Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n. 140.351/12

Autos n. 829/12 – MM. Juízo da 1.ª Vara Criminal da Comarca de Batatais

Suscitante: 3.º Promotor de Justiça de Batatais

Suscitada: 2.º Promotor de Justiça de Batatais

Assunto: controvérsia acerca da atribuição para oficiar em procedimento investigatório que apura crime de desobediência envolvendo o descumprimento de medidas protetivas estipuladas no âmbito da Lei Maria da Penha

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDAS PROTETIVAS FIXADAS NO ÂMBITO DA LEI MARIA DA PENHA (LEI N. 11.340/06). ATRIBUIÇÃO AFETA AO PROMOTOR DE JUSTIÇA ATUANTE NA ESFERA DO JUÍZO CRIMINAL, RESPONSÁVEL POR OFICIAR EM PROCEDIMENTOS INSTAURADOS COM BASE NO MENCIONADO DIPLOMA LEGAL.

1.      Cuida-se de termo circunstanciado destinado a apurar possível conduta criminosa decorrente do descumprimento de medidas protetivas impostas com base na Lei Maria da Penha. Discute-se nos autos se a atribuição compete ao Promotor de Justiça oficiante nos feitos decorrentes da citada Lei ou àquele atuante no Juizado Especial Criminal.

2.      O art. 14 da Lei n. 11.340/06 é expresso ao determinar: "Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher". Note-se que incumbe ao referido órgão judicial e, consequentemente, ao respectivo membro ministerial, cuidar de toda e qualquer causa decorrente da multicitada forma de violência contra pessoas do sexo feminino. De mais a ver, o art. 41 do Diploma mencionado prescreve que: "Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995”.

3.      Ainda que assim não fosse, a permanência do caso sob os cuidados do Juízo Criminal se justificaria pela presença da conexão, porquanto a comprovação do crime precedente interfere na demonstração do suposto delito contra a Administração da Justiça (e assim reciprocamente). Como se sabe, dá-se a conexão, hipótese de prorrogação legal de competência, quando a prova de uma infração puder influenciar na de outra. Trata-se da chamada conexão instrumental ou probatória, prevista no art. 76, III, do CPP. Reconhecendo-se o vínculo, torna-se imperiosa a reunião de processos para julgamento conjunto, de modo a se permitir uma visão ampla do julgador, abrangente de todo o quadro probatório; além disso, promove-se a celeridade e a economia processual; evita-se, por fim, que decisões conflitantes sejam prolatadas. Nesse sentido, já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF, RSE n. 0005578-24.2009.807.0012, 1ª Turma Criminal, rel. Desembargador GEORGE LOPES LEITE, julgado em 17/11/2010, publicado no DJe de 23/11/2010).

Solução: conhece-se do presente conflito para dirimi-lo, concluindo-se que a atribuição para formar a opinião delitiva incumbe mesmo ao Douto Promotor de Justiça Suscitante.

 

Cuida-se de termo circunstanciado destinado a apurar a responsabilidade de (...) pelo cometimento de possível conduta criminosa decorrente do descumprimento de medidas protetivas impostas com base na Lei Maria da Penha.

Segundo consta do feito, o sujeito descumpriu determinação judicial exarada no processo n. 362/12, ao comparecer na residência de (...) para pegar as crianças, filhos do casal.

O Douto Promotor de Justiça requereu o envio do caso ao MM. Juízo Comum, vislumbrando aplicável à espécie a Lei Maria da Penha (fls. 07).

O Ilustre Representante Ministerial que o recebeu, entendendo configurado o delito tipificado no art. 359 do CP, não se enquadrando nas hipóteses da Lei n. 11.340/06, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 10).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o incidente sub examen assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações, o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, de modo que não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe o dever de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão se encontra com o Ilustre Suscitado, com a devida vênia do Douto Suscitante.

O comportamento perpetrado deve ser analisado na esfera do Juízo Comum, competente para os feitos relacionados com a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da Lei n. 11.340/06.

