Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 150.161/12

Autos n.º 62/12 – MM. Juízo da 1.ª Vara Criminal da Comarca de Batatais

Suscitante: 3.º Promotor de Justiça de Batatais

Suscitado: 2.º Promotor de Justiça de Batatais

Assunto: controvérsia sobre o dever de se manifestar em expediente relativo a crime de posse irregular de arma de fogo praticado por policial militar

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. DIVERGÊNCIA ACERCA DA EXTENSÃO DAS FUNÇÕES RELACIONADAS COM O CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL. PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO INSTAURADO CONTRA POLICIAL MILITAR. POSSE IRREGULAR DE MUNIÇÃO DE ARMA DE FOGO (ART. 12 DA LEI N. 10.826/03). O SIMPLES FATO DE UM POLICIAL FIGURAR COMO SUJEITO ATIVO DA INFRAÇÃO NÃO IMPORTA, POR SI SÓ, EM ATRIBUIÇÃO DO PROMOTOR DE JUSTIÇA ENCARREGADO DO CONTROLE EXTERNO DA POLÍCIA.

1.      Como se sabe, o constituinte impingiu ao Ministério Público a tarefa de efetuar o controle externo da atividade policial, inserindo esse mister no rol das funções institucionais do Parquet (CF, art. 129, VII). A regulamentação desta missão ficou a cargo da legislação infraconstitucional, advindo por meio da Lei Complementar da União n. 75/93 e, no Estado de São Paulo, por intermédio Lei Complementar Estadual n. 734/93. A vagueza do Diploma paulista, porém, exigiu regulamentação interna, que se deu com os Atos Normativos CPJ/PGJ n. 119/97 e 409/05. O último deles dispõe, em seu art. 1.º, que: “O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público tem como objetivo a constatação da regularidade e adequação dos procedimentos desenvolvidos na realização da atividade de polícia judiciária, bem como a integração das funções do Ministério Público e da polícia judiciária voltadas para a persecução penal e o interesse público”. Ressalte-se que a disciplina conferida ao tema no Estado de São Paulo não discrepa daquela decorrente da Resolução n. 20/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público; confira-se: “Art. 2º O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público tem como objetivo manter a regularidade e a adequação dos procedimentos empregados na execução da atividade policial, bem como a integração das funções do Ministério Público e das Polícias voltada para a persecução penal e o interesse público, atentando, especialmente, para: I – o respeito aos direitos fundamentais assegurados na Constituição Federal e nas leis; II – a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público; III – a prevenção da criminalidade; IV – a finalidade, a celeridade, o aperfeiçoamento e a indisponibilidade da persecução penal; V – a prevenção ou a correção de irregularidades,  legalidades ou de abuso de poder relacionados à atividade de investigação criminal; VI – a superação de falhas na produção probatória, inclusive técnicas, para fins de investigação criminal; VII – a probidade administrativa no exercício da atividade policial”.

2.      A análise das normas relativas ao tema revela que não se pode considerar que qualquer conduta em que figure um policial (sobretudo militar) como sujeito ativo importa na atribuição relativa ao Controle Externo da Polícia.

3.      Esclareça-se, ademais, que segundo a divisão de atribuições da Promotoria de Justiça de Batatais (Ato n. 23/02 – PGJ), o dever de oficiar neste procedimento recai sobre o Douto Suscitado, responsável por oficiar nos feitos de final “2”, em trâmite perante as duas Varas da Comarca.

Solução: conhece-se do presente conflito para dirimi-lo, a fim de declarar competir ao Douto Promotor de Justiça Suscitado a atribuição para intervir nos autos.

 

Cuida-se de conflito negativo de atribuição envolvendo os Doutos Promotores de Justiça acima epigrafados, no qual divergem sobre a quem incumbe se manifestar em expediente relativo à apuração de suposto crime de posse irregular de arma de fogo praticado, em tese, por policial militar, ao manter em sua residência munição de armamento bélico.

De acordo com o Douto Suscitado, falta-lhe atribuição para oficiar no procedimento, porquanto se trata de delito cometido no desempenho das funções, o que atrairia a responsabilidade do Representante Ministerial oficiante no âmbito do Controle Externo da Atividade Policial (fls. 50/51).

Para o Ilustre Suscitante, todavia, cuida-se de infração, embora perpetrada por policial, não relacionada com as atividades decorrentes da função ministerial de controle externo da Polícia, segundo dispõem os Atos Normativos n. 119/97 e 409/05 – CPJ/PGJ (fls. 53, verso e 54).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que a vinda do expediente a esta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n. 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações, o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso, de modo que não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe o dever de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão socorre ao Douto Suscitante, com a devida vênia do Ilustre Suscitado.

Como se sabe, o constituinte impingiu ao Ministério Público a tarefa de efetuar o controle externo da atividade policial, inserindo esse mister no rol das funções institucionais do Parquet (CF, art. 129, VII).

