Conflito Negativo de Atribuição

Protocolado n.º 188.377/14

Autos n.º 0001084-65.2009 - MM. Juízo do DIPO 3 (Comarca da Capital)

Suscitante: 3.ª Promotoria de Justiça Criminal do Foro Central da Capital

Suscitada: Promotoria de Justiça do V Tribunal do Júri da Capital

Assunto: definição do correto enquadramento dos fatos, com reflexo na atribuição funcional

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. TENTATIVA DE HOMICÍDIO (CP, ART. 121, CAPUT, C.C. ART. 14, INC. II) OU LATROCÍNIO TENTADO (CP, ART. 157, §3º, PARTE FINAL, C.C. ART. 14, INC. II). PRESTADOR DE SERVIÇOS QUE VIBRA GOLPES COM INSTRUMENTO PÉRFURO-CORTANTE NO SOBRINHO DE SEU EMPREGADOR, PRODUZINDO-LHE LESÕES GRAVES, O TRANCA EM CÔMODO DO IMÓVEL, SUBTRAI OBJETOS E SE EVADE DO LOCAL. INDICIADO QUE ALEGA TER AGIDO EM RAZÃO DE OFENSAS IRROGADAS PELA VÍTIMA, DESTACANDO SUA CONDIÇÃO DE EX-PRESIDIÁRIO. VERSÃO ISOLADA. DADOS OBJETIVOS QUE CONFIRMAM O “ANIMUS NECANDI” E A RETIRADA DOS BENS. ATRIBUIÇÃO, PORTANTO, DO PROMOTOR DE JUSTIÇA CRIMINAL.

 

1.      Os elementos informativos apresentam dois dados objetivos e incontestes, quais sejam, que o indiciado produziu diversas lesões de natureza grave no ofendido, valendo-se de dois instrumentos pérfuro-cortantes (com animus necandi, portanto) e, depois de trancá-lo num dos cômodos do imóvel, subtraiu bens e se evadiu. Este comportamento configura, em tese, crime de latrocínio tentado (CP, art. 157, §3.º, parte final, c.c. art. 14, inc. II).

2.      Deve-se esclarecer que o autor prestava serviços para o tio do ofendido e já havia pernoitado no sítio dos fatos, com autorização de seu empregador, responsável pelo imóvel.

3.      Não se ignora que o increpado alegou ter vibrado os golpes no sujeito passivo porque este o menosprezou em decorrência de sua condição de ex-presidiário, agredindo-o atuando em sua própria defesa. Essa versão, além de lhe ser conveniente, resultou isolada, porquanto, na verdade, ele tentou matar a vítima para viabilizar a subtração dos bens.

4.      O fato de não ter levado outros objetos do imóvel não afasta o animus furandi, dado que foi obrigado a se evadir com presteza, pois sabia que a Polícia já fora acionada para comparecer ao local.

5.      Não se olvide, por derradeiro, que nesta fase da persecução penal vigora o princípio in dubio pro societate (vide, STJ, Conflito de Competência n.º 113.020, rel. MIN. OG FERNANDES, julgado em 23 de março de 2011).

Solução: conhece-se do presente conflito, declarando que a atribuição de atuar no procedimento incumbe ao Douto Suscitante, designando-se, em respeito à sua independência funcional, outro promotor de justiça para oferecer a peça inaugural, bem como prosseguir no feito em seus ulteriores termos.

 

 

Cuida-se de investigação penal instaurada visando à apuração da suposta prática do crime de homicídio tentado (art. 121, caput, c.c. art. 14, II, do CP) cometido, em tese, por (...) em face de (...).

O Douto Promotor de Justiça oficiante perante o Tribunal Popular, não vislumbrando perpetrado delito doloso contra a vida, mas sim tentativa de latrocínio, postulou o encaminhamento do feito ao Juízo Comum (fls. 257/258).