Sublinhe-se que o art. 14 da Lei Maria da Penha é expresso ao determinar:

 

"Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher".

 

Note-se que compete ao referido órgão judicial e, consequentemente, ao respectivo membro ministerial, cuidar de toda e qualquer causa decorrente da multicitada forma de violência contra pessoas do sexo feminino.

De mais a ver, o art. 41 do Diploma mencionado prescreve que:

 

"Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei n. 9.099, de 26 de setembro de 1995”.

 

Ainda que assim não fosse, a permanência do caso sob os cuidados do Juízo Criminal se justificaria pela presença da conexão, porquanto a comprovação do crime antecedente interfere na demonstração do suposto delito contra a Administração da Justiça (e assim reciprocamente).

Como se sabe, dá-se a conexão, hipótese de prorrogação legal de competência, quando a prova de uma infração puder influenciar na de outra. Trata-se da chamada conexão instrumental ou probatória, prevista no art. 76, III, do CPP.

Reconhecendo-se o vínculo, torna-se imperiosa a reunião de processos para julgamento conjunto, de modo a se permitir uma visão ampla do julgador, abrangente de todo o quadro probatório; além disso, promove-se a celeridade e a economia processual; evita-se, por fim, que decisões conflitantes sejam prolatadas.

É exatamente nesse sentido o escólio de JOSÉ FREDERICO MARQUES:

 

“O instituto da conexão, como se sabe, foi concebido para propiciar a economia processual, permitir uma visão mais abrangente dos fatos e evitar o conflito lógico entre julgados, o que, em tese, o qualifica como “fator de melhor aplicação jurisdicional do direito” (Elementos de Direito Processual Penal, vol. I, 2ª ed., Forense, 1965, n. 143, p. 272).

 

Nesse sentido, já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

 

“PROCESSUAL PENAL. LEI MARIA DA PENHA. COMPETÊNCIA. DESCUMPRIMENTO DE MEDIDA PROTETIVA. CONEXÃO PROBATÓRIA ENTRE O CRIME DE DESOBEDIÊNCIA E AS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA.

1. O autor do fato descumpriu em ocasiões diferentes a proibição de entrar em contado com a ex-mulher, oriunda de medida protetiva de urgência deferida pelo segundo juizado de competência geral do Paranoá. Assim, cometeu o crime de desobediência objeto de termo circunstanciado lavrado na circunscrição judiciária de São Sebastião, local de onde telefonou várias vezes para aquele de quem devia manter-se afastado. Com isso atraiu a aplicação do artigo 76, inciso III, do Código de Processo Penal, que determina a competência por conexão quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias e ementares possa influir na prova de outra. Assim, a reunião dos dois processos com base na conexão probatória favorece a objetividade do julgamento porque as provas são produzidas uma só vez, instrumentalizando o magistrado para decidir com presteza, celeridade e com maior economia processual. Ainda que a prova da desobediência não possa influenciar diretamente influa na ação penal onde foi deferida a medida protetiva, é desta decorrência lógica e consequencial.

2. Correta se apresenta a decisão do juízo de São Sebastião quando determinou a redistribuição do temo circunstanciado relativo ao descumprimento de ordem judicial contida na medida de urgência ao juízo de onde emanou a proibição.

3. Recurso conhecido e desprovido”.

(TJDF, RSE n. 0005578-24.2009.807.0012, 1ª Turma Criminal, rel. Des.: GEORGE LOPES LEITE, julgado em 17/11/2010, publicado no DJe de 23/11/2010).

 

Conclui-se, portanto, que a atribuição para formar a opinião delitiva incumbe mesmo ao Douto Promotor de Justiça Criminal, mas em respeito à independência funcional do Ilustre Representante do Parquet atuante na causa, designa-se outro membro ministerial para intervir no feito em seus ulteriores termos.

Faculta-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n. 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n. 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando-se o substituto automático.  

Publique-se a ementa.

 

São Paulo, 28 de setembro de 2012.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

 

 

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