em Santo André), constatou a realização de transferência eletrônica no valor de R$ 12.900,00 (doze mil e novecentos reais) para a conta de (...) (filial localizada em São Paulo).

A instituição bancária informou ter se dado tal operação mediante o recebimento, via FAX, de uma suposta carta de autorização, documento este, entretanto, não firmado pela vítima, o qual, inclusive, não foi encontrado pela pessoa jurídica (fls. 03/06 e 19/21).

A subtração de quantia de conta corrente realizada por meio de transferência eletrônica sem a anuência do titular da conta configura crime de furto mediante fraude, e não estelionato.

Com efeito, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:

 

“CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. MPF E JUIZ FEDERAL. IPL. MOVIMENTAÇÃO E SAQUES FRAUDULENTOS EM CONTA CORRENTE DA CEF POR MEIO DA INTERNET. MANIFESTAÇÃO DO MPF PELA DEFINIÇÃO DA CONDUTA COMO FURTO MEDIANTE FRAUDE E DECLINAÇÃO DA COMPETÊNCIA PRA O LOCAL ONDE MANTIDA A CONTA CORRENTE. INTERPRETAÇÃO DIVERSA DO JUÍZO FEDERAL, QUE ENTENDE TRATAR-SE DE ESTELIONATO. INEXISTÊNCIA DE CONFLITO DE ATRIBUIÇÕES. ARQUIVAMENTO INDIRETO. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 28 DO CPP. PRECEDENTES DA 3A. SEÇÃO DESTA CORTE. PARECER DO MPF PELO NÃO CONHECIMENTO DO CONFLITO. CONFLITO DE ATRIBUIÇÃO NÃO CONHECIDO.

1. A 3ª. Seção desta Corte definiu que configura o crime de furto qualificado pela fraude a subtração de valores de conta corrente, mediante transferência ou saque bancários sem o consentimento do correntista; assim, a competência deve ser definida pelo lugar da agência em que mantida a conta lesada.

2. Inexiste conflito de atribuição quando o membro do Ministério Público opina pela declinação de competência e o Juízo não acata o pronunciamento; dest’arte, não oferecida a denúncia, em razão da incompetência do juízo, opera-se o denominado arquivamento indireto, competindo ao Juiz aplicar analogicamente o art. 28 do CPP, remetendo os autos à 2ª. Câmara de Coordenação e Revisão do MPF. Precedentes do STJ.

3. A hipótese igualmente não configura conflito de competência, ante a ausência de pronunciamento de uma das autoridades judiciárias sobre a sua competência para conhecer do mesmo fato criminoso.

4. Conflito de atribuição não conhecido.”

 (STJ, CAt n. 222/MG, 3ª Seção, Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe de 16/05/2011; grifo nosso).

 

Nota-se pelo julgado cuja ementa encontra-se acima transcrita que o foro competente, ademais, deve ser o local em que ocorreu a subtração.

Sendo assim, com a devida vênia da Ilustre Suscitante, o locus commissi delicti é a Comarca de Santo André, incumbindo-lhe, destarte, oficiar na causa.

Diante do exposto, dirime-se o presente conflito para declarar que a atribuição para atuar nos autos incumbe ao Membro do Parquet acima referido, sendo desnecessária a designação de outro Representante Ministerial.

Isto porque não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

 

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (REGIME JURÍDICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO PENAL, São Paulo, Editora Verbatim, 2009, pág. 155; parêntese nosso).

 

Publique-se a ementa.

 

                                                      São Paulo, 20 de setembro de 2012.

 

 

 

                        Márcio Fernando Elias Rosa

                        Procurador-Geral de Justiça

 

 

 

 

/aeal