A regulamentação desta missão ficou a cargo da legislação infraconstitucional, advindo por meio da Lei Complementar da União n. 75/93 e, no Estado de São Paulo, por intermédio Lei Complementar Estadual n. 734/93.

A vagueza do Diploma paulista, porém, exigiu regulamentação interna, que se deu com os Atos Normativos CPJ/PGJ n. 119/97 e 409/05.

O último deles dispõe, em seu art. 1.º, que:

 

“O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público tem como objetivo a constatação da regularidade e adequação dos procedimentos desenvolvidos na realização da atividade de polícia judiciária, bem como a integração das funções do Ministério Público e da polícia judiciária voltadas para a persecução penal e o interesse público.

Parágrafo único. Para esse fim, em sua atividade de controle, o Ministério Público atentará para:

I - a prevenção da criminalidade;

II - a finalidade, a celeridade, o aperfeiçoamento e a indisponibilidade da persecução penal;

III - a prevenção ou a correção de irregularidades, ilegalidades ou abuso de poder relacionados com a atividade de polícia judiciária;

IV - buscar superar as falhas na produção da prova, inclusive técnica, para fins de investigação criminal;

V - a probidade administrativa no exercício da atividade da polícia judiciária.”

 

 

Ressalte-se que a disciplina conferida ao tema no Estado de São Paulo não discrepa daquela decorrente da Resolução n. 20/2007 do Conselho Nacional do Ministério Público; confira-se:

 

“Art. 2º O controle externo da atividade policial pelo Ministério Público tem como objetivo manter a regularidade e a adequação dos procedimentos empregados na execução da atividade policial, bem como a integração das funções do Ministério Público e das Polícias voltada para a persecução penal e o interesse público, atentando, especialmente, para:

I – o respeito aos direitos fundamentais assegurados na Constituição Federal e nas leis;

II – a preservação da ordem pública, da incolumidade das pessoas e do patrimônio público;

III – a prevenção da criminalidade;

IV – a finalidade, a celeridade, o aperfeiçoamento e a indisponibilidade da persecução penal;

V – a prevenção ou a correção de irregularidades,  legalidades ou de abuso de poder relacionados à atividade de investigação criminal;

VI – a superação de falhas na produção probatória, inclusive técnicas, para fins de investigação criminal;

VII – a probidade administrativa no exercício da atividade policial”.

 

A análise das normas relativas ao tema revela que não se pode considerar que qualquer conduta em que figure um policial (sobretudo militar) como sujeito ativo importa na atribuição relativa ao Controle Externo da Polícia; bem ao contrário.

Esclareça-se, ademais, que segundo a divisão de atribuições da Promotoria de Justiça de Batatais (Ato n. 23/02 – PGJ), o dever de oficiar neste procedimento recai sobre o Douto Suscitado, responsável por oficiar nos feitos de final “2”, em trâmite perante as duas Varas da Comarca:

“ATO N.º 23/02 - PGJ, DE 11 DE ABRIL DE 2002

O PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais, HOMOLOGA a modificação das atribuições dos cargos de Promotor de Justiça da PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE BATATAIS, aprovada pelo Órgão Especial do Colégio de Procuradores de Justiça, em reunião realizada em 4 de abril de 2002 (artigos 22, inciso XX, e 23 da Lei Orgânica Estadual do Ministério Público – Lei Complementar Estadual nº 734, de 26 de novembro de 1993), de acordo com a proposta de fls. 14/18, convalidando-se os atos praticados anteriormente, com fundamento no disposto no parágrafo único do artigo 2º do Ato nº 61/95-CPJ/PGJ, constante dos autos do protocolado n.º 102.591/01, com a seguinte redação:

(...)

II. 2º PROMOTOR DE JUSTIÇA

a) feitos cíveis e criminais de finais 2, 4 e 6 das duas Varas;

b) feitos cíveis e criminais de final 0, quando antecedido pelos pré-finais 1, 2, 3, 4, 5 e 6 (dezenas 10, 20, 30, 40, 50 e 60) das 1ª e 2ª Varas;

c) Habilitações de Casamento;

d) Fundações, inclusive na área criminal;

e) Pessoa Portadora de Deficiência, inclusive na área criminal;

f) Direitos Constitucionais do Cidadão, inclusive na área criminal;

g) Interesses difusos e coletivos da Infância e Juventude;

h) Atendimento ao público.

(...)

(REPUBLICADO POR NECESSIDADE DE RETIFICAÇÃO - D.O.E. DE 12.04.02)”

 

Diante do exposto, conhece-se do presente conflito para dirimi-lo, a fim de declarar competir ao Douto Promotor de Justiça Suscitado a atribuição para intervir nos autos.

Afigura-se desnecessário designar outro membro ministerial para oficiar no feito. Isto porque, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça:

 

“a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (Regime Jurídico do Ministério Público no Processo Penal, São Paulo: Editora Verbatim, 2009, pág. 155; parêntese nosso).

 

Publique-se a ementa.

São Paulo, 16 de outubro de 2012.

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

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