A Ilustre Representante Ministerial destinatária discordou de seu antecessor, ponderando que o suspeito ficou sozinho na residência da vítima tempo suficiente para subtrair os bens que desejasse, e vários objetos de valor não foram retirados, indicando, portanto, a configuração da infração inicialmente excogitada; em consequência, suscitou conflito negativo de atribuição (fls. 264/268).

Eis a síntese do necessário.

Há de se sublinhar, preliminarmente, que o endereçamento da questão para análise desta Chefia Institucional assenta-se no art. 115 da Lei Complementar Estadual n.º 734/93.

Encontra-se devidamente configurado, portanto, o conflito negativo de atribuição entre promotores de justiça.

Como destaca HUGO NIGRO MAZZILLI, tal incidente tem lugar quando o membro do Ministério Público nega a própria atribuição funcional e a atribui a outro, que já a tenha recusado (conflito negativo), ou quando dois ou mais deles se manifestam, simultaneamente, atos que importem a afirmação das próprias atribuições, em exclusão às de outros membros (conflito positivo) (Regime Jurídico do Ministério Público, 6.ª edição, São Paulo, Saraiva, 2007, pág. 487).

Considere-se, outrossim, que em semelhantes situações o Procurador-Geral de Justiça não se converte no promotor natural do caso; assim, não lhe cumpre determinar qual a providência a ser adotada (oferecimento de denúncia, pedido de arquivamento ou complementação de diligências), devendo tão somente dirimir o conflito para estabelecer a quem incumbe a responsabilidade de oficiar nos autos.

Pois bem.

A razão se encontra com o Douto Suscitado, com a máxima vênia da Ilustre Suscitante.

Isto porque os elementos informativos colhidos apresentam dois dados objetivos e incontestes, quais sejam, que o indiciado produziu diversas lesões de natureza grave no ofendido (fls. 19/20), valendo-se de dois instrumentos pérfuro-cortantes (com animus necandi, portanto) e, depois de trancá-lo num dos cômodos da residência, subtraiu bens e se evadiu.

Este comportamento configura, em tese, crime de latrocínio tentado (CP, art. 157, §3º, parte final, c.c. art. 14, inc. II).

Deve-se esclarecer que o autor prestava serviços para (...), e já havia pernoitado no local em oportunidades anteriores com autorização de seu empregador, tio do ofendido e responsável pelo imóvel (vide depoimentos de fls. 10/12, 14/16 e 151/154).

Não se ignora que o increpado alegou ter vibrado os golpes no sujeito passivo porque este o menosprezou em decorrência de sua condição de ex-presidiário, agredindo-o atuando em sua própria defesa (fls. 226/228).

Essa versão, porém, além de lhe ser conveniente, resultou isolada, porquanto, na verdade, tentou matar a vítima para viabilizar a subtração de objetos.

O fato de não ter levado outros bens do imóvel não afasta o animus furandi, dado que foi obrigado a se evadir com presteza, pois sabia que a Polícia já fora acionada para comparecer ao local.

Não se olvide, por derradeiro, que nesta fase da persecução penal vigora o princípio in dubio pro societate (vide, STJ, Conflito de Competência n.º 113.020, rel. MIN. OG FERNANDES, julgado em 23 de março de 2011).

Diante do exposto, conhece-se do presente conflito para dirimi-lo, declarando-se que a atribuição para atuar no feito incumbe ao Douto Suscitante.

Para que não haja menoscabo à sua independência funcional, designo outro promotor de justiça para oficiar nos autos, facultando-se-lhe observar o disposto no art. 4-A do Ato Normativo n.º 302 (PGJ/CSMP/CGMP), de 07 de janeiro de 2003, com redação dada pelo Ato Normativo n.º 488 (PGJ/CSMP/CGMP), de 27 de outubro de 2006.

Expeça-se portaria designando o substituto automático.

 

São Paulo, 09 de dezembro de 2014.

 

 

Márcio Fernando Elias Rosa

Procurador-Geral de Justiça

                                                        

 

 

 

 

 

                             

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