Conflito Negativo de Atribuição

 

Protocolado n.º 19.830/10

Autos n.º 050.06.092904-9 – MM. Juízo do DIPO 4 (Comarca da Capital)

Autor do fato: desconhecido

Vítima: Banco Nossa Caixa S.A.

Suscitante: Promotoria de Justiça Criminal da Capital

Suscitado: Promotoria de Justiça de Cafelândia

 

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÃO. FORO COMPETENTE PARA APURAÇÃO DE FRAUDE BANCÁRIA PRATICADA PELA REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES. CRIME DE FURTO QUALIFICADO PELA FRAUDE. ATRIBUIÇÃO DO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM EXERCÍCIO PERANTE O JUÍZO DO LOCAL DA SUBTRAÇÃO DOS BENS.

1. Os autos retratam hipótese em que agentes obtiveram, de maneira fraudulenta, dados pessoais e bancários de terceiros e, com isto, realizaram operações financeiras resultando em prejuízo aos correntistas e, ao final, à instituição bancária.

2. A agência onde têm conta corrente as ofendidas situa-se em Cafelândia, de modo que neste local deu-se a subtração dos bens. Precedentes da Colenda 3.ª Seção do Egrégio STJ.

Solução: conflito dirimido para declarar que a atribuição incumbe ao Douto Suscitado.

 

 

Cuida-se de procedimento instaurado visando à apuração do delito consistente na subtração de valores, por meio da rede mundial de computadores (“internet”), em que o numerário depositado em contas correntes foi indevidamente transferido para outras e, posteriormente, sacados.

 a investigação tramitou na Comarca de Cafelândia, local em que se situam as contas cujo dinheiro foi desviado. Ao término do procedimento, o Douto Promotor de Justiça oficiante requereu o envio do expediente à Capital (fls. 122).

A Ilustre Representante Ministerial atuante em São Paulo, de sua parte, entendeu que o foro de origem era territorialmente competente (fls. 212/214) e, depois de acrescidas outras informações aos autos, insistiu no retorno do inquérito a Cafelândia (fls. 236).

O MM. Juiz, contudo, identificou na hipótese conflito negativo de atribuições, dado o dissídio entre membros do Ministério Público acerca da responsabilidade de intervir na causa, remetendo a questão a esta Procuradoria Geral de Justiça (fls. 237).

Eis a síntese do necessário.

De acordo com os elementos de informação colhidos, pessoas ainda não identificadas obtiveram acesso, por meio da “internet”, a contas bancárias de agência da “Nossa Caixa”, localizada na cidade de Cafelândia e subtraíram consideráveis quantias, transferindo-as eletronicamente e, posteriormente, efetuando a retirada do dinheiro.

Pois bem. A obtenção fraudulenta de dados bancários e pessoais de terceiros para, ao depois, realizar operações financeiras por meio da rede mundial de computadores, configura crime de furto mediante fraude, e não estelionato.

Com efeito, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que:

 

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. PENAL E PROCESSO PENAL. FRAUDE ELETRÔNICA NA INTERNET. TRANSFERÊNCIA DE VALORES DE CONTA- CORRENTE DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. CRIME DE FURTO MEDIANTE FRAUDE. CONSUMAÇÃO NO LOCAL DE SUBTRAÇÃO DO BEM. APLICAÇÃO DO ART. 70 DO CPP.

1. A subtração de valores de conta-corrente, mediante transferência fraudulenta para conta de terceiro, sem consentimento da vítima, configura crime de furto mediante fraude, previsto no art. 155, § 4º, inciso II, do Código Penal. Precedentes da Terceira Seção.

2. É competente o Juízo do lugar da consumação do delito de furto, local onde o bem é subtraído da vítima.

3. Conflito conhecido para declarar a competência do suscitante, Juízo Federal da 2ª Vara Criminal da Seção Judiciária do Estado do Espírito Santo”.

(STJ, CC n. 81.477, 3ª Seção, Ministro OG FERNANDES, DJe de 08/09/2008; grifos nossos).

 

Nota-se pelo julgado cuja ementa encontra-se acima transcrita, que o foro competente, ademais, deve ser o local em que ocorreu a subtração.

Sendo assim, com a devida vênia do Ilustre Promotor de Justiça Suscitado, o locus commissi delicti é a Comarca de Cafelândia, incumbindo-lhe, destarte, oficiar na causa.

Diante do exposto, dirimo o presente conflito para declarar que a atribuição para atuar nos autos incumbe ao Membro do Ministério Público acima referido.

Não se pode olvidar, como ensina PEDRO HENRIQUE DEMERCIAN, que, em conflitos de atribuição decididos pelo Procurador-Geral de Justiça: “a exclusão de ambos (os Promotores de Justiça em litígio) só pode se dar em caráter excepcional, porque essa modalidade de controvérsia pressupõe, de ordinário, que a atuação caiba a uma das autoridades em dissídio. (...). É evidente que a livre convicção do promotor natural deve ser preservada, mas não ao custo de subtrair-lhe o caso em que lhe cabe atuar, pois o dever de agir, que porventura tenha, é irrenunciável, intransferível e insuscetível de ser eliminado por interpretação unilateral do órgão ao qual toca satisfazê-lo. (...). Somente há incompatibilidade com o desempenho funcional – e, portanto, inconveniência para a sociedade – se o pronunciamento anterior, na sua essência, traduz uma promoção de arquivamento ou envolve uma antecipada afirmação de que a demanda é inviável” (REGIME JURÍDICO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO PENAL. São Paulo: Editora Verbatim, 2009. pág. 155; parêntese nosso).

      

     São Paulo, 10 de fevereiro de 2010.

 

 

 

                        Fernando Grella Vieira

                        Procurador-Geral de Justiça

 

/aeal